O projeto que criava, em caráter experimental, um plano de saúde simplificado, com apenas consultas eletivas e exames simples — mas sem cobertura para atendimentos de emergência, internação, cirurgias, tratamentos e terapias — foi suspenso temporariamente pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). A decisão foi anunciada nesta sexta-feira (23).
Considerado pelas operadoras como uma estratégia de ampliação do setor, o projeto preocupava especialistas e até servidores do órgão regulador.
O modelo estritamente ambulatorial — e mais barato — foi proposto pelo órgão em fevereiro deste ano. Em reunião hoje, a diretoria colegiada da ANS deliberou que o projeto ainda precisa de “aprofundamento técnico” , inclusive em temas relacionados aos direitos dos consumidores e questões de regulação do setor.
Para isso, deverá ser criada uma câmara técnica para “examinar criticamente os aspectos técnicos, jurídicos, econômicos e regulatórios” da proposta, criando um entendimento sobre o tema que deverá subsidiar a decisão final da diretoria da ANS sobre o projeto.
O órgão colegiado será composto por representantes da diretoria da agência, dos servidores e da Câmara de Saúde Suplementar (Camss), formada por entidades do setr, como hospitais, operadoras de planos e profissionais de saúde, além de empresas empregadoras e trabalhadores.
Decisão do STJ
A retomada do projeto de criação de um plano simplificado e popular também vai depender do Superior Tribunal de Justiça (STJ). No fim de 2023, o ministro Herman Benjamin definiu, em decisão monocrática, que cabe à ANS a fiscalização e regulamentação dos cartões de desconto e benefícios.
O crescimento desse serviço — geralmente oferecido por clínicas populares, onde o usuário paga uma mensalidade que garante descontos em consultas e exames laboratoriais — foi usado pela ANS como argumento para a criação de um plano simplificado.
“Propõe-se como medida cautelar a suspensão da tramitação do presente feito após a conclusão dos trabalhos da câmara técnica, e até que ocorra o trânsito em julgado da decisão a ser proferida para a segunda turma daquela corte superior. Tal encaminhamento visa preservar a integridade dos atos administrativos praticados, assegurar a harmonização entre as esferas administrativas e judicial e garantir que as decisões da agência se pautem com o propósito de legalidade, eficiência e responsabilidade institucional”, afirmou Alexandre Fioranelli, diretor de Normas e Habilitação dos Produtos (Dipro).
A suspensão temporária do projeto coincide com a saída da agência de Fioranelli, grande defensor do projeto. O mandato dele termina na próxima semana.
Expansão do setor
Para as operadoras, o novo tipo de contrato é uma oportunidade de expandir o setor e disputar o espaço ocupado por cartões de benefícios.
Mas o projeto preocupou outros especialistas e até servidores do órgão regulador. No fim de abril, o Ministério Público Federal (MPF) encaminhou uma nota técnica à ANS pedindo novos estudos e a reformulação da proposta, destacando que a agência não realizou estudos técnicos e que faltava participação de representantes do Ministério da Saúde nas discussões.
Além disso, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) levou o tema à Justiça numa ação civil pública em março, pedindo a suspensão da proposta, mas na semana passada a 19ª Vara Federal de São Paulo reconheceu a legalidade e conformidade jurídica da proposta. Ainda assim, a diretoria da ANS decidiu hoje pela suspensão da tramitação.