O ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta quinta-feira (4) pela validade do perdão da pena concedido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro ao ex-deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado pela Corte em abril do ano passado por estímulo a atos antidemocráticos.
Mendonça abriu divergência na retomada do julgamento de quatro ações que questionam o benefício concedido por Bolsonaro a Silveira.
A análise teve início na semana passada e, nesta quarta, foi retomado com o voto da relatora, ministra Rosa Weber, que considerou o perdão ilegal (veja mais abaixo).
A ministra Rosa Weber é relatora de ações que contestaram a medida na Corte – dos partidos Rede Sustentabilidade, do PDT, do Cidadania, do PSOL.
Bolsonaro concedeu a Silveira a chamada graça presidencial, que impede a aplicação da pena de prisão e o pagamento de multa, mas os efeitos secundários da condenação permanecem: a inelegibilidade e a perda do mandato.
Os ministros devem avaliar se houve desvio de finalidade no uso do instituto e quais tipos de benefícios são alcançados.
Até a publicação desta reportagem, o ministro Nunes Marques acompanhou a divergência de Mendonça. Os demais ministros ainda devem se manifestar.
Divergência
Em seu voto, Mendonça considerou que a competência conferida na Constituição para a concessão do perdão é do presidente da República e que a análise do Poder Judiciário sobre o tema deve se limitar a questões de legalidade do procedimento, e não aos motivos do presidente.
“Descabe ao Poder Judiciário substituir o juízo da autoridade constitucionalmente capacitada [presidente] para agir”, afirmou.
Mendonça afirmou também que, após a condenação de Silveira, “surgiram vozes dizendo que a pena teria sido excessiva”. E que entendeu que, pelo “contexto daquele momento”, a “concessão da graça também teve um efeito de pacificação, ainda que circunstancial e momentâneo”.
“Entendo que descabe a esta Suprema Corte promover análise mais verticalizada acerca da existência dos apontados vícios de finalidade e abuso de poder.”
O ministro Nunes Marques acompanhou Mendonça. O ministro entendeu que o Poder Judiciário pode analisar se o decreto atendeu a requisitos legais, mas não pode discutir o mérito.
“As alegações de ocorrência de desvio de finalidade, de violação dos princípios da impessoalidade e da moralidade constituem, na verdade, tentativa de exame do mérito do ato de governo de concessão do indulto, o que se demonstra claramente inadmissível à luz da Constituição Federal de 1988, tendo em vista a observância dos limites impostos pelo texto constitucional”, argumentou.
Voto da relatora
Rosa Weber votou por invalidar o decreto sob entendimento de que houve desvio de finalidade no caso – ou seja, Bolsonaro teria usado uma atribuição do cargo de presidente, de forma aparentemente regular, para tomar uma medida que não tinha como finalidade o interesse público.
Para Weber, a ação “revela faceta autoritária e descumpridora da Constituição”.
“O presidente da República, utilizando-se da competência a ele atribuída (…), ou seja, agindo aparentemente em conformidade com as regras do jogo constitucional, editou decreto de indulto individual absolutamente desconectado do interesse público”, declarou a ministra.
O caso
O Supremo começou a analisar o caso na sessão da quinta-feira (27), quando advogados de partidos que apresentaram as quatro ações defenderam que a medida fere a Constituição.
Já a Procuradoria-Geral da República concluiu que o perdão é constitucional – mas só tem efeito sobre as implicações penais da condenação, isto é, Silveira permaneceria com os direitos políticos suspensos.
O ex-deputado foi condenado pelo Supremo, em abril do ano passado, a oito anos e nove meses de prisão por estímulo a atos antidemocráticos e ataques aos ministros do tribunal e instituições, como o próprio STF.
Ele também foi condenado à perda do mandato, à suspensão dos direitos políticos e ao pagamento de multa de R$ 212 mil. Um dia depois, Bolsonaro concedeu o perdão da pena.