A eleição para o comando do Senado, na quarta-feira, além de ser a reedição do confronto de projetos políticos antagônicos visto em outubro do ano passado, vem sendo tratada, pelos estrategistas das duas principais candidaturas, como um terceiro turno do pleito presidencial. De um lado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) busca a reeleição, conta com o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, propõe pautas voltadas para a retomada do desenvolvimento do país e deseja consolidar a harmonia entre os Três Poderes. De outro, Rogério Marinho (PL-RN) tem como projeto reacender o conflito ideológico e as pautas de costumes que galvanizam a extrema direita, tem o respaldo do presidente Jair Bolsonaro — mesmo a distância, em Miami (EUA) — e pretende trazer à tona discussões com o explícito objetivo de emparedar o Supremo Tribunal Federal (STF) — como, por exemplo, votar o impeachment do ministro Alexandre de Moraes.
Na última quinta-feira, no jantar oferecido por Pacheco na residência oficial do Senado, Lula se jogou na campanha do senador à reeleição. Nos bastidores do Senado e do Palácio do Planalto, muito se fala sobre a relevância de uma relação pacífica na Praça dos Três Poderes, abalada nos últimos quatro anos pelas investidas de Bolsonaro, cujo projeto claramente autoritário encontrou resistência forte também no presidente do Senado. Ao contrário do seu congênere no comando da Câmara, o deputado Arthur Lira (PP-AL), Pacheco em vários momentos se manifestou sem meias palavras em defesa da democracia e do Estado de Direito, sobretudo diante dos ataques ao STF e ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O então presidente da República tentou, até mesmo, botar para frente uma medida provisória, a MP 1.068/2021 — que limitava a remoção de conteúdos publicados nas redes sociais —, sumariamente devolvida pelo presidente do Senado, por perceber a intenção de fazer com que as mentiras e distorções das redes bolsonaristas pudessem fluir sem freios.
Pontos positivos
Pela reeleição, pesam alguns fatores a favor de Pacheco: é considerado um bom líder entre os colegas; conta com apoio explícito do Palácio do Planalto; tem a simpatia dos ministros do STF — nos bastidores, corre a versão de que um dos seus mais empenhados cabos eleitorais é o decano do Supremo, Gilmar Mendes —; e já teria fechado 43 votos (de 41 necessários para garantir a vitória) no arco de apoios — composto por PT, PSB, PDT, MDB e PSD, mais o União Brasil, que embora não tenha chancelado a candidatura, deve apoiar a reeleição.
Os estrategistas da campanha de Pacheco consideram difícil alguma defecção, na direção de Marinho, nesse grupo de partidos. Tanto que trabalham com um horizonte de obtenção de 55 votos, que incluiria, ainda, senadores do PSDB — Alessandro Vieira (SE) é dado como certo — e do Podemos — Eduardo Girão (CE) também registrou candidatura à Presidência da Casa, mas com chances consideradas nulas. Na ponta do lápis, o grupo de apoiadores de Pacheco estima que pelo menos dois votos venham do partido do parlamentar cearense.
Para os senadores que articulam a reeleição, é importante que o senador mineiro consiga uma confortável vantagem sobre Marinho. Isso porque, na análise que fazem, uma votação expressiva sepultaria a polaridade tóxica da disputa presidencial entre Lula e Bolsonaro, e representaria a definitiva virada de página depois dos atos terroristas de 8 de janeiro. Mais: jogaria para o final da fila qualquer tentativa de ressuscitar pautas de costumes caras à extrema direita; marcaria o isolamento, na Casa, de bolsonaristas radicais — como os senadores eleitos Damares Alves (Republicanos-DF) e Magno Malta (PL-ES), que deram apoio aos acampamentos golpistas na frente dos quartéis, clamando por uma quartelada; e colocaria o Senado rumo a uma marcha ao centro, com o afastamento paulatino do radicalismo por parte senadores identificados com a direita.
A vitória de Pacheco ainda esvaziaria a narrativa nas redes sociais dos extremistas de que o país segue na direção do “comunismo” e que existe uma “conspirata” do “sistema” para os grupos “de sempre” se manterem no poder. Para culminar, os estrategistas da campanha à reeleição ainda enxergam um efeito a médio prazo: o esvaziamento do bolsonarismo para as eleições municipais de 2024. Alguns pré-candidatos — como o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que é apontado como o nome que o clã pretende lançar para disputar a prefeitura da capital fluminense — chegariam enfraquecidos e não conseguiriam fixar uma base sólida para que a extrema direita tenha chances concretas de fazer uma bancada de peso nos três níveis do Poder Legislativo. Ou até mesmo de voltar ao comando do país, em 2026.