Montaserbelah Hamdi Hamdan Alshawwa, de 34 anos, ou simplesmente Montaser, como é conhecido no Acre, tem contado os anos, os meses e os dias desde que aqui chegou, fugindo da guerra na sua terra natal. São 8 anos, 9 meses e 14 dias completados nessa quarta-feira, 29, que marca o Dia de Solidariedade ao Povo Palestino, uma data criada pela Organização das Nações Unidas, em 1977.
Gerente de um restaurante em Rio Branco, Montaser aproveitou o simbolismo do dia para ir à Assembleia Legislativa do Acre (Aleac), onde obteve o tempo de cinco minutos para se manifestar a respeito da sua angústia com a situação dos familiares na Faixa de Gaza, apesar de não ter tido a atenção que desejava. “Havia muita gente, mas quando eu subi, desceram”, reclamou.
O palestino disse que apesar da pouca atenção recebida dos presentes, conseguiu deixar a sua mensagem e registrou que a atual presidência da casa parlamentar tem lhe prestado muita ajuda na tentativa de conseguir, junto ao Itamaraty, trazer seus pais para perto dele, inclusive com o envio de um documento de caráter oficial à diplomacia brasileira.
Em cerca de 10 minutos de conversa por telefone, o palestino relatou ao ac24horas um pouco do horror que tem chegado até ele, vivido por familiares, muitos dos quais já tiveram as vidas ceifadas pela guerra.
Até a última atualização que teve, já eram 48 parentes mortos, além de um irmão desaparecido, ainda no começo do conflito. “São tios, tias e primos, que estão no centro dos bombardeios. Está tudo destruído lá e não tivemos mais notícias de meu irmão. Ele tem família, mulher e quatro filhos, que estão bem, mas de meu irmão ninguém tem notícias”, contou.
Nesse momento, Montaser luta para que o Itamaraty consiga inserir os nomes dos familiares mais próximos na lista para deixar a região rumo ao Brasil – o pai, a mãe, a cunhada e um sobrinho de quatro anos. “Meu pai tem 64 anos e minha mãe 63. São idosos e estão com problemas de saúde. Eles estão cansados, pois a situação está muito complicada. Eu falei com eles hoje, depois de 18 dias sem conseguir nenhum contato”, explicou.
Montaser também disse que a ajuda humanitária que tem entrado em Gaza não tem chegado efetivamente até a área em que seus pais estão. Segundo ele, ainda ocorre que pessoas recebem os donativos e vendem para comprar outras coisas. “O que tem mais chegado lá para eles é água e tecidos que são usados para quando alguém morre”, esclarece.
Perguntado diretamente sobre o conflito entre judeus e palestinos, ele disse pensar que, talvez, a dimensão tomada pelo atual conflito ajude a resolver a Questão da Palestina. “Que dessa vez seja diferente e mude alguma coisa. Mesmo com todas as perdas, mas que resulte em uma posição do mundo para com a Palestina”, pontuou.
Sobre o Hamas, Montaser diz que eles são representantes legítimos do povo palestino.
“Não tem como a gente negar eles, não tem como a gente expulsar eles. Às vezes, a gente não aceita algumas posições que tomavam, coisas que eles faziam, mas temos respeito. Eles não são apenas um grupo armado, são muito mais do que isso”, acrescenta.
Questionado se é concebível a convivência pacífica entre os povos, lado a lado em dois estados consolidados e mutuamente reconhecidos, ele pondera que é difícil, mas abre expectativa para essa possibilidade. “Ninguém deveria aceitar que colocassem alguém para morar na sua casa, que é sua, mas precisamos, infelizmente. O povo da Palestina precisa de paz. Tem que haver um acordo para isso”, conclui.
Nos oito anos em que está no Acre, Montaser dominou a língua portuguesa ao ponto de não ter, sequer, um sotaque pesado. Questionado sobre a sua facilidade com o idioma, ele disse que aprendeu “na tora”, demonstrando que já tem o “acreanês” na veia. O palestino é casado aqui no estado e tem uma filha acreana de cinco anos de idade.