Conselho autoriza que farmacêutico prescreva remédios; entidades médicas reagem

‘Absolutamente ilegal’, diz CFM sobre resolução do Conselho Federal de Farmácia que permite prescrição de medicamentos por farmacêuticos — Foto: Adobe Stock

O Conselho Federal de Farmácia (CFF) publicou uma resolução que autoriza farmacêuticos a prescrever medicamentos, incluindo aqueles que exigem receita médica. A nova norma foi divulgada no Diário Oficial de segunda-feira (17) e passa a valer no mês que vem, 30 dias após a publicação.


A medida gerou reação de associações médicas (leia mais abaixo), que questionam a capacitação dos farmacêuticos para a função. Elas afirmam que o tema será alvo de processos judiciais. Os médicos alegam que a formação do farmacêutico não tem as disciplinas que existem no curso de medicina, como o exame clínico e a interpretação dos exames.


Entre outros pontos, a resolução CFF Nº 5 DE 20/02/2025 permite que o farmacêutico:


  • • prescreva medicamentos (incluindo os de venda sob prescrição);
  • • renove “prescrições previamente emitidas por outros profissionais de saúde legalmente habilitados”;
  • • faça exame físico de sinais e sintomas, realize, solicite e interprete exames para avaliação da efetividade do tratamento.

Em nota, o Conselho Federal de Farmácia (CFF):


  • • rebateu as críticas de entidades médicas, dizendo que a “prescrição terapêutica não é atividade privativa dos médicos”;
  • • afirmou que a prescrição de medicamentos está “vinculada” aos farmacêuticos com registro de especialista;
  • • que os farmacêuticos não podem prescrever medicamentos que possuam “notificação de receita, como os chamados de tarja preta”;
  • • que a decisão está embasada na lei que regula a profissão e nas diretrizes curriculares do curso de farmácia.

Antes, disputa judicial sobre prescrição

A nova resolução do CFF foi publicada poucos meses após uma decisão da 17ª Vara Federal Civil da Justiça no Distrito Federal contra outra norma do CFF sobre o mesmo tema.


A Justiça do DF declarou ilegal a resolução 586/2013 que permitia que farmacêuticos receitassem medicamentos e outros produtos que não exigiam prescrição médica. Cabe recurso da decisão.


A resolução é mais um capítulo na disputa por espaço no mercado de saúde no Brasil, como recentemente o g1 informou na questão dos procedimentos estéticos.


No país, quem regulamenta quem pode fazer o que na área estética são os conselhos federais de cada profissão. Também recentemente, entidades médicas acionaram a Justiça e conseguiram limitar a autonomia dos cirurgiões-dentistas no uso de anestésicos.


Resolução x lei da profissão do farmacêutico

A lei que regulamenta a profissão do farmacêutico não tem nenhuma referência direta à permissão para prescrever medicamentos. No caso da nova resolução, o CFF argumenta que ela foi emitida justamente para regulamentar dois pontos específicos da legislação de 2014 que aponta quais são as competências dos farmacêuticos.


A lei nº 13.021 de 8 de agosto de 2014 diz que esse profissional deve, entre outros pontos, “estabelecer o perfil farmacoterapêutico no acompanhamento do paciente, mediante elaboração, preenchimento e interpretação de fichas farmacoterapêuticas”.


Ao publicar a nova resolução, o CFF justifica no texto que buscava justamente “regulamentar o ato de estabelecer o perfil farmacoterapêutico”. Na visão do CFF, estabelecer o perfil farmacoterapêutico é todo o conjunto de ações que permitem ajudar o paciente com o tratamento, incluindo também a prescrição de medicamentos.


Reação das entidades médicas

O conselheiro do Conselho Federal de Medicina Francisco Eduardo Cardoso afirmou ao g1 que a resolução é “absolutamente ilegal“.


“Deveriam ter vergonha de publicar uma resolução como essa. Eles vão ter que responder na Justiça por editarem uma resolução ilegal e que coloca em risco a saúde da população”, diz Cardoso.


Na visão do representante dos médicos, o CFF não pode legislar sobre prescrição, diagnósticos e consulta médica.


“O farmacêutico não tem competência legal e técnica para isso. É um ato de prevaricação. Eles já tentaram isso no passado e a Justiça negou. E isso será levado novamente à Justiça. O argumento de que eles entendem de remédios é insuficiente. São competências complementares”, afirma Cardoso.


A Associação Paulista de Medicina (APM) fala em “silenciosa invasão de profissionais não habilitados no ato médico” e manifesta preocupação com medida do CFF.


Em nota, a APM afirma que a prescrição de medicamentos é fundamental para a segurança e eficácia dos tratamentos, pois envolve a orientação detalhada de um médico sobre quais medicamentos um paciente deve tomar, em que dose, com que frequência e por quanto tempo.


A APM destaca que o médico cursa a faculdade por seis anos e depois ainda faz de três a seis anos de residência para se formar e poder estabelecer o diagnóstico e a terapêutica com segurança.


“Esta segurança vem com a história clínica inicial seguida de um minucioso exame físico. Mesmo assim, muitas vezes é necessário a solicitação de exames complementares para que a prescrição possa ser feita após um diagnóstico adequado. O farmacêutico não tem esta formação e, portanto, não tem a competência exigida para prescrever qualquer medicamento. Pode sim e deve indicar substituto para determinada droga, alertar sobre eventuais efeitos colaterais e interações medicamentosas”, informa a associação.


O que diz a resolução do Conselho Federal de Farmácia

O artigo 3° da resolução número 5 do CFF de 20/02/2025 determina que, para estabelecer o perfil farmacoterapêutico do paciente, o farmacêutico está autorizado a:


  • • prescrever medicamentos, incluindo os de venda sob prescrição;
  • • renovar prescrições previamente emitidas por outros profissionais de saúde legalmente habilitados;
  • • prescrever medicamentos em atendimento à pessoa sob risco de morte iminente.
  • • Os medicamentos categorizados sob prescrição somente poderão ser prescritos pelo farmacêutico que possua Registro de Qualificação de Especialista (RQE) em Farmácia Clínica.

O artigo 4º da resolução informa ainda que “no âmbito da atividade clínica do farmacêutico” a análise da situação do paciente vai permitir que o profissional:


  • • Colete dados por meio da anamnese farmacêutica
  • • Faça exame físico com a verificação dos sinais e sintomas
  • • Realize, solicite e interprete exames para avaliação da efetividade do tratamento

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