A Organização Mundial da Saúde (OMS) tem uma lista com mais de 100 razões para parar de fumar. Confira três exemplos:
1.Expectativa de vida 10 anos em média menor.
2.Duas vezes mais risco de derrame e 4 vezes mais risco de doenças cardíacas.
3.Fumar é a principal causa de câncer de pulmão.
Apesar disso, mesmo sabendo de todos os males, por que é tão difícil para o fumante se livrar do vício?
O pneumologista Frederico Fernandes resume a resposta em dois pontos:
1.”É desafiador devido à dependência física e psicológica causada pela nicotina. Ela estimula os receptores de prazer no cérebro, criando uma sensação de bem-estar que leva à dependência”, afirma Fernandes.
2.”Além disso, o hábito de fumar está associado a rotinas diárias, situações sociais e emoções, o que torna difícil abandonar um comportamento tão atrelado ao vício”, explica o pneumologista.
Mesmo diante das conhecidas dificuldades, chega a hora em que todo o fumante precisa decidir: o vício ou a saúde?
Foi o que aconteceu com auxiliar de limpeza Edsonia da Conceição Viola. Fumante há mais de 40 anos, ela conta que um dia, ao voltar do trabalho, percebeu que não estava conseguindo respirar direito. Ela estava sentindo uma pontada no peito. Assustada, foi até o pronto-socorro.
“Cheguei e entrei direto. Uma enfermeira colocou um troço no meu dedo, colocou soro e mandou eu esperar. O médico chegou e disse que eu ficaria internada. Ninguém me dizia nada, até que meu filho chegou e me contou que eu tinha tido um infarto“, relata Edsonia.
Ela ficou 23 dias internada. Foi aí que ela decidiu parar de fumar de vez.
“Só tenho mesmo que agradecer a oportunidade que Deus me deu de estar aqui de novo. Eu sei que o cigarro é muito ruim. E em primeiro lugar vem a minha saúde”.
O infarto foi em 2016. Já são oito anos sem o cigarro e um risco de morte por infarto do miocárdio reduzido pela metade.
O pneumologista conta que a saúde está entre as principais motivações para parar de fumar.
Parar de fumar por conta de própria, como fez Edsonia, não é fácil e deve ser motivo de comemoração.
O vai e volta
Não é incomum ouvir relatos de pessoas que pararam de fumar por um longo período e depois voltaram.
“Fiquei sem fumar nenhum cigarro por três anos, enquanto morei fora do país. Depois que voltei para o Brasil, em setembro de 2023, acabei voltando socialmente. Fumo alguns cigarros quando encontro amigos”, relata Renata Faia, customer service de exportação.
Esse vai e vem do tabaco pode ocorrer por diversos fatores, como estresse, pressão social, gatilhos emocionais, explica o pneumologista Fred Fernandes.
“A única saída que o fumante conhece para esses problemas é fumar. Com isso, caí novamente no vício da nicotina. Outro problema é subestimar o poder da dependência. O fumante pensa: será que eu era mesmo viciado? E fuma um cigarro para testar. Ao fazer isso, a dependência volta forte, pois são reativados os receptores de nicotina no sistema nervoso central“.
O médico ressalta que o apoio contínuo, o fornecimento de recursos para o tratamento da dependência e aprender habilidades de enfrentamento para lidar com gatilhos e estresse são essenciais para enfrentar o vício.
“É muito raro fumar e não se tornar dependente da nicotina. De cada 100 pessoas que consomem álcool, menos de 10 são dependentes, ou seja, sente os sintomas de abstinência quando ficam sem beber. No cigarro a conta se inverte. De cada 100 fumantes, mais de 90 precisam fumar todos os dias, muitas vezes toda hora, pois são dependentes da nicotina”, explica o pneumologista.
Parar de vez ou ir aos poucos?
Fred Fernandes explica que não existe uma abordagem única que funcione para todos. “Algumas pessoas têm sucesso parando abruptamente, outras preferem reduzir gradualmente o consumo de cigarros. A escolha depende das preferências individuais e da capacidade de lidar com os sintomas de abstinência”, diz.
A atriz Gabriella Drummond sempre soube que uma hora ia parar de fumar, mas a decisão veio quando a saúde apertou. Para largar o vício, adotou a estratégia de diminuir o número de cigarros por dia.
“Eu ainda estou no processo, mas venho diminuindo gradativamente. Percebi que meu vício maior é no hábito e venho trabalhando nisso. Por exemplo, logo depois do almoço eu tento demorar cada vez mais tempo para acender o cigarro. Quando vou fazer algo na rua, não levo o cigarro, já que habitualmente já estava com ele na mão. Tenho usado essa estratégia para ajudar minha cabeça a desassociar“, diz.
Se a ideia for parar gradualmente, como a Gabriella, Fred dá algumas orientações:
- • Mantenha os cigarros guardados em um local de difícil acesso.
- • Sempre que surgir o desejo de fumar, considere se é possível adiar o cigarro naquele momento.
- • Bateu aquela vontade intensa de fumar? Beba um líquido gelado ou coloque algo com um gosto forte na boca.
Benefício nos primeiros minutos
Sentir os benefícios de parar de fumar pode ser um motivador e fornecer incentivo adicional para continuar no processo de cessação.
“Essa melhora na saúde demonstra o impacto positivo imediato de abandonar o tabagismo e reforça a determinação da pessoa em permanecer livre do cigarro”, reforça Fred.
Quem decide parar de fumar sente os efeitos já no primeiro dia:
- • Após 20 minutos sem o tabaco, a pressão sanguínea e a pulsação voltam ao normal
- • Duas horas depois, não há mais nicotina circulando no sangue
- • Após 8 horas, o nível de oxigênio no sangue se normaliza
“Eu já percebo melhoras. Eu tinha muito pigarro, tossia todos os dias. Sinto também que a minha respiração está melhor”, conta Gabriella.
Renata Faia também se sente mais disposta, inclusive para as aulas de futevôlei. “Faço futevôlei na praia e sinto que tenho mais fôlego para o exercício. Além disso, já percebi que minha pele mudou, está mais viçosa”.
Procurando ajuda
Algumas estratégias podem ser eficazes para largar o cigarro:
- •Definir uma data para largar o cigarro
- •Buscar apoio da família
- •Identificar e lidar com gatilhos de fumo
- •Usar terapias de reposição de nicotina ou medicamentos sob prescrição médica
O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece tratamento gratuito para largar o tabaco. Segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), responsável pelo Programa Nacional de Controle do Tabagismo, o tratamento está disponível nos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal.
“A pessoa pode procurar uma unidade de saúde perto de casa para saber se tem o tratamento, quais os dias. A partir do momento que ela é inserida no tratamento, ela passa por uma avaliação para conduzir o tratamento de acordo com o perfil dessa pessoa”, explica Vera Lúcia Borges, psicóloga integrante da Divisão de Controle do Tabagismo do INCA.
O tratamento no SUS inclui avaliação clínica, abordagem mínima ou intensiva, individual ou em grupo e, se necessário, terapia medicamentosa juntamente com a abordagem intensiva.
“Para quem tem um nível alto de dependência, é muito importante ter o apoio profissional para largar o cigarro. Depois que a pessoa para de fumar, ela vai começar a manutenção. Essa manutenção é importantíssima para não fumar e se manter longe do cigarro”, completa a psicóloga.