As mudanças provocadas pelo Novo Ensino Médio continuarão valendo nas salas de aula mesmo se o Ministério da Educação (MEC) decidir suspender o cronograma de implementação da medida.
Na prática, para entender o impacto para os estudantes, é preciso saber que:
O Novo Ensino Médio foi instituído por meio de uma lei federal específica; os principais eixos da reforma só podem ser mudados com uma nova legislação aprovada pelo Congresso.
O que está em discussão neste momento no MEC é suspender o cronograma da reforma, e não a reforma em si, que já está em seu segundo ano de implementação.
Ou seja, no dia a dia das escolas, nada mudaria: os alunos permaneceriam com a nova grade horária, nova divisão de disciplinas e a possibilidade de receberem formação técnica-profissional.
O tal cronograma – que pode vir a ser alterado pelo MEC – estabelece prazos para mudanças em avaliações, como o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Se esse calendário for suspenso, as provas não seriam mais modificadas em 2024, como previsto inicialmente.
Segundo os críticos, os principais afetados seriam os alunos da rede pública: especialistas apontam que as redes estaduais passaram a oferecer disciplinas alternativas e dar menos peso às tradicionais, enquanto as privadas têm mais estrutura para ofertar os dois tipos de conteúdo.
1 – O que muda na sala de aula se o cronograma for suspenso?
Por enquanto, nada. As escolas continuarão tendo que seguir as diretrizes do Novo Ensino Médio. Ou seja, as aulas permanecerão no modelo novo, com itinerários formativos e projeto de vida.
2 – Mas por que não muda?
Não muda nada na sala de aula porque o MEC avalia, neste momento, apenas suspender uma portaria que trata do calendário de implantação do Novo Ensino Médio – e não revogar a reforma toda ou modificá-la.
Esse cronograma consta de uma portaria do próprio MEC e, portanto, bastaria, em tese, uma nova portaria para suspender os seus efeitos.
Já a reforma do Novo Ensino Médio foi uma lei aprovada pelo Congresso Nacional e uma mudança nela – ou a sua revogação – só seria possível com a aprovação de um novo texto pelos deputados e senadores.
Além disso, depois de uma eventual mudança na legislação nacional, os estados ainda precisariam validar seus currículos localmente.
3 – E por que a suspensão do calendário já teria impacto no Enem do ano que vem?
Porque o Enem 2024 não precisaria mais seguir as diretrizes do Novo Ensino Médio (com partes específicas no exame conforme a escolha do estudante). Ou seja, continuaria no formato atual (uma prova igual para todo mundo, cobrando todas as disciplinas).
Isso aconteceria porque essa portaria que pode ser suspensa estabelece prazos para que políticas nacionais e avaliações, como o Enem, sejam modificadas pela reforma educacional. Se o calendário deixar de valer, cai a obrigatoriedade de o Enem mudar no ano que vem.
4 – Como ficaria a preparação dos alunos, que estudam no Novo Ensino Médio, mas farão Enem ano que vem no formato tradicional?
Esse parece ser o principal desafio no momento.
A turma de estudantes que fará o Enem no ano que vem será a primeira que, em princípio, terá feito os três anos do ensino médio seguindo as novas diretrizes. Se o Enem for no formato tradicional, os alunos poderão ser cobrados por conteúdos que não necessariamente tiveram na escola.
E daí deriva outro problema, que é ampliação da desigualdade entre as redes pública e privada.
As escolas particulares terão condições de correr atrás do prejuízo e, por exemplo, reforçar o conteúdo de disciplinas convencionais para garantir um bom desempenho de seus alunos no Enem.
Já as escolas estaduais teriam dificuldades em oferecer as mesmas condições. Então, os seus alunos iriam para o Enem com brechas no conteúdo.
5 – Quando será decidido se os prazos mudarão?
Não há data definida, mas o ministro da Educação, Camilo Santana, já disse publicamente que avalia suspender o calendário de implantação do Novo Ensino Médio. Como, em princípio, bastaria uma nova portaria para suspender a portaria atual, ele pode fazer isso a qualquer momento.
6 – Quando saberemos se o Novo Ensino Médio será ajustado ou revogado?
Provavelmente, ao final dos trabalhos de um grupo de trabalho criado pelo MEC com entidades do setor para discutir o assunto.
Iniciada em março, essa consulta pública terá, em princípio, 90 dias de duração. Ao final, deverá ser apresentado um relatório com medidas para decidir o futuro da política.
7 – O que diz o MEC?
O MEC já havia se manifestado dizendo que a questão “transcende a simples revogação”, mas reconhecia a necessidade de “corrigir distorções”.
“Essa comissão segue rodadas de discussão com especialistas na área. Vamos fazer uma pesquisa. A partir de tudo isso, vamos avaliar as correções que devem ser feitas no Ensino Médio”, disse ao g1 nesta segunda.
8 – O que pensam as entidades?
Consed: O Conselho Nacional de Secretários de Educação, que representa as redes estaduais de ensino, diz que é preciso “valorizar o caminho percorrido até aqui”, mas sem abrir mão “de fazer ajustes”. Para a entidade, a revogação seria “jogar fora o esforço empreendido e nos lançar num cenário de absoluta incerteza”.
UNE: A União Nacional dos Estudantes se mostra a favor da suspensão da implementação do Novo Ensino Médio. Para a entidade, isso representa uma “grande vitória para os estudantes, professores e, sobretudo para a sociedade, que correria o risco de ampliar abismos educacionais e impactar na democratização do acesso ao ensino superior, que acompanhamos recentemente no país”.
Campanha Nacional pelo Direito à Educação: Para o professor Daniel Cara, dirigente da entidade, a reforma “é um caos”. “Ela foi feita por pessoas que desconhecem a realidade das redes públicas e ela vai impor aos estudantes uma gravíssima situação em que as liberdades fundamentais, como, por exemplo, o direito de escolha [itinerários formativos] e a liberdade de escolha da carreira (a liberdade educacional), estão sendo impedidas por essa reforma. Então, é de fato uma situação calamitosa que precisa ser urgentemente revista.”
Todos Pela Educação: O diretor-executivo da ONG, Olavo Nogueira, disse que “o momento exige mesmo um freio de arrumação, e nesse sentido, o mais importante é o adiamento das mudanças no Enem”. A entidade aponta problemas no calendário de implementação da reforma e diz ser necessário fazer ajustes, em vez de revogar a reforma.
📝 O que é o Novo Ensino Médio ?
É um novo modelo obrigatório a ser seguido no ensino médio por todas as escolas do país, públicas e privadas.
A lei estipula aumento progressivo da carga horária. Antes, no modelo anterior, eram, no mínimo, 800 horas-aula por ano (total de 2.400 no ensino médio inteiro). No novo modelo, a carga deve chegar a 3.000 horas ao final dos três anos.
Desde 2022, as disciplinas tradicionais passaram a ser agrupadas em áreas do conhecimento (linguagens, matemática, ciências da natureza e ciências humanas).
A partir deste ano, cada estudante passou a poder montar seu próprio ensino médio, escolhendo as áreas (os chamados “itinerários formativos”) nas quais se aprofundará.