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Ansiedade e depressão fazem o Brasil bater recorde de afastamento por saúde mental

© Marcelo Camargo/Agência Brasil

Nos últimos dez anos, o Brasil registrou um aumento expressivo nos afastamentos de trabalho por transtornos como ansiedade e depressão.


Somente em 2024, foram mais de 472 mil licenças médicas concedidas, um crescimento de 68% em relação ao ano anterior, segundo dados do Ministério da Previdência Social, obtidos pelo G1.


Diante dessa crise sem precedentes, a atualização da Norma Regulamentadora nº1 (NR-1), que entra em vigor a partir de 26 de maio, impõe novas exigências para que empresas criem planos de saúde mental no ambiente corporativo.


“Esses dados revelam uma crise alarmante de saúde mental entre os trabalhadores brasileiros, com um impacto direto na produtividade, no bem-estar e na sustentabilidade das empresas”, disse Leonardo Loureiro, especialista em educação empresarial e gestão emocional.


O mapeamento de riscos psicossociais com a NR-1

A nova regulamentação exige que todas as empresas que possuem funcionários regidos pela CLT identifiquem e gerenciem riscos psicossociais, como estresse excessivo, assédio moral e sobrecarga de trabalho.


Caso esses fatores sejam identificados, medidas de controle devem ser incorporadas ao Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), sob risco de penalizações.


Marinildes Queiroz, Head de Pessoas e Cultura Organizacional da Up Brasil, empresa multinacional de benefícios corporativos, afirma que a atualização da NR-1 reforça que a saúde mental é uma parte essencial da segurança e da qualidade de vida no trabalho.


“A norma estabelece diretrizes mais claras para que as empresas mapeiem esses riscos e implementem medidas preventivas, tornando a saúde mental uma responsabilidade formal dos empregadores”, disse.


A especialista pondera que o aumento dos afastamentos por transtornos psicológicos reflete a necessidade de mudanças urgentes na forma como as empresas cuidam de seus colaboradores.


Em relação às empresas, Loureiro destaca que os números do Ministério da Previdência Social evidenciam a necessidade urgente de políticas eficazes de cuidado com a saúde mental.


“O afastamento em massa de trabalhadores não só traz prejuízos financeiros, como também afeta a cultura organizacional e a retenção de talentos”, afirma.


Como as empresas devem agir?

A adaptação à NR-1 exige que as empresas adotem um plano estruturado de saúde mental. Os especialistas concordam que o primeiro passo é identificar os riscos por meio de pesquisas, escuta ativa dos colaboradores e análise de indicadores como afastamentos por questões psicológicas.


“Com o aumento do burnout, é importante cada empresa e seus líderes estarem antenados no bem-estar de cada colaborador”, disse Loureiro. Ele acredita que os líderes precisam observar quedas em produtividade, mudança de comportamento e como é feita a entrega de resultados a partir de então.


“Pequenas concessões podem ajudar muito a cada colaborador a ter mais saúde mental e se sentir bem no ambiente de trabalho.”


A partir da atualização da norma, auditores fiscais do trabalho conseguem se guiar de forma mais objetiva para fiscalizar como o ambiente corporativo impacta na saúde mental dos colaboradores.


“Isso significa que as empresas precisarão comprovar que realizam ações preventivas e corretivas para mitigar riscos psicossociais. A fiscalização tende a ser mais rigorosa, com exigência de registros e acompanhamento contínuo”, afirma Marinildes.


Algumas medidas recomendadas para entrar nos planos da companhias são:


Loureiro complementa que o papel da liderança é essencial para o sucesso dessas estratégias. “Os gestores precisam estar conectados com seus times. Um líder bem treinado consegue identificar sinais de esgotamento e agir antes que o problema se agrave”, pontua.


Impacto financeiro e organizacional da crise de saúde mental

Empresas que negligenciam essas novas exigências podem sofrer com multas, processos trabalhistas e danos reputacionais, de acordo com os especialistas.


