O deputado federal Guilherme Derrite (PP-SP) apresentou, na noite de segunda-feira (10), uma nova versão do relatório do projeto de lei antifacção, restabelecendo parte dos poderes da Polícia Federal (PF) no combate ao crime organizado.
O novo parecer vem após forte reação da PF, do Ministério da Justiça, e da Receita Federal, que apontaram riscos de enfraquecimento da atuação federal contra facções criminosas e milícias.
O texto, que deve ser votado nesta terça-feira (11) na Câmara dos Deputados, propõe mudanças significativas em relação ao projeto original enviado pelo governo Lula (PT).
O Executivo criou o Marco Legal do Combate ao Crime Organizado, que endurece punições e amplia os instrumentos de investigação. A proposta eleva as penas da Lei das Organizações Criminosas — de 3 a 8 anos para 5 a 10 anos de prisão — e cria a figura da “organização criminosa qualificada”, punida com até 15 anos nos casos em que há domínio territorial com uso de violência, coação ou ameaça.
Derrite manteve parte dessas medidas, mas introduziu mudanças estruturais no texto. A principal delas é a inclusão de 11 condutas atribuídas a facções, milícias e grupos paramilitares na Lei Antiterrorismo, equiparando as penas às de crimes terroristas.
O parecer também cria oito agravantes e prevê aumento de pena de metade a dois terços para líderes de organizações criminosas, ainda que não sejam autores diretos dos delitos.
O que muda no texto
No ponto mais polêmico do relatório, Derrite alterou o papel da Polícia Federal (PF) no combate ao crime organizado. O texto original do governo garantia à PF uma atuação ampla e independente em investigações sobre facções e milícias.
Já a primeira versão do relatório de Derrite limitava essa atuação, condicionando-a à solicitação dos governadores, uma mudança que gerou forte reação de integrantes do governo federal, do Ministério da Justiça e da própria PF.
Após as críticas, o deputado recuou e reformulou o trecho. A nova versão garante que a PF atue “em caráter cooperativo” com as polícias estaduais, sempre que os fatos envolverem matérias de sua competência constitucional ou legal.
Segundo o relator, essa redação “preserva as prerrogativas já garantidas na legislação e promove a integração cooperativa interinstitucional que se espera em crimes dessa complexidade”.
Ainda assim, integrantes da PF e do governo consideram que a mudança não elimina completamente os riscos de interferência política e fragilização da atuação federal.
Outra mudança relevante está na tipificação dos crimes. Enquanto o texto original do governo mantinha a definição dentro da Lei das Organizações Criminosas, o parecer de Derrite amplia o alcance e transfere parte das condutas para a Lei Antiterrorismo, endurecendo as penas e o enquadramento jurídico.
O relator também manteve a criação da figura da “organização criminosa qualificada”, mas acrescentou novos agravantes e aumentos de pena para líderes e financiadores de facções, ainda que não executem diretamente os crimes.
Derrite também propôs a criação de um Banco Nacional de Membros de Organizações Criminosas, acompanhado de bancos estaduais interligados para facilitar o intercâmbio de informações. O texto prevê ainda que os indivíduos cadastrados nesses bancos se tornem inelegíveis, impedindo que disputem cargos públicos.
Por fim, o relator introduziu um capítulo autônomo sobre perdimento de bens, que cria uma Ação Civil Autônoma de Perdimento, voltada a asfixiar financeiramente facções e milícias. A medida complementa os instrumentos penais já previstos na legislação, ampliando o alcance das ações patrimoniais contra o crime organizado.
Consultas
Derrite afirma que as mudanças foram elaboradas após ouvir “diversas sugestões de parlamentares, magistrados, membros do Ministério Público, advogados e agentes de segurança”, e que o objetivo é “aperfeiçoar a legislação e garantir mais efetividade às investigações”.
Apesar do recuo parcial, o Ministério da Justiça, segundo apuração da Folha de S. Paulo, avalia que o novo texto ainda mantém brechas que podem limitar a autonomia da Polícia Federal.
A votação do projeto ocorre em meio a um ambiente político tenso, com embates entre o governo federal e governadores aliados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O PL Antifacção, apresentado como resposta à crise na segurança pública após a operação que deixou 121 mortos no Rio de Janeiro, se tornou um dos temas centrais da semana no Congresso e deve medir forças entre Planalto e oposição.