Ana Cristina Valle, ex-mulher do ex-presidente Jair Bolsonaro, perdeu a nacionalidade brasileira. A decisão, publicada no Diário Oficial da União nesta terça-feira (07/02), foi tomada pelo Ministério da Justiça depois de ela ter adquirido a cidadania da Noruega. Ana Cristina morou no país escandinavo de 2009 a 2014, após se separar de Bolsonaro.
A notícia pode alamar brasileiros que obtiveram nacionalidades de outros países. No entendimento do Ministério da Justiça, Ana Cristina perdeu a nacionalidade brasileira porque se tornou cidadã da Noruega ao se naturalizar no país voluntariamente, o que fere os requisitos previstos na Constituição.
“O ordenamento jurídico nacional admite que os brasileiros tenham dupla ou múltiplas nacionalidades apenas se a outra nacionalidade decorrer do nascimento em território estrangeiro, de ascendência estrangeira ou de naturalização por imposição”, explicou a pasta.
Mãe de Jair Renan Bolsonaro, Ana Cristina foi chefe de gabinete de seu ex-enteado Carlos Bolsonaro, vereador do Rio de Janeiro, entre 2001 e 2008. Ela é investigada pelo Ministério Público do Rio por participar de um suposto esquema de rachadinhas enquanto ocupou o cargo.
A ex-exposa de Bolsonaro também é investigada pela Polícia Federal pela suposta compra de uma mansão em uma região nobre de Brasília.
Nas eleições de 2022, Ana Cristina concorreu a uma vaga de deputada distrital pelo PP no Distrito Federal, mas não foi eleita. Após o pleito, ela voltou a morar na Noruega.
É possível perder a cidadania brasileira?
A Constituição brasileira de 1988 prevê que brasileiros natos que tenham adquirido outra nacionalidade podem, sim, perder a nacionalidade brasileira.
A perda de nacionalidade, no entanto, não se dá de forma automática. Para que isso aconteça com brasileiros natos, é preciso que o Ministério da Justiça brasileiro instaure um processo de perda de nacionalidade.
Mas isso não acontece com frequência, em parte devido à falta de um sistema de troca de informações entre órgãos consulares de outros países e o Brasil quanto a brasileiros que obtenham outras cidadanias.
No caso de Ana Cristina Valle, sua situação foi denunciada ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE) durante as eleições de 2022, enquanto ela disputava uma vaga de deputada distrital. O órgão enviou os documentos ao Ministério da Justiça, que então abriu o processo de perda de nacionalidade.
Outra possibilidade é que o próprio brasileiro solicite perder sua cidadania brasileira. Para tanto, é preciso enviar um requerimento ao Ministério da Justiça expondo a vontade de perder a nacionalidade e comprovar a aquisição da outra cidadania.
Como a perda da nacionalidade pressupõe a abertura de um processo no Ministério da Justiça, o que acontece é que muitos brasileiros que, em tese, poderiam perder a nacionalidade brasileira simplesmente não a perdem porque não há instauração do processo.
Exceções para mais de uma nacionalidade
Há três exceções legais que permitem ao brasileiro ter mais de uma nacionalidade. Uma delas é quando ele nasceu em território estrangeiro e, por esse motivo, adquiriu outra cidadania.
A segunda exceção é quando a outra cidadania é um direito originário, isso é, devido a laços sanguíneos com seus pais ou antepassados. Esse é o caso de muitos brasileiros descendentes de portugueses, italianos e alemães e que têm o direito à segunda nacionalidade reconhecida na lei dos respectivos países. Desde que nasceu, a pessoa já tinha direito – por parentesco – a ter outra cidadania.
A terceira hipótese envolve brasileiros que vivem em um país no qual a aquisição da cidadania é condição para permanência ou para o exercício de direitos civis. Países em que, por exemplo, sem se naturalizar, o brasileiro não poderia morar ou trabalhar. No entanto, a Constituição é vaga quanto a quais direitos civis justificariam a aquisição de uma segunda nacionalidade.
E os brasileiros com cidadania alemã?
Apesar de não impor a naturalização aos estrangeiros que queiram trabalhar ou morar em seu território, a Alemanha prevê em sua Constituição determinados direitos civis exclusivos ao cidadão alemão.
Seguindo essa premissa, os brasileiros residentes na Alemanha cairiam na segunda exceção à perda de nacionalidade prevista no texto constitucional brasileiro, em que a aquisição da cidadania do outro país passa a ser condição para permanência ou para o exercício de direitos civis.
Pela lei alemã, estrangeiros que – entre outras condições – morem há pelo menos oito anos na Alemanha (há exceções que podem encurtar esse tempo) passam a ter o direito à nacionalidade do país. Uma dessas condições é abdicar de sua nacionalidade originária.
No entanto, tal obrigação não se aplica mais aos brasileiros, porque a Alemanha incluiu o Brasil na lista de exceções a esta regra.
Segundo o Ministério do Interior da Alemanha, a regra aplicada em relação ao Brasil é de que “brasileiros que vivem na Alemanha e se naturalizam aqui, em princípio, não são liberados pelo Brasil de sua nacionalidade brasileira”.’
Desde que o Brasil passou a fazer parte da lista da Alemanha de países que não permitem a revogação de cidadania original, o brasileiro que se naturaliza no país não precisa mais solicitar a perda de sua nacionalidade brasileira ao se naturalizar alemão.
Fonte: DW