A Polícia Federal (PF) concluiu as investigações e apontou que o presidente Jair Bolsonaro (PL) cometeu crimes ao fazer uma associação — sem provas — entre a vacinação contra a Covid-19 e o suposto desenvolvimento da Aids.
Em uma transmissão pelas redes sociais em outubro do ano passado, o presidente disse que relatórios do governo do Reino Unido teriam mostrado que pessoas totalmente vacinadas contra Covid teriam desenvolvido Aids.
A PF encaminhou seu relatório ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes no último dia 22, apontando que Bolsonaro cometeu as infrações de atentar contra a paz pública e incitar a prática de crime. A corporação tentou colher o depoimento dele, mas isso não ocorreu. Ainda assim, o entendimento foi de que não comprometeu as apurações.
Na mesma transmissão ao vivo, Bolsonaro afirmou, citando um suposto estudo atribuído ao imunologista Anthony Fauci, que “a maioria das vítimas da gripe espanhola não morreu de gripe espanhola, mas de pneumonia bacteriana causada pelo uso de máscara”. Na época, as máscaras eram obrigatórias em locais públicos no Brasil.
A live foi excluída do YouTube, do Instagram e do Facebook por violar as diretrizes de desinformação médica sobre a covid-19 das plataformas.
Além de Bolsonaro, a PF também atribui crimes ao ajudante de ordens presidencial, o tenente-coronel Mauro Cid, apontado como responsável pela produção do material divulgado na live.
O inquérito foi aberto a partir de uma representação do senador Omar Aziz (PSD-AM), que foi presidente da CPI da Covid. O procurador-geral da República, Augusto Aras, havia pedido o arquivamento do caso, alegando que os fatos já estavam sob apuração na PGR.
“Pelas razões acima expostas, finalizamos a presente investigação criminal concluindo-se pela existência de elementos probatórios concretos suficientes de autoria e materialidade para se atestar que JAIR MESSIAS BOLSONARO e MAURO CESAR BARBOSA CID, em concurso de pessoas, cometeram os delitos de ‘provocar alarma, anunciando desastre ou perigo inexistente, ou praticar qualquer ato capaz de produzir pânico ou tumulto’, previsto do art. 41 da Lei de Contravenções Penais, bem como de ‘incitação ao crime’, previsto no art. 286 do Código Penal Brasileiro”, diz trecho do documento, assinado pela delegada Lorena Lima Nascimento.
No relatório, a PF confirma que o presidente foi intimado a depor, na pessoa do Adjunto do Advogado-Geral da União, Bruno Luiz Dantas de Araújo Rosa, mas optou por exercer “seu direito constitucional de permanecer calado”.
O resultado da investigação menciona a live semanal realizada pelo atual presidente no dia 21 de outubro do ano passado. Na ocasião, Bolsonaro afirmou, sem respaldo científico, que os “totalmente vacinados contra a Covid-19″ estariam “desenvolvendo a síndrome de imunodeficiência adquirida muito mais rápido que o previsto”.
Além disso, o mandatário teria associado o uso de máscaras à morte causada pela contaminação por gripe espanhola. Vale lembrar que, naquele momento, a utilização do equipamento de proteção individual era obrigatório no país, como recomendava a Organização Mundial de Saúde (OMS).
A CNN procurou o Palácio do Planalto e aguarda retorno. Procuradas, tanto a Advocacia-Geral da União quanto a Secretaria de Comunicação Social não responderam de imediato a pedido de comentário.
A delegada da PF Lorena Lima Nascimento, responsável pelas investigações, fez uma avaliação da atuação de Bolsonaro no episódio.
“Ocorre que não se tratou de uma mera opinião…, mas sim de uma opinião de um Chefe de Estado, propagada com base em manipulação falsa de publicações existentes nas redes sociais, opinião essa, que por ter a convicção de que atingiria um número expressivo de expectadores, intencionalmente, potencialmente promoveu alarma”, disse a delegada.
Após o fim do mandato presidencial, esse inquérito — assim como outras investigações — podem ser remetidos para a primeira instância em razão do fim do foro privilegiado de Bolsonaro.
(Com informações da Reuters e do Estadão Conteúdo)