Os donos de postos de combustíveis e de pontões no municípios de Marechal Thaumaturgo e Porto Valter, no Alto Rio Juruá, suspenderam as vendas de gasolina e diesel ao público desde essa terça-feira, 28. A falta do produto poderá afetar serviços como de segurança e saúde. Segundo eles, é uma forma de chamar atenção e protestar contra a decisão do governo do Estado, por meio do Deracre, de fechar oficialmente o porto de Cruzeiro do Sul, e suspender a operação de transbordo do combustível, que é embarcado no local para os demais, no Vale do Juruá.
A gasolina e o diesel são levados em barcos, de Cruzeiro do Sul para o Alto Juruá. O Deracre diz que não pode se responsabilizar por atividades comerciais com fins lucrativos que não cumprem as exigências de segurança do Instituto de Meio Ambiente do Acre (IMAC), implicando em altos custos para o Estado. De acordo com eles, o porto está em condições precárias desde 2021, quando parte da estrutura, como a rampa, desmoronou.
O gerente de um posto em Porto Walter afirma serem os responsáveis pelo abastecimento de carros e barcos na região e que a paralisação vai afetar a vida da população. Os empresários do setor querem que o governo resolva a situação.
“O porto de Cruzeiro do Sul está irregular, não está oferecendo condições para a gente pegar o combustível. Então a gente se uniu, todos os empresários aqui do Alto Juruá, decidimos fechar todos os pontos de combustível, para o governo olhar para a gente e tentar solucionar esse problema, regularizar esse porto para a gente. A única maneira que a gente achou foi isso aí, mobilizar, fechar os nossos postos, para ele tentar fazer alguma coisa”, contou o gerente do Posto Deodato, Deagilo Abreu.
O dono do posto, Adalgiso Abreu, o Dau, conta que o porto de Cruzeiro do Sul já está fechado depois de desabarrancamentos no local, onde não há mais rampa. Ele relata que, na verdade, o embarque do combustível deles é feito em um barranco. O que houve agora foi a suspensão do transbordo em definitivo no local feito pelo Deracre.
“Eu tenho um combustível para embarcar entre esses dois dias, entre amanhã e depois, e estou sem poder fazer esse embarque por motivo de esse porto estar fechado. Então a gente paga uns impostos muito altos, e no qual estão deixando a gente sem ação, sem poder trabalhar e a população também sem abastecimento. Na verdade, no porto se faz algum desembarque das balsas. Nós mesmos, para embarcar combustível, não temos porto, embarcamos aí no barranco, acima do porto. E agora nem assim vamos poder fazer”, ressaltou.
Um documento enviado pelo presidente do Instituto de Meio Ambiente do Acre (Imac), André Luiz Pereira Hassem, à presidente do Deracre, Sula Ximenes, informa que o requerimento de licenciamento ambiental para transbordo de combustível (sob processo eletrônico Seiam LO-202/2023) tramitado no órgão ambiental, foi indeferido em virtude da não implementação das estruturas necessárias para a operação da atividade em referência, visando, sobretudo, o bom funcionamento e a segurança dos atores envolvidos na operação. O documento informa também que a análise técnica constatou pendência documental obrigatória, inclusive das autorizações dos órgãos reguladores de portos, como a Agência Nacional de Transportes Aquaviários- Antaq e Marinha do Brasil.
Na última quinta-feira, 23, em documento da presidente do Deracre, enviado para os empresários do ramo de combustíveis, ela informa oficialmente a suspensão das atividades de transbordo de combustíveis e produtos inflamáveis e perigosos no Porto Fluvial do Municipio de Cruzeiro do Sul.
