TSE suspende julgamento com dois votos pela condenação de Jair Bolsonaro

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem dois votos para condenar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seu então candidato a vice, Braga Netto, pelas condutas durante as cerimônias do Bicentenário da Independência, em 7 de setembro de 2022.


Até o momento, o relator, Benedito Gonçalves, votou para declarar só Bolsonaro inelegível, livrando Braga Netto dessa consequência. O ministro Floriano de Azevedo entendeu que tanto Bolsonaro como Braga Netto devem ficar inelegíveis.


O ministro Raul Araujo divergiu, e defendeu a rejeição das ações.


Benedito e Floriano também concordaram em punir com multa de R$ 425.640 a Bolsonaro e de R$ 212.820 a Braga Netto.


A Corte vai continuar o julgamento na terça-feira (31). Ainda faltam votar André Ramos Tavares, Cármen Lúcia, Nunes Marques e Alexandre de Moraes.


Bolsonaro já está inelegível até 2030 por uma condenação anterior do TSE. Uma eventual nova punição não aumenta o prazo que ele ficará de fora das eleições.


Voto do relator

Para o relator, ficou comprovado abuso de poder político e econômico e prática de conduta vedada pela lei eleitoral.


“Comprovou-se indevida mescla entre atos oficiais e eleitorais, em Brasília e no Rio de Janeiro”, disse o ministro. “Para que o comício, na prática, se tornasse um movimento contínuo em relação ao ato oficial”.


Conforme o relator, houve “apropriação de bens simbólicos” no caso, o que envolve “desde uso eleitoral de imagens em propaganda eleitoral até o incalculável dano decorrente da captura da data cívica como fator de acirramento da polarização eleitoral”.


Para Benedito Gonçalves, ficou comprovada a associação das comemorações dos 200 anos da Independência com a campanha de Bolsonaro e Braga Netto. Isso foi feito em reuniões partidárias e propagandas eleitorais na televisão, em que apoiadores foram chamados a participar do evento.


“O que se viu nas manifestações feitas, na propaganda eleitoral de 6 de setembro, foi a inequívoca difusão de mensagem associando a comemoração do bicentenário e todo seu simbolismo a campanha dos investigados”, afirmou.


“Houve nítida referência aos atos oficiais com destaque para participação das Forças Armadas”, declarou.


“Essa ação foi direcionada a induzir a confusão entre atos oficiais e atos eleitorais. Esse direcionamento se fez explorando mote de campanha situando a festividade na narrativa mais ampla de luta pela liberdade e triunfo de um patriotismo militarizado”.


Conforme o relator, a responsabilidade de Braga Netto pelo caso é menor, por isso ele não propôs sua condenação à inelegibilidade. O ministro entendeu que o então candidato a vice tinha o dever de verificar a regularidade das propagandas veiculadas pela campanha.


“Não se tem dúvida que o primeiro investigado [Bolsonaro], além de então presidente da República e “comandante supremo das Forças Armadas”, exercia o papel de liderança carismática da chapa. Porém, o segundo investigado [Braga Netto] também era responsável pela regularidade do material de propaganda exibida nas inserções eleitorais, não sendo possível considerar que tudo se passasses sem sua plena conivência com associação da chapa e a comemorarão do bicentenário”.


O ministro também afirmou que a mudança do local do desfile cívico-militar no Rio de Janeiro foi determinada para atender uma convocação prévia de Bolsonaro a seus apoiadores.


O evento tradicionalmente era feito na avenida Presidente Vargas, no centro da cidade, mas foi transferido para a orla de Copacabana. No local, havia uma manifestação convocada pró-Bolsonaro.


“A mudança era repleta de significado. Farta documentação demonstra a adoção de muitas providencias por órgãos públicos par atender determinação de última hora. A tradição do local do desfile que se firmou em razão da proximidade coma sede do Comando Militar foi solapada por determinação casuística destinada a atender convocação do primeiro investigado”, disse Benedito.


