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Lula destitui metade da Comissão de Ética indicada por Bolsonaro após órgão beneficiar ex-ministros

Foto: Fornecido por Estadão

BRASÍLIA – Em uma espécie de intervenção na Comissão de Ética da Presidência da República, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva destituiu nesta terça-feira, 7, três dos sete integrantes do colegiado. A decisão não tem precedentes, uma vez que nenhum dos demitidos pediu para sair.


A dispensa ocorreu após o Estadão revelar que a Comissão de Ética beneficiou aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O colegiado concedeu quarentena remunerada a dez ex-ministros, embora alguns deles nem tenham apresentado proposta formal de emprego. Ao mesmo tempo, liberou os ex-ministros Fábio Faria (Comunicações), Bruno Bianco (Advocacia-Geral da União) e Marcelo Sampaio (Infraestrutura) para trabalhar em empresas que mantêm relação com as pastas que chefiavam. Bianco já está no BTG Pactual, Faria começa em março na área de Relações Institucionais e Sampaio irá para a Vale, a gigante da mineração.


Nomeados no ano passado pelo então presidente Jair Bolsonaro, os ex-conselheiros avaliam agora entrar com uma ação judicial contra a decisão. Em tese, o mandato deles deveria ter duração de três anos. Na prática, isso não foi cumprido.


Foram dispensados Célio Faria Júnior, ex-ministro da Secretaria de Governo e ex-chefe de gabinete de Bolsonaro; o advogado João Henrique Freitas, que atuou na defesa do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e é assessor especial do ex-presidente; e Fábio Pietro de Souza, ex-desembargador e atual secretário da Justiça do governo de São Paulo. Os mandatos de todos eles terminariam em 2025.


A comissão tem caráter consultivo, mas poder para apurar e cobrar explicações de ministros sobre situações de conflito de interesse ou violação ética. Para o lugar dos destituídos, Lula nomeou três aliados: o advogado Bruno Espiñeira Lemos, que compôs a transição do governo e já defendeu o ex-ministro da Casa Civil e senador Jaques Wagner (PT); Kenarik Boujikian, desembargadora aposentada do Tribunal de Justiça de São Paulo; e Manoel Caetano Ferreira Filho, jurista e ex-advogado de Lula em ações da Lava Jato


Atuação


As trocas foram feitas por decreto. Procurada, a assessoria da Presidência não explicou as razões da mudança. O Estadão apurou que a notícia publicada nesta segunda-feira, 6, sobre a atuação do colegiado ao liberar da quarentena ex-ministros de Bolsonaro contribuiu para as substituições. O caso abriu brecha para que o Palácio do Planalto questionasse a atuação do trio. Pietro de Souza, por exemplo, foi nomeado para o primeiro escalão do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.


O elo político dos conselheiros preocupava o PT. Desde a transição de governo, havia entre os petistas receio de perseguição por parte dos “bolsonaristas” e o desejo de reformular as regras de funcionamento e escolha de membros da Comissão de Ética. Prevaleceu na ocasião, porém, o entendimento de que todos estavam protegidos pelo mandato e uma intervenção de Lula traria custo político.


Até hoje, nenhum presidente havia destituído integrantes do colegiado, mas já houve trocas por renúncias. Quando assumiu a Presidência, Michel Temer (MDB) não mudou os nomeados por Dilma Rousseff (PT). O mesmo ocorreu com Bolsonaro, que só alterou a composição do órgão quando terminaram os mandatos ou algum conselheiro pediu para sair.


Insatisfação


Os integrantes da Comissão de Ética não são remunerados. Eles recebem apenas passagens aéreas e diárias para participar de reuniões periódicas a cada mês. Uma delas deverá ocorrer hoje, no Planalto.


O Estadão conversou com os três dispensados. Todos confirmaram que não foram contatados anteriormente e se mostraram surpresos. “Lamento que o estado de direito não esteja sendo respeitado como deveria. Mandatos de conselheiros são previstos no ordenamento jurídico vigente”, disse João Henrique Freitas.


Nomeado em abril do ano passado, Pietro de Souza se limitou a dizer que Lula “tomou a decisão que ele achava que deveria tomar”. “O presidente não falou comigo, eu também não perguntei. Acabou”, afirmou. Célio Faria Júnior disse que a dispensa põe em xeque o mandato dos outros quatro conselheiros, e fragiliza a atuação independente deles.


”Tínhamos o entendimento jurídico de que o mandato era de três anos, sem poder trocar por qualquer motivo. Não sei qual foi a justificativa. Eles devem ter achado uma forma de fazer isso sem resistência. Se você tira um cara da comissão é porque ele está incomodando. Pode ser que soe mal”, declarou Faria Jr., que tinha convite de uma empresa para atuar na área de Relações Institucionais, mas foi impedido de seguir agora para a iniciativa privada.


”A comissão é um serviço distinto. Eu estava lá para ajudar, queria colocar no currículo essa experiência. Se não me quiserem lá, não sei se vou ficar brigando. Vou me orientar, vamos analisar o que fazer juridicamente. Vamos ver se tomamos alguma atitude.”


Legalidade


Para o advogado Mauro Menezes, ex-presidente da Comissão de Ética, os atos são “absolutamente legais”. Menezes citou trecho do decreto que instituiu a comissão. A norma estabelece que os conselheiros devem ter “independência e imparcialidade” na apuração dos fatos.


”É imprescindível que haja independência e imparcialidade. Temos três situações. Uma delas, a do Fábio Prieto: ele é secretário de Justiça de São Paulo, exerce cargo de confiança. O João Henrique exerce cargo de assessor do ex-presidente. Então, como ele pode permanecer no cargo? Por fim, o Célio Faria foi nomeado quando exercia o cargo de ministro da Secretaria de Governo. A própria nomeação dele dá margem para a ilegalidade”, avaliou Menezes.


Estadão


 


 


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