Nesse mês de setembro de 2022 a impressão que os habitantes de Rio Branco estão tendo, em função do aumento dramático na poluição atmosférica causada por fumaça de queimadas, é que uma onda assustadora de desmatamentos aconteceu por todo o Acre e regiões vizinhas.
Para além das derrubadas e queimadas de nossas florestas, uma das explicações para a situação crítica que toda a região leste do Acre vive em 2022 é a ocorrência de um período de seca extrema, mais ou menos parecida com as secas registradas em 2010 e 2016, mas, felizmente, distante da situação vivida durante a “seca do século” de 2005.
A fumaça que tem encobrido a região leste do Acre, incluindo a cidade de Rio Branco, é possivelmente oriunda de queimadas de áreas florestais recém desmatadas no Acre e regiões adjacentes no sul do estado do Amazonas e Rondônia.
O fato de a fumaça de queimadas nessas regiões passar sobre Rio Branco deriva da existência de correntes de ar naturais que sopram no sentido Leste-Oeste do Oceano Atlântico para o interior da Amazônia até atingir os Andes, que servem como barreira e desviam essa corrente para o Sul-Sudeste.
Assim, essa corrente de ar, que naturalmente leva a umidade produzida na floresta amazônica para a região sudeste do Brasil (os chamados “rios voadores”), durante o período de queimadas na Amazônia, também distribui a fumaça produzida pela destruição da floresta ao longo da sua trajetória.
Quando frentes frias sobem do sul do continente, elas trazem, além de massas de ar mais frias, poluição de queimadas realizadas ao longo de sua trajetória, tanto na Bolívia quanto no Mato Grosso. Por uma coincidência trágica, as “friagens” chegam ao Acre somente no período mais seco do ano, quando as queimadas também se intensificam nas regiões citadas.
De uma maneira geral, a fumaça que toma conta do ar em nossa região durante o período mais seco do ano é resultado da queima de áreas florestais recém desmatadas. E quanto maior for o desmatamento, maior é a quantidade de fumaça produzida, pois os focos de calor (queimadas) são mais numerosos.
Em anos atípicos, mais secos que o normal como tem sido em 2022, se observa também a ocorrência de numerosas queimadas (espontâneas ou provocadas) em áreas já alteradas e/ou degradadas, como, por exemplo, pastagens, terrenos abandonados e margens de estradas. Geralmente o fogo que atinge essas áreas tende a avançar em áreas florestais adjacentes, intensificando a produção de fumaça.
A seca e essa conjunção de fatores apresenta resultados dramáticos. No Acre, o total de focos de queimadas detectados nos primeiros 14 dias de setembro representou quase 58% do total de queimadas identificados durante todo o ano de 2022. Eles também foram quase 60% superior ao total de queimadas registradas durante os 31 dias do último mês de agosto.
Além da poluição produzida pelas “queimadas domésticas”, o Acre também sofre com as queimadas em regiões vizinhas. Merece destaque o aumento em 2022, segundo dados do INPE, de cerca de 17% no número de queimadas detectadas na região de divisa dos estados do Amazonas, Acre e Rondônia, conhecida pelo acrônimo AMACRO.
As queimadas afetam negativamente tanto o meio ambiente quanto a saúde dos habitantes das regiões onde elas são realizadas.
Para o meio ambiente, elas resultam na destruição e degradação florestal, reduzindo a biodiversidade da fauna e da flora. A emissão de gases e fumaça pelas queimadas contribuem para o aumento do aquecimento global e “efeito estufa”, resultando em severos desequilíbrios na temperatura global e nos ciclos hidrológicos.
A seca que estamos vivenciando em 2022 é, possivelmente, resultado desses desequilíbrios ambientais e seus efeitos tem sido severos para os habitantes de Rio Branco e cidades vizinhas.
A chuva abundante ocorrida na tarde-noite de 14 de setembro encerrou um ciclo de estiagem em Rio Branco que já durava cerca de 40 dias. No dia 11 de setembro o rio Acre atingiu a conta de 1,29 m, a menor de sua história. Na cidade de Bujari, o nível do reservatório da cidade baixou para cerca de 1 m, forçando o racionamento na distribuição de água.
A poluição atmosférica causada pelas queimadas atingiu níveis alarmantes em 2022.
Dados da rede de monitoramento da qualidade de ar mantida pelo Ministério Público do Acre indicaram que no dia 7 de setembro a poluição do ar em Rio Branco atingiu uma média de 175 microgramas/m³ de ar. Esse valor é cerca de 10 vezes maior que o limite recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Nesse dia, por volta das 8 h, se verificou um pico de poluição de cerca de 370 microgramas por metro cúbico de ar.
A inalação dessa poluição causa doenças respiratórias na população, especialmente em crianças e idosos. Isso tem se comprovado em Rio Branco pela lotação das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs). A exposição constante a esses níveis de poluição pode resultar, segundo o professor Foster Brown (UFAC), na redução entre 1 e 3 anos da expectativa de vidas dos habitantes de Rio Branco.
Diante dessa situação, a população do Acre e de regiões vizinhas tem de cobrar das autoridades responsáveis um endurecimento nas medidas de fiscalização e controle de derrubadas e queimadas em áreas florestais e/ou já alteradas/degradadas por toda a região.
No âmbito do Acre, deve-se cobrar do Governador e seus assessores ambientais o compromisso para cumprir duas iniciativas fundamentais: (1) Executar integralmente o Plano Estadual de Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas, cujas metas para o período 2023-2027 estão sendo discutidas nessa semana, e (2) Dar todo o apoio logístico e financeiro para que o IMAC e a SEMA possam cumprir com zelo e eficiência as funções para as quais foram criados, ou seja, prevenir e combater derrubadas e queimadas ilegais no Acre.
Fonte/ A Gazeta do Acre