“Houve no caso apropriação de bens simbólicos, isso envolve desde uso eleitoral de imagens em propaganda eleitoral até o incalculável dano decorrente da captura da data cívica como fator de acirramento da polarização eleitoral”.


O ministro Floriano entendeu que Braga Netto, enquanto candidato a vice e um dos coordenadores da campanha, também tinha responsabilidade. Para o magistrado, a sua omissão contribuiu para os abusos e, por isso, ele também deve ser condenado à inelegibilidade.


Acusação

Bolsonaro e Braga Netto são acusados de abuso de poder político e econômico e uso indevido dos meios de comunicação por supostamente terem beneficiado suas candidaturas com a participação nos eventos oficiais do bicentenário da Independência. As solenidades foram feitas em Brasília e no Rio de Janeiro, custeados com dinheiro público e transmitidas pela TV Brasil.


Nos eventos, Bolsonaro participou de atos de campanha que haviam sido montados de forma próxima e paralela aos eventos oficiais.


As ações foram movidas pelo PDT e pela senadora e então candidata a presidente Soraya Thronicke (Podemos), que argumentaram ter havido desvirtuamento na finalidade dos eventos do 7 de Setembro e uso do aparato do evento oficial para beneficiar ato de campanha.


Julgamento

O julgamento começou na terça-feira (24), quando se manifestaram os advogados de defesa e de acusação, e o Ministério Púbico Eleitoral (MPE).


A defesa de Bolsonaro e Braga Netto disse, na terça-feira (24), que não existiu “qualquer aproveitamento intencional ou não da estrutura do 7 de Setembro para fins eleitorais”.


O advogado Tarcísio Vieira de Carvalho afirmou que, na ocasião, houve “uma cisão factual entre momentos diversos”, em que em um momento Bolsonaro era presidente e, em outro, era candidato.


“Atos não se confundem. Ocorreram, é fato notório, os desfiles esperados para comemoração dessa data revestida de simbolismo. E é evidente que houve para esse evento o fornecimento de estrutura de arquibancadas, banheiros públicos”, declarou, dizendo que os gastos com a solenidade oficial não têm irregularidades.


Ele também descartou ter havido “ingerência” de Bolsonaro na mudança do local dos desfiles no Rio de Janeiro, que coincidiu com o lugar onde havia um ato de campanha a seu favor.


Tarcísio também destacou que a campanha adotou uma “medida saneadora ampla e imediata” para apagar das redes sociais as imagens relativas aos eventos de 7 de Setembro.


“Essa opção pela remoção, mesmo das não relativas à fase pública, impediu que qualquer efeito nefasto irradiasse pela propaganda eleitoral, contaminando a cena política. Ela impediu que a força política expressa nesses supostos atos políticos do dia 7 de Setembro fosse contaminada aos demais eleitores”, declarou.


Consequências

Em caso de condenação, Bolsonaro não seria impactado diretamente. O ex-presidente já está inelegível por um outro processo, também movido pelo PDT, por uma reunião com embaixadores em que fez ataques ao sistema eleitoral. Este foi o primeiro julgamento do tipo enfrentado pela chapa Bolsonaro-Braga Netto.


Por outro lado, uma eventual segunda punição ao ex-presidente seria um obstáculo a mais na tentativa de reverter a inelegibilidade por meio de recursos.


A defesa de Bolsonaro já acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) contra a primeira condenação. Teria que preparar uma segunda investida de recursos, que não suspendem os efeitos da inelegibilidade durante sua tramitação.


A condenação poderia afetar diretamente Braga Netto, que está elegível. Para isso, é preciso que os ministros entendam que ele participou ativamente nas condutas que levaram ao abuso.


Bolsonaro e Braga Netto já foram julgados no TSE por um outro caso além do envolvendo embaixadores. Na ocasião, a Corte eleitoral rejeitou três ações contra a dupla pelo uso dos palácios da Alvorada e do Planalto para fazer transmissões ao vivo pela internet e reuniões com governadores e cantores sertanejos.


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