Amair Feijoli, mais conhecido como Tato, condenado por envolvimento na morte da missionária norte-americana Dorothy Stang, em Anapu (PA) em 2005, foi alvo de mais uma denúncia relacionada a crimes ambientais dentro da Floresta Estadual Antimary (FEA) no Acre. Desta vez, a denúncia é do Ministério Público do Acre (MP-AC), não só por desmatar a área, mas também por associação criminosa.
Em junho deste ano, Feijoli passou a ser investigado pelo Ministério Público Federal (MPF) por, segundo o processo, se apossar de 600 hectares dentro da floresta, que são terras da União e, além disso, ameaçar moradores. Sobre essa ação civil pública do MPF, já existe uma decisão que determina que o fazendeiro desocupe as terras em 60 dias, de forma voluntária.
Já em 8 de novembro, o promotor de Justiça, Thalles Ferreira Costa, assinou uma denúncia, agora do Ministério Público do Acre (MP-AC) contra Feijoli por crimes ambientais e associação criminosa. A medida é resultado de um inquérito da Polícia Civil que constata que o fazendeiro estaria pagando pessoas para cortar árvores dentro da unidade de conservação.
Em junho deste ano, a Justiça do Pará informou que Amair Feijoli cumpria o restante da pena no regime aberto no Acre após se mudar para o estado. Porém, a pena de Feijoli finalizou em 28 de agosto deste ano, segundo o TJ, e o advogado de defesa do pecuarista, Ayres Dutra, informou que ele já não deve mais nada à Justiça com relação a esse caso. O g1 entrou em contato com os tribunais do Acre e Pará para saber mais detalhes do encerramento do processo e aguarda retorno.
O que diz o inquérito
O inquérito policial de junho deste ano é sobre uma prisão em flagrante de três homens que foram pegos usando motosserras e derrubando árvores dentro da unidade sem a licença ambiental.
O caso ocorreu no dia 22 de junho e foi constatado por equipes da Polícia Militar junto com o Instituto de Meio Ambiente do Acre (Imac) ao ouvirem o barulho da motosserra. Dois dos acusados estavam serrando uma castanheira de aproximadamente 15,98 m³, de onde já haviam feito 144 peças de viga com a madeira extraída ilegalmente.
O terceiro envolvido serrava uma outra castanheira, de aproximadamente 13,27 m³, já com 12 vigas de madeiras. Ao ser abordado, o trio confirmou às equipes que havia sido contratado por Amair Feijoli e que receberia R$ 100 a cada dúzia de viga serrada. No dia da ocorrência, o Imac também aplicou multa no valor de R$ 19.820.
Os três homens presos nessa operação tiveram os alvarás de soltura concedidos pela Justiça no dia 24 de junho, tendo que cumprir algumas medidas cautelares.
No dia 30 setembro, a Promotoria de Justiça Criminal de Sena Madureira requisitou diligências ainda sobre o desmate ilegal e que Amair Feijoli fosse ouvido.
Multas recorrentes
A terra de Feijoli dentro da unidade de conservação está no nome da filha dele, Patrícia Coutinho da Cunha, que recebeu pelo menos três multas, de quase R$ 1 milhão, por desmatamento dentro da floresta pública.
Além das multas, Patrícia recebeu três embargos da área. As primeiras multas e embargos foram aplicados em janeiro deste ano, quando o Batalhão Ambiental e o Instituto de Meio Ambiente do Acre (Imac) esteve no local; a segunda multa em fevereiro e a mais recente em junho após nova operação contra crimes ambientais na região. A área desmatada ultrapassa os 193 hectares.
No final de julho deste ano, Amair Feijoli nomeou um procurador para que o representasse no processo no Acre, alegando que residia em Porto Velho (RO). No entanto, na própria procuração, ele indica um endereço em Rio Branco. Ao ser questionado sobre as acusações, o advogado, que representava o pecuarista, ficou em silêncio.
Após todo esse procedimento, o Ministério Público do Acre (MP-AC), ofereceu a denúncia, não só contra os três homens que haviam sido presos em flagrante, mas também contra Feijoli por crime ambiental, devido ao desmate ilegal, e também associação criminosa.
Desocupação
Em uma decisão do dia 25 de outubro deste ano, Carolynne Souza Oliveira, juíza da 1ª Vara da Justiça Federal no Acre, determinou que Feijoli e a filha desocupem a área, de forma voluntária, no prazo de 60 dias.
Essa decisão é resultado da ação civil pública ingressada pelo Ministério Público Federal do Acre (MPF), que iniciou uma investigação em junho deste ano, comprovando que as terras ocupadas pelos dois fazem parte da União.
O espaço foi comprado por Amair em 2005, mesmo ano da morte da missionária Dorothy Stang. O processo destaca ainda que, após a família ocupar a área, o desmatamento aumentou significativamente.
Conforme registro no Cadastro Ambiental Rural (CAR), os proprietários declararam um tamanho total de 5.488,34 hectares, sendo explorados 200 hectares e todo o resto formado por vegetação nativa. Relatos das pessoas ouvidas no inquérito civil apontam que, após a venda da propriedade, os novos ocupantes teriam, além de ameaçar e hostilizar as pessoas locais, promovido abertura de extensas áreas de desmatamento.