Além disso, o afastamento em massa de funcionários por transtornos psicológicos afeta diretamente a produtividade e a retenção de talentos.


“O excesso de carga, a pressão por resultados e a dificuldade de equilibrar vida pessoal e profissional contribuem para esse cenário”, afirma Loureiro.


“O cérebro humano trabalha melhor quando está em um ambiente saudável. Se a empresa ignora isso, ela compromete não só a saúde do colaborador, mas também sua própria sustentabilidade no mercado.”


Marinildes reforça a importância de um ambiente organizacional positivo, já que um clima tóxico tende a colaborar para o aumento de afastamentos, além da alta rotatividade e desmotivação.


“No longo prazo, isso compromete a imagem da empresa e dificulta a atração de talentos. Hoje, profissionais buscam organizações que valorizam o bem-estar, e quem não se adaptar ficará para trás”, destaca.


A importância da liderança na prevenção de riscos psicossociais

Os líderes desempenham um papel fundamental na prevenção de problemas de saúde mental nas equipes.


“Um líder conectado entende os sinais de alerta em seus colaboradores e consegue calibrar a pressão do trabalho para garantir entregas sem comprometer a saúde do time”, explica Loureiro.


Marinildes complementa que as empresas devem investir na capacitação de seus gestores. “Os líderes precisam ser treinados para reconhecer sinais de esgotamento e atuar preventivamente”, disse.


Alguns aspectos importantes para evitar o esgotamento são treinamentos sobre saúde mental, comunicação empática e gestão de conflitos, para que um ambiente mais saudável consiga predominar nas empresas.


Ela cita um exemplo prático aplicado na Up Brasil: “Aqui realizamos o ‘Café com Prosa’, onde qualquer colaborador pode fazer perguntas sobre o que quiser para a alta liderança e é respondido diante de todos, em um ambiente transparente e respeitoso. Esse tipo de iniciativa fortalece a confiança e reduz o estresse organizacional”, explica.


Direito do trabalhador e a fiscalização

Além das ações preventivas, a NR-1 estabelece que os trabalhadores têm o direito de recusar atividades que representem risco grave e iminente à sua saúde mental, sem sofrer punições.


“A Norma Regulamentadora nº1 veda ao empregador criar qualquer forma de constrangimento e/ou penalizar os trabalhadores que se valham desse direito, bem como o proíbe de exigir o retorno do trabalhador àquelas atividades enquanto não forem adotadas as medidas para neutralização do risco”, acrescenta o advogado Ramiro Borges Fortes, sócio da área Trabalhista do Villemor Amaral Advogados.


A fiscalização também será mais rigorosa, com auditores do trabalho exigindo registros das ações preventivas e corretivas adotadas pelas empresas.


Para Loureiro, as empresas que enxergam o bem-estar dos colaboradores como estratégia de crescimento saem na frente. Ele exemplifica o incentivo na prática esportiva, assistência psicológica e um bom clima organizacional.


“Essa visão permite que os colaboradores entreguem o melhor trabalho sem comprometer sua saúde mental”, ressalta.


Cuidar do time é cuidar do negócio

Marinildes e Loureiro concordam que o sucesso de uma empresa está diretamente ligado à forma como ela trata seus funcionários.


O especialista em educação empresarial acredita na seguinte dinâmica:


“Então, a ordem dos fatores altera o produto. Primeiro eu cuido bem do meu time, para o meu time cuidar bem dos meus clientes, e os meus clientes cuidam da minha reputação”


Com a entrada em vigor da nova norma, cuidar da saúde mental dos colaboradores para de ser uma opção para se tornar uma estratégia para garantir um ambiente de trabalho sustentável e produtivo.


“As organizações que realmente entenderem a importância desse tema sairão na frente. O bem-estar dos colaboradores não é um custo, mas um investimento no sucesso do negócio”, disse Marinildes.


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