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Câmara Criminal do TJAC acata HC e converte prisão de PMs acusados de matar enfermeira em domiciliar

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A Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Acre determinou que os policiais militares Cleonízio Marques Vilas Boas e Gleyson Costa de Souza, acusados de matar a enfermeira Géssica Melo de Oliveira, em dezembro de 2023 durante uma perseguição, aguardem julgamento em prisão domiciliar. A decisão foi proferida nesta terça-feira (30).


A decisão da Câmara Criminal atende a um pedido de habeas corpus da defesa dos acusados. Os desembargadores Denise Bonfim e Francisco Djalma venceram o voto do desembargador Elcio Sabo Mendes, que votou contrário à conversão da prisão.


Na argumentação do habeas corpus, a defesa dos policiais argumentou que ambos acusados têm filhos com necessidades especiais. No caso de Gleyson Costa de Souza, o filho seria portador de Transtorno do Espectro Autista (TEA), e no caso de Cleonizio Marques Vilas Boas, o filho seria portador de epilepsia.


Entenda o caso:

De acordo com o inquérito ao qual o Ecos da Notícia teve acesso, Géssica foi até a residência de familiares no bairro Vila Acre, em Rio Branco, na manhã do dia 2 de dezembro de 2023, e depois se deslocou em direção a Senador Guiomard, quando nas proximidades da Escola Rosa Linda, na zona rural de Senador Guiomard, tentou fazer uma ultrapassagem e acabou caindo em uma vala, obtendo em seguida ajuda de terceiros para retirar seu veículo.


Momentos depois, de volta à estrada, enquanto passava pelo posto policial de Senador Guiomar, Géssica teria freado bruscamente seu veículo atrás de um carro Mobi, fato que chamou a atenção de policiais que realizavam uma blitz. O soldado da Polícia Militar Ronilson Araújo da Silva, que participava da ação policial, se aproximou de Géssica a aproximadamente um metro de distância e não visualizou qualquer arma de fogo em posse da enfermeira, nem no interior do veículo. O policial tentou conversar com a condutora, mas ela empreendeu fuga. Ronilson Araújo teria então acionado a guarnição da PM em Capixaba, destino provável da fuga.


Já em Capixaba, a guarnição da PM que foi acionada passou a fazer o acompanhamento do carro de Géssica e tentou em alguns momentos interceptar o veículo, sem sucesso. Segundo o inquérito, foram dados sinais luminosos, sonoros, mas a condutora não atendeu aos pedidos de parada. Em dado momento, Géssica fez um retorno pela BR-317 e retornou sentido Senador Guiomard, quando aquela guarnição de Capixaba pediu o apoio de outras guarnições.


Enquanto estes fatos se desenrolavam, uma guarnição do Grupo Especial de Fronteira – GEFRON, composta pelos agentes Cleonizio Marques Vilas Boas, Gleyson Costa de Souza e Emerson Florindo de Moura, que acompanhavam a comunicação da situação, montou uma barreira policial nas proximidades Alcoolbrás, na BR-317, mas esta barreira teria sido rompida por Géssica Melo, o que teria motivado disparos na lataria traseira de seu veículo.


O carro de Géssica continuou trafegando na rodovia no sentido Senador Guiomard, acompanhada pela guarnição da Polícia Militar de Capixaba, por duas viaturas do GEFRON, e mais adiante, uma guarnição da Polícia Rodoviária Federal e uma guarnição de Senador Guiomard. Durante a perseguição, a viatura do GEFRON composta pelos policiais Cleonizio Marques Vilas Boas, Gleyson Costa de Souza e Emerson Florindo de Moura tomou a dianteira dos veículos policiais e passou a ser o carro mais próximo ao de Géssica.


Nas proximidades da Fazenda Nictheroy, Cleonizio Marques Vilas Boas, armado com seu fuzil .762, disparou três vezes, e Gleyson Costa de Souza, armado com fuzil .556, disparou 5 vezes. De acordo com a perícia, foi um dos disparos feitos por Cleonizio que atingiu Géssica e a fez perder o controle do veículo e invadir uma área de pasto da fazenda.


Géssica foi retirada do veículo pelos policiais do GEFRON e um policial rodoviário verificou que a vítima estava viva, prestando socorro em seguida. Mas pouco depois, foi verificado que já não havia mais pulsação na enfermeira. O corpo da mulher foi colocado no xadrez da viatura pela mesma guarnição que efetuou os disparos, e levado para o hospital de Senador Guiomard por eles.


