É comum que o Alto Comando do Exército discuta assuntos de “conjuntura”, ou seja, que seus integrantes externem suas visões sobre temas que ganharam tração no governo, na sociedade e no noticiário. No caso do artigo 142, ele vinha sendo citado com frequência em todas essas esferas, o que já justificaria o debate, dizem fontes.
Mas, além disso, o desejo de Jair Bolsonaro de explorar caminhos para desafiar o desfecho eleitoral eram informados ao então comandante, general Gomes Freire, em conversas com integrantes do governo, segundo relato de interlocutores do general. Por isso, o debate ganhou corpo no Alto Comando do Exército.
Restou evidente para os generais, no entanto, que não havia adesão no grupo para levar adiante debate sobre o uso do artigo 142 como justificativa a uma ação das Forças Armadas.
O artigo 142 versa sobre o papel das Forças Armadas e dá amparo, por exemplo, a operações de Garantia da Lei e da Ordem. Ele não abre espaço, porém, para que haja atuação de militares sem uma justificativa clara, tampouco como reflexo de uma eleição sobre a qual não se comprovou fraude ou irregularidade.
Em delação premiada, o ex-ajudante de ordens Mauro Cid narrou uma reunião na qual o então presidente Jair Bolsonaro e comandantes das Forças debateram um plano para questionar a eleição. De acordo com Cid, o comandante do Exército se opôs à trama.
Segundo relatos feitos à CNN, ainda que um grupo de generais não tivesse se manifestado de forma clara sobre o tema nos encontros do Alto Comando do Exército, sempre foi restrito o grupo claramente a favor de se levar adiante a discussão sobre a possibilidade de atuação do Exército no pós-eleição.
Isso deu suporte ao comportamento de Gomes Freire. “Ele foi pressionado, mas não cedeu”, diz um general.
Integrantes das Forças Armadas citam, inclusive, que a PF identificou uma conversa de Mauro Cid na qual ele dizia que Bolsonaro não confiava no Alto Comando Exército.