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Lula avalia investimento de R$ 30 bilhões fora do arcabouço para Forças Armadas

Dinheiro seria aplicado necessariamente na modernização do Exército, da Marinha e da FAB • Marinha/Divulgação

Diante do aumento das tensões geopolíticas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e seus ministros discutiram uma nova exceção ao arcabouço fiscal para acomodar investimentos em programas estratégicos das Forças Armadas.


A ideia aventada no governo é enviar ao Congresso Nacional um projeto de lei complementar tirando R$ 30 bilhões, distribuídos ao longo de seis anos, do limite de gastos.


O dinheiro seria aplicado necessariamente na modernização do Exército, da Marinha e da FAB (Força Aérea Brasileira) — possibilitando tirar do atraso programas como o Sisfron (Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras), o desenvolvimento do primeiro submarino nuclear brasileiro e a renovação da frota de caças com os jatos suecos Gripen NG.


O assunto foi debatido de forma reservada pelo presidente com os ministros Rui Costa (Casa Civil), Fernando Haddad (Fazenda) e José Múcio (Defesa). Nos próximos dias, Lula e seus auxiliares devem retomar a discussão.


Um dos argumentos levantados no governo é que essa alternativa seria mais viável, politicamente, do que a PEC 55 — proposta de emenda à Constituição que garantiria ao Ministério da Defesa, todos os anos, um orçamento equivalente a 2% do PIB. 


Apresentada em 2023, essa PEC está travada no Senado.


Uma das críticas a ela é criar uma nova vinculação constitucional quando o mantra recente, entre economistas preocupados com o crescimento da dívida pública e com a deterioração dos indicadores fiscais, é a necessidade de fazer desvinculações orçamentárias (como os pisos de saúde e educação).


Segundo relatos feitos à CNN, a equipe econômica reconhece a necessidade de aumentar os investimentos em defesa.


Entende, porém, que o avanço de uma reforma do sistema de proteção social das Forças Armadas e o fim da “morte ficta” (pagamento para famílias de militares expulsos do serviço ou condenados por crimes) deve ser uma contrapartida à eventual exceção do arcabouço.


Essas duas medidas foram enviadas ao Congresso em um pacote de contenção de despesas públicas, no fim de 2023, mas estão praticamente paralisadas no Legislativo.


Se for levada adiante, a proposta cogitada no Palácio do Planalto seria a sexta exceção às regras do arcabouço fiscal em menos de três anos. A lista inclui:


Na avaliação de auxiliares diretos de Lula, entretanto, é preciso levar em conta o sucateamento das Forças Armadas e a crescente dificuldade de honrar os cronogramas planejados dos projetos estratégicos de defesa, em um contexto de aumento global dos gastos militares.


De acordo com o prestigiado Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz, sediado em Estocolmo, as despesas bélicas atingiram em 2024 o maior nível das últimas quatro décadas.


Houve um aumento de 9,4% na comparação com o ano anterior. O gasto total chegou a US$ 2,718 trilhões. Para o Sipri, sigla em inglês do instituto, não existe um fim à vista para a crescente corrida armamentista mundial.


Enquanto isso, no Brasil, os projetos estratégicos de defesa padecem com a insuficiência de recursos.


Na semana passada, em um debate na CRE (Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional) do Senado sobre a PEC 55, a FAB indicou uma nova mudança no cronograma de entrega dos caças Gripen ao Brasil.


O tenente-brigadeiro Walcyr Josué Araújo, chefe do Estado-Maior da Aeronáutica, apresentou um calendário atualizado das entregas. O último lote, com cinco aeronaves, foi para 2032.


Até agora, a conclusão do pacote estava prevista para 2027. Dos 36 caças, porém, o tenente-brigadeiro sinalizou que apenas 16 terão chegado ao Brasil nesse prazo.


“Nós fizemos sucessivos termos aditivos. Estamos hoje no 12º, e os senhores veem que já temos a perspectiva de ter a última aeronave em 2032”, disse Araújo aos senadores.


A culpa é da insuficiência de recursos. “A falta de previsibilidade orçamentária faz com que não possamos aplicar os recursos de forma totalmente racional e equilibrada nesse contrato”, disse o oficial.


“Já estamos investindo mais de 13% acima do valor inicial devido à necessidade de reajustes e reequilíbrios. Isso equivaleria, apenas com essa diferença, a adquirir mais seis aeronaves das 36 originalmente contratadas”.


Em junho, a CNN mostrou o atraso na implementação do Sisfron e a readequação de cronograma feita pelo Exército diante da escassez de verbas.


O sistema, que busca aumentar a capacidade de vigilância sobre quase 17 mil quilômetros de fronteiras, tinha conclusão prevista para 2021.


Menos de 30% foram efetivamente executados e o prazo migrou para 2039. A última adequação do calendário havia arrastado a implantação do Sisfron para 2035, mas esse ajuste também ficou inexequível.


Até o fim deste ano, pouco menos de R$ 3 bilhões dos R$ 15 bilhões necessários terão sido investidos, segundo dados do Exército acessados pela CNN.


Na Marinha, a prioridade é o desenvolvimento do primeiro submarino nuclear brasileiro.


O orçamento para o programa como um todo (o que inclui a reta final dos submarinos convencionais), além da construção de um reator nuclear multipropósito em Iperó (SP), se estabilizou em um patamar de R$ 2 bilhões anuais — pouco mais ou pouco menos.


No começo do programa, quando o Brasil viveu um auge de crescimento econômico, chegou a ter quase R$ 4 bilhões por ano. Depois, durante a recessão de 2015/2016, houve uma queda para cerca de R$ 1,5 bilhão. Em seguida, veio a estabilização. Em 2025, voltou para a casa de R$ 2 bilhões.


Conforme relatos feitos à CNN por oficiais da Marinha, apesar da cifra elevada, esse valor seria insuficiente para manter o cronograma de lançamento ao mar do submarino a propulsão nuclear em 2034 ou 2035.


Caso o fluxo de investimentos anuais seja mantido no patamar atual, o plano provavelmente passaria para o fim da próxima década, mais perto de 2040.


Manter o cronograma de 2034 ou 2035 demandaria, segundo almirantes ouvidos pela CNN, um aporte adicional de pelo menos R$ 1 bilhão por ano. Não é a única ameaça orçamentária aos programas da Marinha.


A força naval desativará 43 embarcações — cerca de 40% de sua frota — até 2028, quando elas chegam ao fim da vida útil. Por enquanto, faltam garantias de reposição.


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