‘Jogo da Corrupção’ mostra escândalos da Copa do Mundo e alfineta Pelé

É difícil enxergar João Havelange como um vilão no começo de “Jogo da Corrupção”. Claro, ele flerta, aqui e ali, com delírios de grandeza que o cobrem de certa arrogância e egoísmo, mas nos primeiros episódios da segunda temporada da série, ele quer enfrentar o sistema, pôr abaixo anos de controle eurocêntrico na Fifa.


Para quem não sabe qual é a série que acaba de chegar à segunda temporada no Amazon Prime Video, “Jogo da Corrupção” é “O Presidente”, que mudou de nome neste novo ano e foi exibida no Festival de Cinema do Rio. Não se tornou exatamente um derivado, mas decidiu explorar uma nova narrativa, mantendo uma ligação com os episódios anteriores.


Se na primeira leva víamos como o gerente de um pequeno clube chileno se torna parte dos esquemas criminosos por trás da organização, agora acompanhamos a ascensão de Havelange, vivido pelo português Albano Jerónimo. O protagonista da temporada seminal, Andrés Parra, segue lá, agora narrando os fatos.


Nome chave para pôr a CBF no mapa mundial do futebol e também para o tricampeonato brasileiro na Copa do Mundo, em 1958, 1962 e 1970, Havelange foi presidente da Fifa entre 1974 e 1998 e saiu de lá imerso em honras -e também denúncias de corrupção.


“Eu sempre fui muito fã de futebol e, conforme fui crescendo, fui questionando o porquê de gastarmos tanto tempo e energia vendo 22 pessoas correndo atrás de uma bola. Isso me fascina, porque é como uma religião”, diz Armando Bó, argentino criador da série e vencedor do Oscar pelo roteiro de “Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)”.


“O Havelange transformou um esporte numa máquina de fazer dinheiro, então essa não é uma série sobre futebol, mas sobre política. É a história de um político, que soube usar o marketing a seu favor.”


“Jogo da Corrupção” começa mostrando Havelange à frente da CBF, enfurecido com as políticas da Fifa que privilegiavam os europeus e que, acredita, quebraram as regras do futebol para validar um gol que causou uma derrota para a seleção brasileira num dos torneios.


Ele, então, começa a fazer lobby com os latino-americanos para assumir a presidência da instituição. Mas o nariz empinado também fecha as portas dos “hermanos” e ele decide recorrer à Confederação Africana em busca de votos, dando início a uma guerra entre o velho e o novo mundo do futebol.


Em paralelo, precisa http://ecosdanoticia.net/wp-content/uploads/2023/02/carros-e1528290640439-1.jpgistrar crises em casa. Uma delas é no casamento, já que a mulher, vivida por Maria Fernanda Cândido, insiste para que ele se aposente e passe mais tempo com a família. Outra é com os amigos, que se opõem à ditadura e o chamam de traidor por posar para fotos com os militares -Nelson Freitas interpreta os presidentes do período.


Como frisou Bó, o lado político de “Jogo da Corrupção”, aliás, é muito mais intenso que o futebolístico. Quem não é fã do esporte pode até torcer o nariz num primeiro momento -mesmo com o atual clima de Copa do Mundo que toma conta do país-, mas a verdade é que a série investe mesmo em subtramas que vão além do esporte.


Entre elas está a linha tênue sobre a qual muitos andavam no período militar. “Jogo da Corrupção” não foge da tarefa de cutucar o regime e de deixar claro que a vitória brasileira na Copa de 1970 foi uma distração para as perseguições, torturas e mortes promovidas pelo regime, alcançada após uma campanha vista como prioritária pelo governo -que não entendia ou ligava para o esporte de fato.


“O Havelange foi um cara que se aproveitou da ditadura e os militares, por outro lado, se aproveitaram do futebol. O Havelange não questionava as coisas, ele só pensava no que ele queria e como chegar lá. Ele queria transcender e nada mais importava”, afirma Bó.


Outra crítica está, quem diria, em Pelé, alfinetado em cena por sua indiferença às atrocidades da ditadura militar. Demétrio Nascimento Alves assume o jovem mas já estelar rei do futebol, que nos episódios é pintado como mimado, inocente e irresponsável.


Questionado se não teve medo de cutucar duas coisas tão sagradas para o brasileiro, o futebol e Pelé, Bó diz que não. “Nós queremos justamente desmistificar. Esse é um universo de muita obscuridade, o Fifagate mostrou isso, então não estamos mostrando nada que não seja verdade -tanto para as coisas boas quanto para as ruins.”


JOGO DA CORRUPÇÃO (2ª TEMPORADA)


Quando Disponível no Amazon Prime Video
Classificação Não informada
Elenco Albano Jerónimo, Maria Fernanda Cândido e Eduardo Moscovis
Produção Chile, Argentina, EUA, 2022
Criação Armando Bó


(FOLHAPRESS)


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