O Brasil está correndo contra o relógio para evitar a entrada em vigor da nova tarifa de 50% dos Estados Unidos contra o país dentro de uma semana, mas as negociações de alto nível estão paralisadas e as empresas norte-americanas relutam em confrontar o presidente dos EUA, Donald Trump, sobre o assunto, disseram autoridades e líderes empresariais.
Trump vinculou as tarifas, que ele disse que entrariam em vigor em 1º de agosto, ao tratamento do Brasil ao ex-presidente Jair Bolsonaro, que está sendo julgado sob acusação de tramar um golpe para impedir que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumisse o cargo. Lula chamou a tarifa anunciada por Trump de “chantagem inaceitável”.
Nenhuma nova rodada de negociações diplomáticas ocorreu desde o mês passado, e uma contraproposta brasileira enviada em maio ficou sem resposta, disseram à Reuters dois diplomatas com conhecimento do assunto.
O vice-presidente e ministro da Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, disse a repórteres na quinta-feira que reiterou a disposição do país em negociar em uma conversa que teve no sábado com o secretário de Comércio dos EUA, Howard Lutnick.
A falta de comunicação deixa o Brasil com cada vez menos opções à medida que o prazo se aproxima.
“Se ele quisesse conversar, pegaria o telefone e me ligaria”, disse Lula sobre Trump em um evento na quinta-feira.
A Casa Branca não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.
As negociações estão sendo dificultadas pelas preocupações dos EUA com o processo de Bolsonaro, um aliado de Trump, disse um diplomata, chamando a questão de um grande obstáculo.
O anúncio de Trump sobre as tarifas para os produtos brasileiros, feito no início deste mês, veio apesar de um superávit comercial dos EUA com o país, colocando o Brasil a caminho de uma das taxas mais altas desse tipo no mundo, perto da tarifa de 55% da China.
Em uma série de 18 reuniões, Alckmin instou representantes de empresas norte-americanas, incluindo General Motors, John Deere e Alphabet , a pressionar Washington sobre a questão.
No entanto, as empresas relutam em confrontar Trump por medo de retaliação, de acordo com uma autoridade do governo brasileiro e Ricardo Alban, presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
“A situação está muito estressada”, disse Alban a repórteres na quinta-feira.
Um grupo de senadores democratas dos EUA condenou na quinta-feira as tarifas sobre o Brasil como um “claro abuso de poder” em uma carta a Trump.
As tarifas podem ter um impacto econômico severo. A CNI estima, com base em pesquisas, que mais de 100 mil empregos brasileiros poderiam ser perdidos, potencialmente reduzindo 0,2% do Produto Interno Bruto do país.
A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) projeta que o valor das exportações do setor para os EUA pode cair quase pela metade.
Alban disse que o golpe para os exportadores afetados pode ser pior do que a pandemia de Covid-19, acrescentando que os líderes empresariais estão pedindo ajuda ao governo, sugerindo novas linhas de crédito e outras medidas semelhantes às adotadas durante a pandemia.
Em resposta, algumas empresas já estão ajustando suas estratégias comerciais. A fabricante de motores Weg está considerando um plano para usar suas fábricas no México e na Índia para fornecer os EUA, disse seu diretor financeiro a analistas.
O frigorífico e exportador de carne Naturafrig Alimentos começou a redirecionar embarques para outros países, de acordo com o diretor comercial Fabrizzio Capuci.
Outras empresas estão recorrendo aos tribunais. A produtora de suco de laranja Johanna Foods, por exemplo, processou o governo Trump devido às tarifas propostas.
Empresas em setores que vão do aço aos produtos químicos também estão enfrentando cancelamentos de contratos de exportação, segundo um consultor que pediu para não ser identificado.
A Abiquim, associação que representa as empresas químicas, confirmou os cancelamentos devido à ameaça de tarifas, sem nomear as companhias afetadas. Um grupo que representa as siderúrgicas se recusou a comentar.
(Reportagem de Luciana Magalhaes, Lisandra Paraguassu, Bernardo Caram, Ana Mano e Manuela Andreoni; reportagem adicional de Gabriel Araújo, em São Paulo, e Nandita Bose, em Washington)