O presidente da Rússia, Vladimir Putin, ordenou o primeiro cessar-fogo desde que suas forças invadiram a Ucrânia, em 24 de fevereiro do ano passado, e sugeriu o mesmo a Kiev –que rejeitou a proposta, considerada hipócrita.
Segundo o Kremlin, os ataques ao longo das frentes de batalha serão suspensos por 36 horas, a partir do meio-dia (6h em Brasília) desta sexta (6), visando facilitar a comemoração do Natal ortodoxo, celebrado no sábado (7).
Putin diz ter seguido orientação do patriarca da Igreja Ortodoxa russa, Cirilo, seu aliado político que sofreu diversas críticas por apoiar a ação militar contra os ucranianos.
“A partir do fato de um grande número de cidadãos de fé ortodoxa moram nas áreas das hostilidades, pedimos ao lado ucraniano para declarar um cessar-fogo e permitir a eles participar dos serviços na véspera e no dia do Natal”, disse Putin, segundo o comunicado.
Tanto Rússia quanto Ucrânia são países majoritariamente cristãos ortodoxos, embora Kiev tenha deixado de aceitar a autoridade de Cirilo em 2019, no maior cisma do cristianismo desde a reforma protestante do século 16. O Natal é celebrado em janeiro porque as denominações ortodoxas mantiveram o calendário juliano, que deixou de ser usado no Ocidente a partir de 1582 em favor do gregoriano.
O assessor presidencial Mikhailo Podoliak afirmou no Twitter que a proposta de Cirilo era “uma armadilha cínica e elemento de propaganda”. Depois, ante o comunicado de Putin, escreveu: “A Federação Russa deve deixar os territórios ocupados, e só aí haverá uma trégua temporária. Guarde a hipocrisia para si”.
O movimento de Putin parece jogar para a plateia, no mesmo dia em que voltou a dizer que aceita negociar a paz com a Ucrânia se o governo de Volodimir Zelenski “levar em conta as novas realidades territoriais”, segundo relato do Kremlin de uma conversa do russo com o presidente turco, Recep Tayyip Eerdogan, que busca mediar conversas entre os beligerantes.
O termo implica que a Rússia se daria por satisfeita se Kiev aceitasse a cessão das quatro regiões que foram anexadas por Putin em 30 de setembro, apesar de os russos não as controlarem integralmente. Além disso, Moscou absorveu a Crimeia em 2014, esse um fato político consumado para a grande parte da comunidade internacional, ainda que não reconhecido.
Kiev não aceita a excisão de quase 20% de seu território e promete lutar até o expulsar a Rússia. Ambos os países já estiveram unidos no passado, sob o império dos Románov (1613-1917) e na União Soviética (1922-1991), e Putin já deixou claro que considera a Ucrânia parte da Rússia.
Esta é outra trava: os ucranianos acreditam que, cedendo território, nada impedirá Moscou de voltar a atacar no futuro. Há propostas alternativa na praça, como a do ex-secretário de Estado americano Henry Kissinger, de que Kiev aceite perder a Crimeia e as áreas controladas por separatistas no Donbass (leste) de 2014 até a véspera da invasão de 2022.
Enquanto isso, os combates seguem, principalmente na região de Donetsk, uma das áreas anexadas e em que o controle russo é de pouco mais de 50% do território. Zelenski queixou-se na quarta (4) de que o Ocidente deveria lhe enviar novos tanques para operar na região –só há disposição, a priori, para o fornecimento de blindados menos potentes.
Os russos seguiram com ataques de artilharia e, em Belarus, novas unidades de Moscou chegam a cada dia. Segundo o Ministério da Defesa da ditadura aliada ao Kremlin, haverá novos exercícios militares da força conjunta dos dois países, o que aumenta a suspeita de que uma nova ofensiva poderá envolver elementos belarussos em algum momento deste ano.
Até aqui, Minsk só permitiu o uso de seu território por forças russas, mas não se envolveu diretamente na guerra. O ditador Aleksandr Lukachenko, que esteve recentemente com Putin, nega que irá participar do conflito, mas de forma cada vez menos convincente.