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Tem volta? Limites planetários mostram urgência de ações para o clima global

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Degelo na Groenlândia é um dos sistemas perto do ponto de não retorno Imagem: Getty Images

A principal medida que vem à mente quando se pensa em mudança climática é o aumento na temperatura média global, que, segundo o Acordo de Paris de 2015, deve ser de, no máximo, 1,5 ºC a 2 °C acima dos níveis pré-industriais. Mas, em 2009, um grupo de cientistas havia identificado nove limites planetários para que os ecossistemas evoluam de forma segura e garantam a vida humana na Terra. Seis deles já foram ultrapassados.


As mudanças climáticas são um desses limites e, em novembro de 2023, um novo estudo mostrou que os chamados pontos de não retorno estão mais perto do que o imaginado. Assinado por 200 cientistas de 26 países e apresentado durante a COP28, o relatório Global Tipping Points reforça que sistemas fundamentais para a vida humana estão perto de chegar a um ponto de não retorno.


É o caso do derretimento de gelo na Groenlândia e Antártida, do derretimento da camada congelada do subsolo terrestre, do colapso das correntes oceânicas no Atlântico Norte e da morte de recifes de corais de águas quentes.


Líder em Mudanças Climáticas do WWF-Brasil, Alexandre Prado observa que, além desses limiares, há a possibilidade também de não retorno do ecossistema da Amazônia. “Isso acontece no nosso quintal por conta do desmatamento que coloca pressão sobre a floresta e do aquecimento do planeta, que também pode levar ao tipping point da região Amazônia”, acrescenta.


O que são limites planetários?

Os sistemas apontados pelo Global Tipping Points estão relacionados ao conceito de limites planetários proposto pelo cientista sueco Johan Rockstörm e sua equipe no Centro de Resiliência de Estocolmo em 2009. São fronteiras importantes para manter o equilíbrio da Terra e que, se cruzadas, aumentam o risco de mudanças drásticas em grande escala no planeta.


Os nove limites planetários são:

  1. Mudanças climáticas
  2. Perda de biodiversidade
  3. Mudanças de uso do solo
  4. Fluxos bioquímicos envolvendo fósforo e nitrogênio
  5. Diminuição da disponibilidade de água doce
  6. Incorporação das chamadas novas entidades, como microplásticos
  7. Destruição do ozônio na estratosfera
  8. Acidificação de oceanos
  9. Contaminação da atmosfera por aerossóis

Dos nove, apenas os três últimos ainda não foram ultrapassados, de acordo com um estudo de 2023 do qual Rockstörm é um dos autores. “Não sabemos por quanto tempo poderemos continuar a transgredir esses limites fundamentais antes que as pressões combinadas conduzam a mudanças e danos irreversíveis”, disse Rockström, atual diretor-adjunto do PIK (Instituto de Potsdam para Investigação do Impacto Climático), na Alemanha, quando o estudo foi divulgado.


Degradação acontece em ritmo acelerado

De acordo com Prado, do WWF-Brasil, a degradação relacionada ao aquecimento global tem ocorrido em um ritmo mais acelerado do que o esperado pelos cientistas. “Ninguém esperava que acontecesse nessa intensidade, como o caso recente que tivemos do branqueamento em massa de barreiras de corais. A natureza nos mostra que estamos agindo pior do que o esperado no cenário pessimista”, analisa.


No caso do aumento das temperaturas, Prado salienta que o que era previsto para 2030 já está acontecendo. “Por exemplo, períodos em que a temperatura passaria dos 1,5 ºC e depois voltaria para 1,4 ºC, 1,3 ºC”, diz. Ele reforça o impacto desse fenômeno no planeta usando o corpo humano como analogia, uma vez que 37,5 ºC já é considerado estado febril. “Se a temperatura subir mais 2 ºC, possivelmente isso derrubará essa pessoa”, enfatiza.


Quando estendida para o planeta, essa relação entre temperatura e sobrevivência se torna tão importante quanto o exemplo usado pelo especialista da WWF-Brasil. “Então, 1,5 ºC é o que a ciência diz que é um grau seguro, que ainda consegue manter a estabilidade climática. Se tivermos 4 ºC ou 5 ºC mais quente, muitas espécies vão morrer, mas o planeta vai continuar. O fato é que a nossa espécie não vai aguentar. Muitas regiões serão inabitáveis”, observa.


O professor e climatologista Wilson Flávio Feltrim Roseghini, do Laboclima (Laboratório de Climatologia) da UFPR (Universidade Federal do Paraná), também ressalta que esse aumento nas temperaturas é muito significativo quando considerada a rapidez com que isso vem ocorrendo desde o período industrial. “Antes, a elevação das temperaturas acontecia de forma natural e gradual. O planeta conseguiu se adaptar, agora não estamos dando tempo para as espécies se adaptarem. Temos que pensar que esse planeta tem pelo menos 4 bilhões de anos”, analisa.


Ele argumenta que, apesar de grave, o cenário ainda pode ser revertido. “Não chegamos ao ponto de não retorno sobre o 1,5 º C ainda, mas estavámos tentando segurar para que isso não fosse atingido em 2100. E estamos em 2024. Se formos rápidos, conseguiremos reverter isso nas próximas décadas”, pontua Roseghini.


O climatologista destaca ainda a questão do carbono na atmosfera. “O CO2 tem um tempo de vida que pode variar de 50 a 150 anos. Isso significa que o que sentimos relacionado ao CO2 é do CO2 emitido décadas atrás. Imagine essa emissão de agora como impactará no futuro, porque ficará mais de 50 a 150 anos na atmosfera?”, questiona.


Medidas de descarbonização

A adoção de medidas para transformar esse cenário está relacionada aos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) previstos na Agenda 2030 da ONU (Organização das Nações Unidas), apontam os especialistas.


Roseghini alerta que, além de buscar resolver questões de preservação ambiental e enfrentamento da crise climática, apostando principalmente na redução das emissões de carbono, os governos precisam considerar o impacto social dessas decisões sobre as populações mais vulneráveis, como comunidades ribeirinhas e indígenas. “A busca pela transição da matriz energética precisa ser ética”, defende.


As ações pela descarbonização demandam um alcance de ponta a ponta, desde a gestão governamental até o consumo responsável. “Não adianta trocar um congestionamento de carros que emitem CO2 por um congestionamento de carros elétricos se não me preocupo com a fonte energética que abastece esses carros elétricos e com essas baterias”, frisa.


O professor recomenda que cidadãos tenham uma postura ativa no sentido de pressionar governos, agronegócio e indústrias para uma mudança de paradigma, com possibilidade de uma produção mais verde, transporte coletivo mais eficiente e cuidado com a cadeia produtiva. “A sociedade preventiva é como um seguro para o carro. É caro. Mas sem isso, quando o problema vem, sai muito mais caro para remediar”, define.


Doutorando no Programa de Meteorologia do IGA (Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas) da USP (Universidade de São Paulo), Isaque Saes Lanfredi também chama atenção para a necessidade de ação de todos os setores da sociedade, a partir de uma junção entre indivíduos, governos e empresas. “Com mais informação, as pessoas se tornam mais resilientes e fica mais fácil adotar medidas como reciclagem, uso mais consciente dos recursos da natureza e a preocupação com a origem dos produtos”, analisa Lanfredi, para quem a eleição de governantes comprometidos com as questões climáticas é essencial.


É também o que pensa Prado, do WWF-Brasil. “Não é possível desvincular o debate da política porque o setor privado segue essas decisões e isso também afeta as escolhas do consumidor”.


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