A escolha de Alfredo Gaspar (União-AL) como relator da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS surpreendeu até mesmo o próprio deputado. Em entrevista ao InfoMoney, o parlamentar diz que não esperava assumir o posto. A nomeação foi possível por uma manobra da oposição, que melou o nome do senador Omar Aziz (PSD-AM), preferido pelos governistas para assumir a presidência da comissão.
O relator delimitou os últimos 10 anos como foco da apuração da comissão, o que inclui todas as gestões desde o segundo mandato de Dilma Rousseff (PT). Questionado sobre a eventual convocação para depor na CPMI do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Gaspar evoca o “princípio da igualdade” para dizer que, se fizer isso, terá de chamar também Dilma, Michel Temer (MDB) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Gaspar afirma que pretende avançar nas investigações sobre descontos em folha e empréstimos consignados dos beneficiários do INSS. O relator diz que vai usar o método de “seguir o dinheiro” para identificar envolvidos no esquema de corrupção.
Confira os principais trechos da entrevista com o relator da CPMI, deputado Alfredo Gaspar:
InfoMoney – O que o considera mais importante no plano de trabalho apresentado à CPMI do INSS?
Alfredo Gaspar – O fundamental é ter uma estratégia de investigação, saber onde queremos chegar. Para chegar em determinado ponto final de uma investigação, você tem que seguir eixos, que foi o que coloquei no plano de trabalho. A melhor forma de se chegar onde queremos é seguir o dinheiro e vamos fazer isso. Estamos tratando de um grande caso de corrupção, desvio de recursos de milhões de aposentados e pensionistas, além dos empréstimos consignados. Seguindo o dinheiro nós teremos um relatório consubstanciado na verdade. Nós podemos contar com muita tecnologia e dados que adiantarão demais as investigações
IM – Quem o senhor pretende ouvir durante a CPMI?
AG – Nós decidimos, em acordo com os membros da comissão, aprovar todos os requerimentos que eu fiz. A minha proposta é convidar todos os ex-ministros da Previdência desde 2015 – que inclui o segundo governo Dilma, o governo Temer, o governo Bolsonaro e o terceiro governo Lula – e o ministro atual. Esta proposta foi transformada em convite, que é diferente de convocação.
Vamos convocar todos os ex-presidentes e o atual do INSS, todos os ex-presidentes e o atual da Dataprev e todos os presidentes de associações que tem acordo de cooperação técnica ou tiveram para desconto direto dos aposentados e pensionistas. São muitas associações que atuaram durante este período de tempo e tiveram a oportunidade de recolher milhões de reais e algumas até bilhões.
Também queremos ouvir os profissionais das áreas técnicas que investigaram a operação “Sem Desconto”. Ouviremos também o núcleo criminoso que já está descoberto, Maurício Camisotti, Antônio Carlos Camilo Antunes – conhecido como Careca do INSS -, e André Fidelis.
IM – Por que o senhor decidiu delimitar o prazo da investigação a partir do governo Dilma?
AG – As notícias de desvios, e são verdadeiras, vêm de muitos anos. Basta lembrar o caso de Jorgina Freitas em 1991. Mas não dá para você fazer uma investigação sem fim, porque seria inútil. A investigação precisa ter celeridade e, acima de tudo, utilidade. Decidi utilizar como marco temporal o prazo da prescrição média desses crimes. Por isso, vamos começar do governo Dilma.
IM – A oposição quer convocar Frei Chico, irmão do presidente Lula, e a base governista, o ex-presidente Jair Bolsonaro. É possível que essas convocações sejam aprovadas?
AG – Quem define a pauta é o presidente. Meu primeiro requerimento, na qualidade de membro da CPMI, foi de convocação do irmão do Lula. Agora, eu sou relator e tenho que seguir o rito procedimental. Nós não podemos nem proteger nem perseguir. Quem for de interesse para a investigação tem que ser ouvido. A convocação do irmão de Lula, no momento oportuno, quando formos ouvir os dirigentes sindicais, vai ser colocada em apreciação. Em relação a Bolsonaro, acho justo o princípio da igualdade. Só justifica ouvir Bolsonaro se ouvir também Lula, Dilma e Temer.
IM – O presidente da CPMI, senador Carlos Viana (Podemos-MG), ameaçou suspender a credencial de profissionais que divulgarem informações sigilosas da comissão. O senhor concorda?
AG – O presidente me parece uma pessoa cordata, equilibrada. Na primeira oportunidade que ele teve, quando saiu da CPMI, foi pedir desculpas aos jornalistas, reconhecendo que as palavras dele poderiam ter sido mal interpretadas, até porque ele também é jornalista. Tenho certeza que a imprensa vai ser uma grande parceira neste percurso, tem um papel fundamental e nós temos que, cada vez mais, focar na liberdade de expressão, que também é liberdade de informação.
IM – O esquema do INSS foi investigado pela Polícia Federal e pela Controladoria Geral da União. Como a CPMI pode avançar?
AG – Ainda tem muita coisa para ser descortinada. Principalmente, envolvendo pessoas acima dos que já foram identificados. E tem a questão dos consignados, que nós vamos poder avançar. O que foi descoberto pela Polícia Federal e pela CGU diz respeito a uma parcela de muitas associações que ainda estão aí para serem investigadas.
IM – O senhor acredita que vão surgir fatos novos ao longo da investigação da CPMI? Estes fatos podem envolver empréstimos consignados?
AG – Não tenho a menor dúvida, porque em relação a isso não sabemos o quanto a investigação avançou. Nós saberemos com essas requisições de documento que a CPMI fará. Seria prematuro da minha parte dizer, mas há muita notícia de irregularidade, muita notícia de desconto indevido em relação a crédito consignado. Nós vamos aprofundar as investigações.
IM – Após a aprovação do plano de trabalho, quais serão os próximo passos?
AG – O plano de trabalho foi aprovado, mas também foram aprovadas dezenas de requerimentos. Então a gente tem muitos convocados para serem ouvidos. O próximo passo é que, ultrapassada essas convocações, o colegiado vai decidir em qual direção seguir. Se vai adentrar logo no consignado, se vai adentrar nas outras associações que ainda não foram investigadas. Ficou acordado e o presidente concordou que os primeiros convocados serão do corpo técnico diretamente ligado às investigações. O corpo técnico da Polícia Federal, da CGU, Defensoria Pública e um advogado que fez denúncias.