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Comando Vermelho pode estar usando a Resex Chico Mendes para lavar dinheiro

Foto: Leônidas Santana/Freepik, com acréscimo de bois de papel por inteligência artificial, para ilustrar a matéria

A Polícia Federal está investigando o uso de terras no Acre e no Amazonas como lavagem de dinheiro para uma das maiores facções criminosas do mundo: o Comando Vermelho. O registro seria inédito no Brasil, mas faria parte de um projeto de sofisticação dos métodos de dar aparência lícita ao dinheiro do narcotráfico.


De acordo com fontes ouvidas pelo ac24horas na Polícia Federal e no ICMBio, a investigação indica que parte dos produtores rurais e fazendeiros das regiões entre Boca do Acre e Lábrea, no Amazonas, e mais recentemente na Reserva Extrativista Chico Mendes, foram cooptados pelo crime organizado para ajudar a dar aparência lícita ao dinheiro da venda de drogas, assaltos a banco, e outros crimes graves, a partir da venda de gado fictício.


A venda de gado fictício, conhecida como “gado de papel” ou “boi de papel”, é uma técnica usada para lavagem de dinheiro, especialmente em regiões com forte vocação agropecuária. O esquema é complexo, exige falsificação de documentos e, por vezes, pagamento propina a agentes públicos, funcionando assim:


Criação de saldo fictício: O criminoso declara possuir um número de cabeças de gado maior do que realmente tem (ou inexistente) em sua propriedade, registrando esse saldo em sua Ficha Sanitária junto a órgãos de defesa agropecuária. Isso ocorre, por exemplo, durante a campanha de vacinação contra aftosa, quando o proprietário atualiza os dados.


Falsificação de documentos: Com o saldo fictício registrado, o agente obtém documentos como notas fiscais, Guias de Transporte Animal (GTA) e comprovantes de compra de vacinas. Esses documentos criam a aparência de transações legítimas, mesmo que o gado não exista ou exista apenas parcialmente.


Simulação de vendas: O criminoso simula a venda do gado fictício, gerando notas fiscais que justificam a entrada de dinheiro ilícito no sistema financeiro. O “lucro” da venda é declarado como renda legítima, “esquentando” o dinheiro sujo. Em alguns casos, o gado pode ser transferido para fazendas regulares ou misturado com rebanhos legais antes de ser vendido a frigoríficos, dificultando o rastreamento.


Subfaturamento ou superfaturamento: Outra variação é subfaturar custos ou superfaturar lucros nas transações reais, ou fictícias, criando espaço para inserir dinheiro ilícito como parte do “lucro” declarado.


A participação do Primeiro Comando da Capital (PCC), no esquema, não está descartada. Em maio de 2025, uma operação da Polícia Civil do Rio de Janeiro e de São Paulo desmantelou uma rede de lavagem de dinheiro fruto de uma aliança entre o CV e do PCC que girou R$ 6 bilhões em um ano. As operações criminosas no Acre no Amazonas podem ser fruto da mesma aliança.


Atuação do ICMBio

A atuação do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade em áreas do Acre e as adjacentes no Amazonas, como em Boca do Acre e Lábrea, foram gatilhos importantes para disparar a investigação, o que explica a hostilidade com que os agentes são tratados.


Segundo uma fonte, foi a partir das investigações sobre desmatamento e das verificações documentais relacionadas a crimes ambientais que notaram-se discrepâncias entre documentos e aquilo que era visto no campo. Documentos relatam números de cabeças de gado em locais onde os animais não eram vistos pelos agentes, o que embasou as investigações da PF. Como o órgão de mais forte atuação nessas regiões é o ICMBio, ficou claro para os contraventores a fonte da denúncia.


ac24horas teve acesso com exclusividade a um áudio onde pistoleiros são convocados para reagir contra o ICMBio:


“Estamos passando por um momento muito difícil, por causa desses amaldiçoados que estão vindo aí. Do jeito que estão se unindo pra vir acabar com nós [sic], convoco todos vocês que tem coragem, que seja homem, vamos enfrentar esses amaldiçoados. Se for preciso derrubar a ponte, vamos derrubar. Convoco você fazendeiro, pecuarista, dono de serraria, você que é pistoleiro e o caralho a quatro, quem tiver disposto pode ir no meu privado pra nós enfrentar esses cara [sic]. Já estamos fudido [sic], eles não tem dó de ninguém, se for preciso dar minha vida pode contar comigo. Vamos partir pra cima. Daqui pra eu morrer quero ver a Marina Silva sendo enterrada dentro de uma caixa de fósforo”, diz um homem, que não foi identificado.


Uma tentativa de atentado a agentes do ICMBio, registrado no último domingo (15), na Reserva Extrativista Chico Mendes, deixou claro o nível de perigo das operações de combate aos crimes identificados. Estradas foram bloqueadas com fogo; pontes destruídas e cercas cortadas. De acordo com o ICMBio, houve também uma tentativa de incêndio no acampamento utilizado por sua equipe de fiscalização. Três criminosos foram presos em flagrante.


Ameaça do Comando Vermelho

Na madrugada da última terça-feira (17), criminosos arrombaram um frigorífico, em Brasileia, no interior do Acre, onde gado apreendido de áreas embargadas estão sendo abatidos. Os animais foram soltos à esmo. Um dia depois, na quarta-feira (18), um homem que se identificou como integrante do Comando Vermelho fez ameaças de morte em nome da organização criminosa ao dono do frigorífico.


“Se tu matar o gado do cara e não devolver pro dono, a polícia não vai te proteger a vida toda não, bicho, tá ligado? Nós é mundo todo, pô [sic] . Nossa família é grande, nós é o Comando Vermelho [sic]. Só tô te falando, irmão. Pega a visão. Não deixem ninguém atirar mais nenhuma pistola na cabeça do gado do cara, irmão. Porque o cara tá morrendo e infartando nos hospitais por aí, porque o gado é dele, irmão. Ele trabalhou a vida toda pra construir, tá ligado? E o Estado foi lá, meteu a mão, levou pra vocês e vocês tão matando. Então nós vamos fazer igual com vocês, mano. Nós vamos entrar e nós vamos metralhar tudo, porra. Tá ligado?”, disse no áudio.


Já nesta quinta-feira (19), o mesmo homem que fez ameaças em nome do Comando Vermelho se retratou, e disse não representar a facção.


“Eu meti aí a organização do Comando Vermelho no meio. E ele não tem nada a ver, eu falei isso porque eu tava de cabeça quente, entendeu? O Comando Vermelho não tem nada a ver com isso. Quero deixar bem claro aqui que o Comando Vermelho não tem nada a ver com isso, entendeu? Eu usei isso com a cabeça quente, tudo certo? O problema é o Estado, que é o opressor”, afirmou.


O produtor rural José Augusto Pinheiro, um dos porta-vozes do movimento que protesta contra as ações do ICMBio, IBAMA e PF nas áreas embargadas, procurado pela reportagem, disse não ter ciência da participação de produtores rurais nos esquemas criminosos relatados nesta matéria.


A Superintendência da Polícia Federal no Acre foi procurada para falar sobre o assunto, mas não se manifestou até o fechamento desta matéria.


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