Quando resolveu se dedicar à enfermagem, Marlene Ricardo, de 37 anos, jamais imaginou que em algum momento teria que se afastar dos filhos para poder trabalhar. Mas, teve que tomar a difícil decisão após osprimeiros casos de Covid-19 serem registrados em Cruzeiro do Sul.
A enfermeira trabalha na UTI onde ficam apenas os pacientes graves de Covid-19 no Hospital do Juruá e, desde o dia 12 de maio, decidiu deixar os filhos na casa da irmã, que mora em frente, para evitar que eles pegassem a doença.
Ela é mãe de Marlon Rian, de 6 anos, e Laisa Lorrane, de 12. Como trabalha no setor de maior contágio da unidade, ficou com medo de acabar levando o vírus para dentro de casa. São mais de dois meses sem poder tocar nos filho.
E nesta quinta-feira (21), a irmã dela, Cirlene Ricardo, que está cuidando das crianças, teve a ideia de envolvê-los em um saco plástico para que pudessem abraçar e beijar a mãe.
O abraço demorado e emocionado foi registrado por uma amiga das duas irmãs. Como mora perto, mas não pode chegar perto das crianças, Marlene vê os filhos apenas de longe, do outro lado da rua.
Apesar de difícil, a mais velha consegue entender melhor a situação, mas Marlon tem sentido bastante a falta do colo da mãe. “Ele chora todo dia querendo abraçar a mãe. Até que vi essa ideia na internet e mostrei pra ele. Quando ele viu, começou a chorar dizendo que queria abraçar a mãe dele e então peguei um saco de colchão que tinha na garagem e fiz o encontro”, conta.
O saco foi higienizado para que os filhos pudessem de novo sentir o abraço da mãe.
‘Tô com muita saudade’
A distância física entre mãe e filho é amenizada pela tecnologia. No Dia das Mães, Marlon gravou um vídeo para a mãe falando da saudade e vontade de poder estar junto novamente.
“Eu tô louquinho para abraçar e beijar a senhora porque eu tô com muita saudade. Que Deus abençoe a senhora pelo Dia das Mães”, diz antes de terminar o vídeo.
A mãe conta que, como mora em frente da casa da irmã, o pequeno a chama por diversas vezes pedindo para abraçá-la, mas que, mesmo com o coração partido, ela evita com medo de passar algo para o filho.
“Ele tem sido muito forte ultimamente, mas ontem [quinta, 21] ele desabou, chorou e disse que só ia comer quando voltasse pra casa. Foi muito bom mesmo poder abraçar meus filhos, porque eu tenho tentado ser forte há muitos dias. Somos uma família grande, unida, mas estamos divididos porque não podemos estar perto. Eu não queria mais soltar”, se emociona.
Outro desafio para ela é passar o dia do aniversário da filha longe. Laisa completa 12 anos nesta sexta-feira (22) e, segundo a mãe, ela montou um painel na varanda da casa da tia pra que ela pudesse ver de longe.
“Eu precisava abraçar minha filha. São 12 anos que somos mãe e filha e amigas. Ela é uma filha maravilhosa, meiga e essa é a primeira vez que não vou poder estar junto”, lamenta.
Saudade
Marlene teve que ficar longe dos pais também. Ela disse que essa distância e a falta de contato físico é o que mais pesa neste período de crise.
“Enquanto estivermos nessa crise, vou ter que estar trabalhando e não quero levar risco para minha família, por isso prefiro me isolar. O que a gente da Saúde queria mesmo era que cada um fizesse sua parte, ficasse em casa, parasse de sair nas ruas. Porque enquanto isso não acabar, vamos estar distantes de quem a gente ama”, fala entre lágrimas.
O acolhimento da família, os almoços e sentir. Quem diria que com um tempo seria possível sentir saudade do simples ato de cumprimentar, ter o toque. Um abraço em um domingo em família.
Isso é ainda mais forte para aqueles que deixaram suas famílias e rotinas para cuidar dos outros. Mas, até para Marlene, que tenta ser forte todos os dias no combate a esse vírus, tem horas que é difícil controlar a vontade de um abraço.
“Somos uma família que se reúne no fim de semana. Não tenho visto minha mãe e nem meu pai, sendo que a gente almoçava junto todo fim de semana e eu perdi tudo isso. Peço a Deus que tudo isso passe. Eu quero muito ir para casa, encontrar minha família e abraçar os meus”, finaliza ao se emocionar mais uma vez.