A seca dos rios no Estado do Acre gera temor pela falta de alimentos, isolamento de comunidades e cenas inusitadas em várias partes.
Em Marechal Thaumaturgo, a lâmina d’água é mínima e as crianças já atravessam o Rio Juruá de bicicleta. No município, há dificuldade de abastecimento de alimentos e combustíveis. Sem água para navegação de barcos maiores, alimentos e combustíveis são levados em pequenas canoas, em dias de viagem entre Cruzeiro do Sul e o Alto Juruá.
Cleber Pedrosa, proprietário do único posto de combustível da cidade, disse que com a baixa do Rio Juruá, que sofre seca histórica, transporte do combustível até Marechal Thaumaturgo está quase impossível. “A verdade é que não tem mais combustível na cidade. Estamos trazendo de canoa, de dois mil litros em dois mil litros. Passam seis dias com dois mil litros dentro de uma canoa pra chegar aqui”, desabafou Pedrosa.
No alto Rio Jordão, em vários trechos do manancial, é preciso levar a canoa nas costas para seguir viagem. Em fotografias e imagens, é possível ver três homens carregando uma canoa nas costas para não ficar pelo caminho. Eles precisaram percorrer a pé um trecho até encontrar um ponto onde ainda há água suficiente para navegar.
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Indígenas afetados e isolados
Nas terras indígenas do Acre, a situação é preocupante e mais de 10 mil indígenas estão isolados. O coordenador do Distrito Sanitário Especial Indígena do Alto Rio Juruá (Dsei), Isaac Piyãko, alertou as autoridades sobre o problema. O Dsei é responsável por levar ações de saúde para as terras indígenas, o que já não é mais possível fazer pelos rios.
“Nós estamos vivenciando aqui um dos maiores problemas da nossa história, é de vida seca prolongada na nossa região. Nós estamos já sem acesso, metade da nossa população, que são 20 mil habitantes. A nossa equipe não está conseguindo chegar aos territórios. Os nossos barcos que transportam até os territórios, também estamos em processo de atualização desses transportes. Estamos vivenciando um problema seríssimo, o maior dele é de vida seca e pedimos aí às nossas autoridades parceiras, que possamos imediatamente se unir e se prevenir para que a gente não sofra uma situação pior. Sabemos que as nossas situações de doenças respiratórias, as diarreias e as viroses aqui nessa região também poderão, junto a seca, se agravar ainda mais a situação da saúde da nossa população. Pedimos a responsabilidade de todos os parceiros para que a gente imediatamente possa fazer um plano estratégico para que a gente possa atender a nossa população”, alerta.
Na Terra indígena Kuntanawa, no Rio Tejo, um dos afluentes do Juruá, em Marechal Thaumaturgo, a fome já está próxima, de acordo com o líder Haru. Devido ao baixo nível da água do manancial, há escassez de peixes, de animais para caça por causa das queimadas e as plantações estão secando.
“As plantações estão morrendo já, mesmo a gente regando. Os peixes já praticamente não tem mais. A gente vai pescar e não pega nada porque o rio está todo verde de lodo, a água praticamente tá inútil, sem condição de utilizar. Tudo isso é em decorrência das queimadas e desmatamento”, relata.