Prestes a completar um ano, o conflito entre Rússia e Ucrânia está em uma nova fase. Se antes as tropas de Vladimir Putin tinham controle total e o exército de Volodymyr Zelenskysó se defendia, agora ambos atacam e contra-atacam, o que deixa a guerra em um impasse, em que não é possível apontar quem está na vantagem. Iniciada em 24 de fevereiro de 2022, a “operação especial” de Putin segue dominando os noticiários. Apesar da forte presença na mídia, vários acontecimentos dominam o conflito e geram o questionamento: como está a guerra na Ucrânia? Uma coisa é certa, o fim do conflito não é um cenário próximo, visto que ambos os países não se reúnem para realizar negociações de paz desde o final de março. Zelensky assinou, em outubro, após a Rússia anexar quatro regiões ucranianas parcialmente ocupadas, um decreto que impossibilita negociações enquanto Putin estiver no poder.
A Ucrânia também acredita que poderá haver uma escalada do conflito logo nos primeiro meses do novo ano. Há rumores de que Belarus se envolverá diretamente no conflito, informação que o Kremlin nega. Em um discurso realizado em dezembro, Zelenksy insistiu que “a proteção da fronteira com Rússia e Belarus é uma prioridade constante. Nos preparamos para todos os cenários possíveis”. O portal da Jovem Pan conversou com especialistas para entender os rumos do conflito e saber os principais acontecimentos desde fevereiro até agora, além de pontuar o que deve acontecer em 2023.
Quais os principais acontecimentos da guerra na Ucrânia?
Guilherme Thudium, doutor em Estudos Estratégicos Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e consultor político, divide o conflito em três fases: primeiro, a ofensiva russa em fevereiro, que tinha como objetivo não-declarado a deposição do presidente Volodymyr Zelensky. Segundo, o fim do cerco a Kiev, momento que coincide também com o aumento exponencial do auxílio ocidental à Ucrânia, com armamentos de última geração. Terceiro, troca no comando da operação militar russa para o general Sergey Surovikin, que adotou uma posição defensiva para garantir as conquistas territoriais até aqui. “Na guerra, a defesa é sempre mais forte que o ataque. O impasse atual gira em torno da incapacidade de se chegar a uma solução negociada para o conflito”, explica Thudium.
Desde que a Rússia trocou de comandante, passou a ter reveses na guerra, o que abriu espaço para o contra-ataque ucraniano. O país atacado conseguiu recuperar várias regiões, incluindo algumas que tinham sido anexadas por Putin em setembro, como Kherson. O cientista político Leandro Cosentino faz uma releitura de tudo o que aconteceu até agora e conclui que, diferentemente do que era apresentando nos primeiros meses, “o poderio militar russo talvez seja menor do que aquele que julgamos inicialmente”. Vale lembrar que, no início do conflito, falava-se que a Rússia tomaria a Ucrânia em pouco tempo, o que não aconteceu.
Momento mais marcante do conflito?
Dentro todos os momentos que a guerra na Ucrânia já proporciona até o momento, os especialistas concordam sobre um que tenha sido o mais marcante até agora e que ocasionou no estágio em que a guerra está hoje. A retirada das tropas russas de Kiev, direcionando o foco para Donbass – região formada por Luhansk e Donetsk, duas províncias que são pró-Rússia e tiveram sua independência declarada por Putin dias antes da invasão à Ucrânia. “Considero o momento mais marcante do conflito até aqui o fim do cerco a Kiev, no início de abril de 2022, que gestou o atual estágio do conflito”, diz Thudium. Consentino apontam esse mesmo episódio, porém, também diz outro que foi crucial: o momento em que a Rússia mostrou que seu poderio militar não era tão grande. “Ao convocar reservista, ela demonstrou haver certa debilidade. Esses foram momento cruciais”, diz o especialista, acrescentando que para o futuro devemos nos deparar com outros episódios, principalmente quando se começar a negociar pontos estratégicos.
Quais áreas da Ucrânia estão ocupadas pela Rússia?
Em quase um ano de guerra, a Rússia já ocupou várias regiões da Ucrânia e chegou até a anexar quatro delas em setembro: Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporizhia. Um dia após a anexação dos territórios em Kherson, as tropas russas deixaram o lugar, e a Ucrânia retomou o controle. Foi uma conquista bastante comemorada pelos ucranianos e que impôs à Rússia sua maior derrota desde o começo do conflito. O mapa abaixo mostra como está a situação na Ucrânia no momento. Vale lembrar que a Crimeia foi anexada pelos russos em 2014 durante uma invasão.
Quantas pessoas já morreram na Ucrânia?
Um levantamento realizado pelo comandante do Estado-Maior dos Estados Unidos, Mark Milley, em novembro, apontava que 240 mil pessoas haviam morrido no conflito entre Rússia e Ucrânia, e que o exército russo teve baixa de 100 mil soldados. Contudo, não foi só a Rússia que perdeu homens. O comandante estima que os ucranianos também tiveram perdas parecidas, além dos 40 mil civis que foram vítimas. Os números anunciados por Milley (que não foram confirmados com fontes independentes) são os mais precisos divulgados até o momento pelo governo dos Estados Unidos, após quase um ano de guerra. O conflito também deixou milhões de refugiados — é o maior número já registrado na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. A ONU afirma que pelo menos 4,8 milhões de pessoas refugiadas da Ucrânia foram registradas em toda a Europa.
Quando a guerra vai acabar?
O fim da guerra entre Rússia e Ucrânia aparenta estar bem longe do fim. Além do fato de os representantes dos dois países não terem mais conversado desde o final de março, quando houve a quarta rodada de negociações, o presidente ucraniano assinou um decreto em outubro que não permite diálogo de cessar-fogo com a Rússia enquanto Putin estiver no poder. Apesar deste cenário, no último mês do ano, o líder dos Estados Unidos, Joe Biden, se mostrou pronto para conversar com o líder russo sobre as condições para acabar com a guerra na Ucrânia. “Estou disposto a conversar com Putin se estiver buscando uma forma de pôr fim à guerra”, afirmou o americano em entrevista coletiva na Casa Branca. Putin respondeu a solicitação e falou que sempre esteve aberto ao diálogo, porém rejeitou as condições importas pelos EUA. “O presidente da Federação Russa sempre esteve e continua aberto a negociações para garantir nossos interesses”, disse o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov. “O que Biden disse na realidade? Ele disse que as negociações são possíveis apenas depois que Putin abandonar a Ucrânia”, declarou Peskov à imprensa, antes de acrescentar que Moscou “evidentemente” não está disposto a aceitar as condições. “A operação militar especial vai continuar”, concluiu.
O que esperar do conflito em 2023?
É fato que em 2023 o conflito no Leste Europeu ainda vai continuar presente. Pensando nisso, os especialistas pontuam quais devem ser os próximos passos da guerra. “Acredito que ainda haverá mais impasses nesse conflito, porque não é de fácil resolução, dado que os objetivos dos dois são bem delineados e colocados e pouco se avançou”, destaca o cientista político Leandro Consentino, acrescentando que o impasse deve permanecer. E, enquanto isso acontece, vai continuar custando vidas. O consultor Guilherme Thudium afirma que no momento “a estratégia russa prevê a intensificação do inverno como fator-chave para a exaustação da resistência ucraniana ao mesmo tempo em que executa ataques missilísticos à infraestrutura energética da Ucrânia”. Para ele, o “grande balizador do conflito em 2023 será a resposta russa ao envolvimento, direto ou indireto, da Otan”.
Com informações Jovem Pan