“Pois se trata de atividade passível de licenciamento ambiental de alto grau de risco ao meio ambiente a saúde humana. O processo de renovação da licença ambiental foi Indeferido, visto que precisa de adequações estruturais, projetos de segurança e demais anuências dos órgãos reguladores como ANTAQ, Marinha e Bombeiros, que necessitam de recursos para cumprimento. Considerando que o Deracre não tem a responsabilidade quanto ao transbordo, foi apenas cedido provisoriamente o espaço em caso emergencial de utilidade pública, a mesma é de interesse particular com fins comerciais, que não devem ser realizadas dentro de repartições públicas, sendo de responsabilidade das empresas acima mencionadas e que realizam o transbordo dar continuidade no licenciamento ambiental junto ao Imac e demais órgãos reguladores citados nos oficios em anexos. Informamos que o referido Porto Fluvial, está desativado, realizado apenas pequenas cargas e descargas de alimentos, onde a alagação ocorrida no inverno de 2024, ocasionou erosão avançada e desmoronamento da rampa. O Deracre e o DNIT estão em tratativas para adquirir uma área para ser o novo porto Fluvial do Estado no municipio de Cruzeiro do Sul, até o momento sem definições. Por fim, cientes que foi dado prazo de 60 dias para regularização, sem resolução, a partir da data de assinatura deste, está suspensa a atividade de Transbordo de Combustíveis, Inflamáveis e produtos perigosos, localizado dentro do Porto Fluvial do Deracre no município de Cruzeiro do Sul”, declara a presidente do Deracre, Sula Ximenes aos donos de postos.
Ao ac24horas, Sula Ximenes destacou que desde 2019, após um acidente e explosão em um barco em Cruzeiro do Sul, devido ao transbordo de combustíveis, foi necessária uma ação emergencial. Uma reunião com a prefeitura, empresários, Deracre e várias secretarias foi realizada para definir a colaboração de cada parte envolvida. Na ocasião, o Deracre cedeu provisoriamente uma área no Porto Fluvial para que as empresas pudessem realizar o transbordo de combustíveis destinados aos municípios isolados, como Porto Walter, Marechal Thaumaturgo, Jordão e Santa Rosa do Purus. Ficou acordado que o Deracre solicitasse uma licença provisória de 60 dias, prazo necessário para que as empresas se regularizassem.
“Após o vencimento dessa licença, notificamos várias vezes as empresas para que regularizassem sua situação, sem sucesso. Devido à ausência de respostas e ações adequadas, encaminhamos o pedido de suspensão das atividades, considerando o risco envolvido, já que lidam com produtos inflamáveis e explosivos. Reiteramos que o Deracre não pode se responsabilizar por atividades comerciais com fins lucrativos que não cumprem as exigências de segurança do IMAC, implicando altos custos. Dessa forma, o Deracre solicitou a suspensão das atividades de transbordo no porto cedido provisoriamente, visto que a responsabilidade e a regularização não foram cumpridas pelas empresas. O porto é licenciado regularmente, mas a atividade de transbordo não foi licenciada conforme acordado”, cita Sula Ximenes.
O Porto de Cruzeiro do Sul, construído em 2004, sofreu uma grave erosão em 2021, quando a rampa desmoronou. Uma estrutura provisória foi instalada, mas este ano, a situação do local piorou depois da enchente e vazante do Rio Juruá.
Tragédia na água
O embarque de combustível de Cruzeiro do Sul para os demais municípios do Vale do Juruá quase sempre foi feito nos barrancos, o que já resultou em uma tragédia.
Em 7 de junho de 2019 havia 18 pessoas dentro de um barco às margens do Rio Juruá, em Cruzeiro do Sul, e a embarcação começou a ser abastecida com 5 mil litros de gasolina. Durante essa operação, o barco, que seguiria para Marechal Thaumaturgo, explodiu, matando 6 pessoas e ferindo o restante. Entre os mortos havia um bebê de 8 meses.
Um ex-vereador do município de Marechal Thaumaturgo, empresário de Cruzeiro do Sul e o dono do barco estão entre os indiciados por homicídios dolosos, homicídios culposos, lesões corporais gravíssimas e lesões corporais de natureza grave de 6 pessoas. Desses, 5 pessoas foram indiciados por homicídios qualificados na modalidade dolosa, além de lesões corporais. Uma pessoa foi indiciada por homicídios culposos.
Logo depois do acidente, as autoridades se uniram e regularizaram o transbordo do combustível, que só podia ser feito no porto, em barcos e recipientes adequados, com equipamentos adequados sob supervisão dos órgãos de fiscalização. Mas com o desabarrancamento do porto de Cruzeiro do Sul, que não tem mais rampa, o transbordo voltou a ser feito nos barrancos do Rio Juruá. Agora o impasse está formado entre a iniciativa privada, que quer uma solução por parte do poder público, que afirma não ter essa responsabilidade. Cerca de 32 mil pessoas, que moram em Marechal Thaumaturgo e Porto Walter, podem ficar sem abastecer veículos e barcos.