A recente disputa judicial entre Murilo Huff, o pai, e Ruth Moreira, a avó materna, do filho da cantora Marília Mendonça trouxe à tona um tema sensível e complexo no Direito de Família: quem deve ficar com a guarda de uma criança após a morte de um dos pais?
A legislação brasileira tem diretrizes claras sobre o assunto, mas a decisão final costuma envolver nuances emocionais, afetivas e práticas, além de sempre priorizar o melhor interesse da criança, opinam advogados ouvido pelo InfoMoney.
Segundo Lucas Menezes, sócio do escritório Pessoa & Pessoa, o Judiciário precisa definir dois pontos principais: a guarda da criança (quem toma as decisões do dia a dia, como escola e moradia) e a convivência familiar, que é um direito da criança, previsto na Constituição, e não se confunde com guarda. “A convivência envolve não apenas pais, mas também avós, tios, irmãos, e deve sempre ser observada pelo juiz de acordo com o melhor interesse do menor”, afirma Menezes.
A advogada Marina Dinamarco, especialista em Direito de Família e Sucessões, explica que, apesar de a regra geral dar preferência ao genitor vivo, isso pode ser revisto se outro parente comprovar maior proximidade e envolvimento com a criação da criança. “No caso da Marília Mendonça, há informações de que a avó materna cuidava diariamente do neto e dominava questões essenciais da rotina, como o controle do diabetes. Esse tipo de vínculo pode ser determinante para o juiz”, afirma Dinamarco.
Falta de um vínculo formal pesa na decisão?
Ambos os especialistas são unânimes: o fato de os pais não serem casados não influencia na definição da guarda. “O vínculo conjugal não é requisito para o exercício do poder familiar. Se o pai reconheceu a paternidade, tem os mesmos direitos e deveres”, explica Lucas Menezes.
O que realmente importa, segundo Marina, é o vínculo afetivo e a referência que a criança tem em sua rotina. “Provavelmente, para o filho da cantora, a avó materna era a figura de maior referência após a mãe. Isso é o que o Judiciário leva em consideração, e não o estado civil dos pais”, completa.
O pai tem preferência legal?
A resposta técnica é sim, mas com ressalvas. Segundo os especialistas, pela lei, a guarda deve ser exercida preferencialmente pelos genitores. No entanto, essa presunção pode ser afastada se houver evidências de que outro arranjo é mais benéfico para a criança.
“O pai é a indicação natural, desde que tenha condições emocionais, estruturais e afetivas. Mas, se houver provas de que a criança está mais segura e feliz com a avó, o juiz pode decidir pela guarda a ela”, aponta Menezes.
Como o Judiciário decide?
O critério central é o que for melhor para a criança, conforme a Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente. Para isso, os juízes costumam determinar estudos psicossociais para avaliar vínculos afetivos, estrutura familiar e ambiente de convivência.
Muitas vezes, a guarda é compartilhada entre pai e avó, especialmente quando ambos têm envolvimento e podem colaborar na criação, segundo Dinamarco. “Também é importante lembrar que a pessoa com a guarda pode ficar responsável por administrar o patrimônio que o menor herda e, por isso, o planejamento sucessório é fundamental em famílias não estruturadas formalmente.”
Por isso, a advogada destaca a importância de testamentos nesse tipo de situação, em que haja um patrimônio considerável. “É essencial que mães ou pais que não são casados pensem em deixar registrada sua vontade quanto à guarda e administração de bens, para evitar disputas futuras”, afirma a especialista em sucessões.