A professora de inglês Thaynara Dueck, moradora de Curitiba, relatou uma experiência com a antiga casa alugada que morava junto com o marido. Após quase um ano vivendo no imóvel, ao ouvir passos em um quarto que a dona mantinha trancado, descobriu que a proprietária tinha acesso ao cômodo por uma “passagem secreta”.
O advogado e diretor de Legislação do Inquilinato do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação ou Administração de Imóveis de São Paulo (Secovi-SP), Jaques Bushatsky, frisa que não há ilegalidade no fato de o proprietário alugar o imóvel com algum cômodo fechado para os locatários. “Mas isso precisaria estar bem claro no contrato”, frisa.
Partindo do mesmo ponto de vista, Marcos Poliszezuk, sócio fundador do Poliszezuk Advogados, reforça que não há problemas, caso o proprietário deseje resguardar alguma área do imóvel. “É comum, em contratos por temporada, o locador deixar não apenas cômodos reservados para sua utilização como também móveis trançados, com pertences exclusivos para seu uso. Mas tudo deve constar no contrato de locação”, explica.
No caso de Dueck, ela conta que, ao alugar o sobrado em outubro do ano passado, a imobiliária avisou que um quarto não poderia ser acessado pelos locatários, pois nele havia bens pessoais da proprietária do imóvel. “Como ela estava em outro país, nos avisaram que dos três quartos disponíveis, nós teríamos acesso a dois”, conta. A questão não agradou a professora, mas no contrato de locação dizia que o cômodo poderia ser acessado a partir de fevereiro. Pensando que seria uma situação provisória, o casal aceitou as condições.
Somente quando já estavam morando no sobrado é que foram descobrir que, na verdade, a proprietária do imóvel havia se mudado para uma casa ao lado. Os bens pessoais que estavam no cômodo trancado, na verdade, eram da filha dela que havia se mudado para o exterior. “Quando passou fevereiro, que no contrato estaria ‘liberado’ para entrarmos naquele quarto, a imobiliária parou de nos responder.”
Após muitas insistências, o casal conseguiu falar com a imobiliária, que retornou, afirmando que a proprietária iria continuar precisando do quarto até julho, por questões de saúde. “Nos compadecemos e aceitamos”, conta. Mas poucos dias depois de terem concordado em manter o quarto trancado, as coisas mudaram. O marido de Dueck, que trabalhava de casa, ouviu passos e barulhos de gavetas abrindo e fechando vindos do cômodo trancado.
Proprietário pode acessar cômodo fechado de casa que foi alugada?
Para muitos, a primeira reação ao ouvir que alguma pessoa desconhecida está dentro de casa seria de fugir. Só que o marido da professora de inglês preferiu bater na porta e perguntar quem estava lá dentro. “O que foi?”, teria respondido a proprietária do imóvel, sem perceber que a batida vinha da casa alugada. Segundo Dueck, a idosa teria de alguma maneira voltado para a casa dela e ido atender outra porta. “Foi então que meu marido descobriu que havia uma ‘passagem secreta’ para a nossa.”
@teachertie
To pra contar essa história já tem uns meses 😂 #storytime
Perguntado se um proprietário pode acessar a casa que ele alugou por meio de um cômodo fechado, o diretor Secovi-SP é enfático: “não pode!”. Ele lembra que, na locação, a posse do imóvel é entregue ao locatário por completo. “Só entra quem ele quiser”, afirma Bushatsky. Indo além, Bruno Boris e Yuri Fernandes Lima, sócios do escritório Bruno Boris Advogados, destacam que esse caso pode ser caracterizado como crime de violação de domicílio pelo artigo 150 do Código Penal. “Essa violação só é permitida, por lei, quando algum crime está sendo ali praticado ou na iminência de o ser”, ressaltam.
Já Thiago Bernardo da Silva, sócio do escritório BCMS Advogados, aponta que o acesso de terceiros ao imóvel, sem o conhecimento e a autorização dos locatários, é um ato ilegal. “Possibilitando tanto a rescisão do contrato quanto a adoção das medidas criminais cabíveis em razão da invasão de domicílio”, diz. Ainda assim, o diretor adjunto de locação da Associação Brasileira das Administradoras de Imóveis (ABADI), Marco Freitas, alerta ser necessário analisar o caso com cuidado. “Não parece haver ilegalidade, uma vez que a vizinha tinha acesso somente ao cômodo e não à parte locada do imóvel. A aplicação de penalidades poderia se dar em razão do descumprimento do prazo de disponibilização do espaço”, aponta.
Em outro vídeo, contando a resolução do caso, Duck revela que se mudou do sobrado alugado — sem detalhar como se deu a quebra de contrato —, e diz acreditar que a proprietária acessava o cômodo somente quando os locatários estavam fora. Além disso, apenas o quarto era acessado pela idosa, já depois descobriram que havia um guarda-roupa encostado atrás da porta. “Mas ela usava a luz desse quarto, que era na minha casa. Quem pagava era eu”, se queixa no final da postagem.