Depois que a guarnição composta pelos agentes Cleonizio Marques Vilas Boas, Gleyson Costa de Souza e Emerson Florindo de Moura, encontrou uma ambulância do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência, foi feita a transferência da paciente e os agentes voltaram à cena do crime, que estava sendo observada por uma equipe da Polícia Rodoviária Federal e uma guarnição da PM de Capixaba.


“Neste momento, o senhor Cleonízio Marques Vilas Boas, que se encontrava de colete, mas sem farda, se aproximou dos policiais rodoviários federais, e disse que iria no local procurar um aparelho celular que havia perdido, e se aproximou da cena do crime, momento em que implantou a arma de fogo”, diz o inquérito.


Em sede policial, o agente de polícia Cleonízio Marques, que deu o tiro fatal na enfermeira e plantou a arma na cena do crime, informou que enquanto o corpo de Géssica era levado para o xadrez da viatura do GEFRON, o secretário de Justiça e Segurança Pública do Acre, José Américo Gaia, passou pelo local e perguntou o que havia acontecido. Na oportunidade, o agente teria dado um breve resumo dos fatos ao secretário. Mais detalhes sobre este ponto serão dados à frente.


Nas descrições de laudo pericial, o inquérito esclarece que foram feitos exames de alcoolemia e toxicológico no corpo da enfermeira. Não foi detectada a presença de álcool ou drogas.


Segundo os peritos que fizeram a análise da cena do crime, o local não foi preservado. A arma encontrada nas proximidades do veículo, que foi plantada pelo agente do GEFRON, não tinha traços genéticos compatíveis com Géssica Melo, mas compatíveis para traços masculinos. Não foram encontrados projéteis de arma de fogo no interior do veículo, o que seria comum no caso de tiros disparados dentro do veículo, nem foram encontradas marcas de tiros de dentro para fora.


No relatório do inquérito, o delegado decidiu pelos seguintes indiciamentos: Homicídio qualificado por recurso que impossibilitou a defesa da vítima e por motivo fútil, cometido pelo agente Cleonizio Marques Vilas Boas; tentativa de homicídio qualificado que impossibilitou a defesa da vítima e por motivo fútil, cometido pelo agente Gleyson Costa de Souza; e fraude processual pelos dois agentes.


Sobre a citação ao secretário de Justiça e Segurança Pública do Acre, José Américo Gaia:


A reportagem do Ecos da Notícia procurou o delegado Rômulo Barros Alves de Carvalho, da Delegacia de Polícia Civil de Senador Guiomard, responsável pelo inquérito, para perguntar sobre o motivo do secretário não ter sido arrolado no processo como testemunha, já que ele estava no momento em que o corpo de Géssica Melo era levado para o xadrez, de acordo com o depoimento do homem que disparou o tiro fatal na enfermeira. Ele respondeu:


“Isso é o senhor que está dizendo [sobre a alegação de Cleonizio Marques Vilas Boas de que o secretário estava no local]. É interessante o senhor conversar com a assessoria da Polícia Civil que eles podem passar mais informações”, disse o delegado. A assessoria da Polícia Civil foi questionada sobre o assunto, mas não respondeu até o fechamento da matéria.


Já o coronel Américo Gaia disse que estava a caminho de Xapuri quando presenciou a área já preservada, e que não teria o que colaborar com as investigações caso fosse chamado a depor. “Eu estava passando na estrada e parei e observei a ocorrência, ela tinha sido socorrida para o hospital e eu segui minha viagem. A ocorrência já tinha acontecido, não tinha mais nada o que fazer a não ser dar os encaminhamentos que eles já estavam dando, mas não tive intervenção, passei por coincidência. Não fui chamado para depor até porque não teria nada a colaborar. Passei, parei como policial e secretário, observei o encerramento da ocorrência, conversei rapidamente com eles [outros policiais] e segui viagem. O que eu disser não soma nem agrega nada, se eu tivesse chegado no momento da ocorrência… mas não, ninguém chamou pra depor, nem fui citado como testemunha, fui citado como pessoa que passou no local, mas nem vi o inquérito”, afirmou.


Vale ressaltar que há uma diferença entre a linha temporal traçada pelo depoimento de Cleonízio Marques Vilas Boas e a entrevista cedida por Gaia ao Ecos da Notícia.


De acordo com o depoimento de Cleonízio descrito no inquérito, o secretário Américo Gaia estava presente no momento em que parte da equipe tentava chamar uma ambulância, agentes da PRF faziam contenção no trânsito, e o próprio interlocutor e o sargento Gleyson Costa de Souza carregavam o corpo da vítima para o xadrez da viatura. Já a versão do secretário é de que quando chegou no local da ocorrência a vítima já tinha sido socorrida para o hospital.


O inquérito agora foi enviado ao Poder Judiciário e ao Ministério Público do Acre.


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