Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) avaliam que a decisão do ministro Flávio Dino sobre o alcance de leis estrangeiras é um recado claro, mas não encerra o debate sobre as sanções impostas a Alexandre de Moraes.
Nos bastidores da Corte, uma ala entende que a ação que está nas mãos do ministro Cristiano Zanin, que trata do fato objetivo — ou seja, a aplicação direta da Lei Magnitsky no Brasil — ainda exigirá um debate mais aprofundado no plenário do Supremo.
A decisão de Dino, divulgada nesta segunda-feira, esclarece que leis e medidas judiciais de outros países só podem ser aplicadas em território nacional após serem validadas pela Justiça brasileira. Para colegas da Corte, a medida funciona como uma importante sinalização política e institucional.
O gesto foi visto como uma forma de reforçar que o tribunal acompanha o tema e mantém sob sua supervisão possíveis controvérsias que venham a surgir, sem ter entrado no mérito da norma.
Zanin é o relator de uma ação do PT que pede ao STF para proibir os bancos de aplicarem a Lei Magnitsky no Brasil. Apresentada pelo deputado federal Lindbergh Farias (PT-RJ), a ação busca impedir que sanções atinjam Moraes. No entanto, Zanin não deve decidir sobre o tema por enquanto, pretendendo ouvir todas as partes envolvidas antes de se manifestar.
A discussão sobre as sanções a Moraes ganhou força após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinar uma ordem executiva em 30 de julho, incluindo o ministro na lista da Lei Magnitsky. As sanções americanas podem resultar em restrições a operações de câmbio, investimentos em dólar e uso de cartões internacionais.
Embora os bancos brasileiros, em sua maioria, entendam que podem manter relações com Moraes em operações em reais, há instituições que temem multas das autoridades americanas por descumprimento da norma.
A expectativa nos bastidores da Corte é que, apesar do movimento de Dino, a questão ainda precise ser abordada em um julgamento mais aprofundado, que definirá o limite da influência externa nas decisões judiciais brasileiras e o posicionamento do STF como instituição.
Entenda a decisão de Dino
Dino também comunicou a decisão ao Banco Central, à Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e entidades do setor financeiro, para evitar que ordens externas interfiram em operações no Brasil sem chancela do STF. O despacho foi emitido em um processo apresentado pelo Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), sem relação direta com o caso de Moraes.
“Leis estrangeiras, atos administrativos, ordens executivas e diplomas similares não produzem efeitos em relação a pessoas naturais por atos em território brasileiro, relações jurídicas aqui celebradas, bens aqui situados, depositados, guardados, e empresas que aqui atuem”, escreveu Dino, completando. “Transações, operações, cancelamentos de contratos, bloqueios de ativos, transferências para o exterior (ou oriundas do exterior) por determinação de Estado estrangeiro, em desacordo aos postulados dessa decisão, dependem de expressa autorização desta Corte”.
Procurados, Banco Central e Febraban não comentaram.
Segundo o ministro, tais atos só podem produzir efeitos em território nacional caso sejam homologados pela Justiça brasileira ou incorporados ao ordenamento jurídico por meio de mecanismos de cooperação internacional. O ministro também determinou que estados e municípios brasileiros estão impedidos de propor novas demandas em tribunais estrangeiros, o que é a origem do pleito formulado pelo Ibram.
Em mais um recado direcionado ao governo de Donald Trump, Dino destacou que, nos últimos anos, “ondas de imposição de força de algumas nações sobre outras” passaram a agredir postulados essenciais do Direito Internacional.
“Instituições do multilateralismo são absolutamente ignoradas. Tratados internacionais são abertamente desrespeitados, inclusive os que versam sobre a proteção de populações civis em terríveis conflitos armados, alcançando idosos, crianças, pessoas com deficiência, mulheres. Diferentes tipos de protecionismos e de neocolonialismos são utilizados contra os povos mais frágeis, sem diálogos bilaterais adequados ou submissão a instâncias supranacionais”, completou o ministro.