Sheikh Hasina, ex-primeira-ministra de Bangladesh, foi condenada à morte nesta segunda-feira (17) após ser considerada culpada de crimes contra a humanidade pela violenta repressão aos protestos estudantis do ano passado, que levaram à queda de seu governo.
Um painel de três juízes do Tribunal Penal Internacional, o tribunal interno de Bangladesh para crimes de guerra, proferiu seu veredito na segunda-feira, determinando que Hasina foi responsável por incitar centenas de execuções extrajudiciais realizadas pelas forças de segurança.
O tribunal, onde estavam presentes algumas famílias das vítimas, irrompeu em aplausos quando os juízes leram a sentença.
“Sheikh Hasina cometeu crimes contra a humanidade por sua incitação, ordens e omissão em tomar medidas punitivas”, declarou um dos juízes ao proferir o veredito.
Ficou “cristalino” que ela “incitou os ativistas de seu partido… e, além disso, ordenou que matassem e eliminassem os estudantes que protestavam”, disseram os juízes.
Acredita-se que cerca de 1.400 manifestantes tenham sido mortos e até 25 mil tenham ficado feridos durante as semanas de protestos em 2024, segundo o tribunal.
Hasina enfrentou cinco acusações relacionadas principalmente à incitação ao assassinato de manifestantes, à ordem de enforcamento de manifestantes e à ordem de uso de armas letais, drones e helicópteros para reprimir os protestos. Ela nega as acusações.
A ex-premiê permanece em exílio autoimposto na Índia, para onde fugiu no ano passado, e não compareceu ao tribunal em Dhaka.
O julgamento foi criticado por seus advogados, que na semana passada apresentaram um recurso ao Relator Especial das Nações Unidas sobre execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias, devido a “sérias preocupações com a falta de direitos a um julgamento justo e ao devido processo legal”.
A ex-líder governou a nação do sul da Ásia com mão de ferro de 2009 até sua destituição em 2024, e teme-se que o veredito desta segunda-feira (17) possa desencadear uma onda de caos político antes das eleições nacionais previstas para fevereiro do próximo ano.
O que começou como protestos pacíficos de estudantes contra cotas para empregos no funcionalismo público no ano passado transformou-se em uma mobilização nacional pela renúncia de Hasina.
O ponto de virada foi a repressão do governo que pode ter deixado até 1.400 mortos, segundo o escritório de direitos humanos da ONU.
Hasina vive em Nova Délhi, capital da Índia, desde agosto do ano passado, após os protestos terem forçado ela a deixar o poder, juntamente com seu partido político, a Liga Awami.
O governo interino de Bangladesh solicitou formalmente sua extradição, mas Nova Délhi permanece em silêncio sobre o pedido até o momento.
Novos episódios de violência antes do veredito
A violência eclodiu Daca, capital de Bangladesh, antes do veredito, com diversos coquetéis Molotov explodindo após serem atirados por pessoas em motocicletas no domingo (16), informou a polícia.
A segurança foi reforçada, com veículos blindados e policiais com escudos antimotim posicionados ao redor do tribunal, e policiais, guardas de fronteira e equipes de ação rápida mobilizados perto de importantes prédios governamentais.
O filho de Hasina disse à agência de notícias Reuters no domingo que os apoiadores de seu partido bloqueariam as eleições do ano que vem caso a proibição imposta ao partido não fosse suspensa, alertando que os protestos poderiam se tornar violentos.
“Não permitiremos que as eleições aconteçam sem a Liga Awami”, afirmou ele. “Nossos protestos ficarão cada vez mais intensos e faremos o que for preciso. A menos que a comunidade internacional faça algo, provavelmente haverá violência em Bangladesh antes dessas eleições… haverá confrontos.”
A trajetória política da ex-premiê é uma história de tragédia, exílio e poder, intrinsecamente ligada à história de seu próprio país.
Sob sua liderança, Bangladesh entrou em uma era de significativo desenvolvimento econômico, embora também marcada por acusações de corrupção, retrocesso democrático, autoritarismo e violações dos direitos humanos.
Uma vida na política
Filha mais velha de Sheikh Mujibur Rahman, pai fundador de Bangladesh, ela foi lançada na política ainda jovem, ao testemunhar a luta pela autonomia da região de Bengala em relação ao Paquistão.
Após um golpe militar em 1975, no qual seu pai, sua mãe e três irmãos foram assassinados, Hasina e sua irmã foram forçadas ao exílio.
Ela retornou a Bangladesh em 1981 para liderar a Liga Awami de seu pai e, após anos de oposição política, tornou-se primeira-ministra pela primeira vez quando o partido venceu as eleições de 1996.
Hasina cumpriu um mandato e, posteriormente, retornou ao poder em 2008, governando Bangladesh com a Liga Awami até o ano passado.
O governo do país apresentou forte crescimento econômico, mas organizações de direitos humanos alertaram que ela e sua administração estavam caminhando para um sistema de partido único.
Críticos expressaram preocupação com o aumento de relatos de violência política, intimidação de eleitores e assédio à mídia e a figuras da oposição.
Durante seu mandato, grupos de direitos humanos afirmam que o governo usou sua lei de segurança cibernética para reprimir a liberdade de expressão online, prendendo jornalistas, artistas e ativistas, com relatos de detenções arbitrárias e tortura.

Mas Hasina havia conseguido resistir a muitos protestos anteriores contra seu governo, que eclodiram principalmente durante as eleições.
Isso mudou no ano passado, com a bem-sucedida revolução liderada pela Geração Z, que derrubou seu poder.
Muitos membros de sua família, juntamente com importantes líderes do partido e ex-ministros de seu governo, também residem fora de Bangladesh.
Os apoiadores de Hasina rejeitam o processo judicial, alegando motivação política e uma tentativa de afastá-la da política.
O partido Liga Awami está proibido de exercer atividades políticas enquanto os julgamentos contra a ex-premiê e líderes do partido continuam.
Por outro lado, o governo interino liderado pelo ganhador do Prêmio Nobel, Muhammad Yunus, afirma que esses julgamentos são um passo essencial para restaurar a responsabilização e reconstruir a confiança pública nas instituições democráticas do país.


