O ministro da Justiça e da Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, vai enviar nesta quarta-feira (22) ao governo, por meio da Casa Civil, um projeto de lei que endurece as penas para organizações criminosas.
O texto cria a modalidade qualificada desse crime — quando houver domínio de território —, facilita ações contra empresas usadas pelo crime organizado e regula a gravação de conversas entre criminosos e advogados dentro da prisão (leia mais abaixo).
A proposta, que já chegou a ser chamada de “antimáfia”, foi batizada pelo governo de Projeto de Lei Antifacção. Para entrar em vigor, o texto precisará ser aprovado no Congresso, o que ainda não tem data para ocorrer.
Pelo projeto, a pena atual de 3 a 8 anos de prisão para quem integra, promove ou financia uma organização criminosa será elevada para 5 a 10 anos de prisão.
Quem é condenado por integrar organização criminosa está sujeito à pena desse crime somada às penas dos demais crimes praticados pelo grupo — por exemplo, tráfico, corrupção ou homicídio.
- • 🔎 O projeto também cria a “organização criminosa qualificada”, com pena de 8 a 15 anos de prisão quando a atuação do grupo envolver o controle de territórios ou de atividades econômicas por meio de violência ou ameaça — mirando, por exemplo, nas milícias.
- • 🔎 Esse crime passa a ser considerado hediondo, o que significa que será inafiançável e não poderá ser perdoado por indulto ou anistia.
- • 🔎 Há ainda a previsão de pena de 12 a 30 anos de prisão, uma das mais altas da legislação brasileira, em caso de homicídio praticado a mando de uma organização criminosa qualificada.
Versão anterior do texto, elaborada por um grupo de trabalho a pedido do Ministério da Justiça, previa pena de 12 a 20 anos para a modalidade qualificada, que acabou reduzida no projeto final após análises internas no ministério.
Causas de aumento de pena
A punição para a organização criminosa poderá ser aumentada de dois terços até o dobro quando houver:
- • uso de arma de fogo ou explosivo;
- • morte ou lesão corporal de agente de segurança;
- • participação de criança ou adolescente no grupo;
- • envolvimento de servidor público;
- • infiltração do crime no setor público, em licitações e contratos com governos;
- • atuação transnacional e remessa de dinheiro para o exterior.
Todas essas inovações se devem à preocupação com a atuação de facções criminosas como o Primeiro Comando da Capital (PCC), que, segundo investigações recentes, têm usado empresas para lavar dinheiro e participado de licitações de serviços públicos como transporte coletivo e coleta de lixo.
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Operação flagra irregularidades em postos de combustíveis de organização criminosa investigada por ligação com o PCC — Foto: Reprodução/TV Globo
Outras mudanças
Além de elevar as penas, o projeto do Ministério da Justiça também prevê medidas para facilitar a investigação, como a infiltração de policiais e de colaboradores (delatores) nas organizações criminosas e a criação de empresas fictícias para fingirem ser parte do esquema a fim de desbaratá-lo.
O texto estabelece regras para manter essas atuações em sigilo durante as investigações.
Dentro do sistema prisional, a proposta prevê novas regras para monitorar as conversas entre presos ligados a organizações criminosas e seus advogados, seja no parlatório ou por videochamada.
Para gravar as conversas, será necessária ordem judicial e a existência de indícios de que a comunicação com o advogado está servindo a fins criminosos. Esse ponto pode gerar debates no mundo jurídico devido à regra geral de sigilo nas conversas entre advogados e seus clientes.
A proposta do ministério prevê ainda que a Justiça determine uma intervenção judicial em empresas que estiverem sendo usadas por organizações criminosas, com a nomeação de um gestor externo.
Também será possível que os contratos dessas empresas com o poder público sejam suspensos cautelarmente durante a fase de investigação, a partir de uma decisão judicial ou administrativa.
O tema das relações entre empresas e o crime organizado ganhou relevância nacional no final de agosto, quando o Ministério Público de São Paulo e a Polícia Federal (PF) deflagraram uma operação contra a lavagem de dinheiro do PCC, a Carbono Oculto.
Revelou-se na ocasião que empresas de combustíveis e fintechs — que usam a tecnologia para facilitar o acesso a serviços financeiros — sediadas na avenida Faria Lima, centro financeiro de São Paulo, estariam envolvidas com atividades criminosas da facção.
O que ficou de fora
O projeto finalizado por Lewandowski deixou de fora a criação de uma agência nacional para combater o crime organizado. A ideia estava no texto inicial que um grupo de trabalho formulou e era defendida sobretudo por membros do Ministério Público.
Houve críticas por parte da PF. Prevaleceu no Ministério da Justiça o entendimento de que essa iniciativa poderia ser inconstitucional, pois retiraria das instituições de segurança pública listadas na Constituição a atribuição de combater o crime.
O texto final também não trará alterações nas penas para crimes eleitorais cometidos no contexto de organização criminosa, como compra de votos e caixa dois. Na primeira versão, previa-se dobrar as penas dos delitos do Código Eleitoral quando ligados ao crime organizado.
No entanto, já existem outros projetos no Congresso, apresentados por parlamentares, com esse mesmo teor. Há preocupação de que o crime organizado se infiltre na política por meio de eleições.