Feijoli e a filha alegam durante o processo que compraram as terras de antigos donos, que teriam herdado a área, e que possuem a documentação do local registrada em cartório. Porém, nessa decisão, a Justiça não reconhece a validade do documento, uma vez que laudos e documentos comprovam que a área seria da União e, por isso, deveriam ser desocupadas.
‘Perseguido‘
Tanto nos processos, como em declarações feitas ao g1, o advogado da família Feijoli, Ayres Dutra, disse que o que acontece é o que ele chama de uma “condenação perpétua” pelo crime cometido por Amair em 2005, que ainda pesa.
“É como se fosse uma condenação perpétua, porque nem nessa fazenda vai. Ele foi lá três vezes e pegou uma paulada. Essas castanheiras, quem derrubou foram os invasores, mas é muito difícil quando ninguém quer ouvir a verdade. Cada um quer aparecer um pouco, apontando o dedo para uma pessoa, que nesse caso aí é inocente”, diz.
Sobre o crime de 2005, Dutra destaca que Feijoli confessou o crime, pagou e a pena e se arrepende todos os dias.
“Ele não tem condenação nenhuma para cumprir. Já pagou tudo, comprou uma área de terra de um pastor, que prometeu entregar a terra livre e desembaraçada e o que ele ganhou foi isso aí. Aamir nunca grilou nada de ninguém, ele comprou, acreditou, a terra tem documento, com certidão até hoje e hoje dizem que está dentro de uma reserva, sendo que a terra existia antes da reserva”, pontua.
O advogado disse ainda que a morte da missionária foi um fato isolado na vida do pecuarista e que ele não compactua com crimes. “O que aconteceu em Sena Madureira é a total inversão de valores de uma polícia despreparada”, critica.
Ameaças e tentativa de homicídio
O clima de tensão dentro da unidade é comum nos relatos das denúncias. Tanto que, além dos crimes ambientais, a família de Feijoli se envolveu também em uma tentativa de homicídio. Também em julho deste ano, a Polícia Civil cumpriu mandados judiciais na Fazenda Canãa, dentro da floresta estadual do Antimary (FEA), que está ocupada atualmente pela família de Feijoli.
Nas terras dele foram apreendidas três armas de fogo, sendo duas espingardas, um rifle calibre 22, munições calibre 12 e um colete à prova de balas que, provavelmente, faz parte do patrimônio da Polícia Militar, da Polícia Civil ou de uma das outras forças de segurança.
Quatro pessoas que estavam na fazenda foram presas por posse ilegal de arma de fogo de uso permitido. Em maio deste ano, um agricultor de 27 anos procurou a delegacia de Sena Madureira para denunciar o filho do pecuarista, Patrick Coutinho da Cunha, por tentativa de homicídio. A vítima chegou a conversar com o g1 na época, mas pediu para não ter seu nome divulgado.
O que consta no boletim de ocorrência é que na noite de 28 de maio deste ano, o agricultor foi atingido por disparos de arma de fogo na barriga por Patrick. Ele alega que Amair Feijoli tomou sua área no Ramal do Cassirian e que foi exigir o pagamento. Feijoli teria negado e o agricultor disse que voltaria para a casa e foi aí, que, segundo ele, o pecuarista o ameaçou.
Na discussão, o agricultor contou que chegou a procurar uma faca para se defender, não achou, e então pegou um taco de sinuca e bateu na cabeça do pecuarista. Foi quando Patrick partiu para cima do agricultor e os dois começaram a brigar. Então, com uma arma entregue pelo tio, o filho de Feijoli disparou duas vezes contra ele. A vítima conseguiu correr e se escondeu na mata, enquanto Feijoli, o filho, o irmão e mais dois peões ainda pegaram o carro para encontrá-lo, mas não conseguiram. O relato consta no depoimento dele à polícia.
Segundo o processo, dias após a tentativa, o agricultor registrou mais um denúncia de ameaça, alegando que Feijoli ameaçava não só ele, mas a família dele.
Na delegacia, Feijoli contou que recebeu 11 pontos na cabeça após ser agredido pelo agricultor, que, segundo ele, vendeu as terras. Algumas testemunhas foram ouvidas na delegacia e confirmaram que o agricultor tinha bebido e que ao ver Feijoli havia se alterado.
De acordo com a Polícia Civil, as testemunhas não conseguiram confirmar com precisão quem atirou no agricultor. Já Feijoli, em depoimento, disse que após receber a pancada na cabeça desmaiou e nem chegou a ouvir os disparos.
Em junho, o delegado Marcos Frank pediu a prisão preventiva de Patrick diante de todos os fatos, que foi aceita pela Justiça no dia 17 de junho. Já no dia 15 de agosto, mais uma vez, o promotor de Justiça Thalles Costa, pediu algumas diligências antes de oferecer a denúncia – o que ainda não ocorreu.
No dia 27 de outubro, o MP reforçou que as diligências fossem feitas para ouvir testemunhas e ser anexado um relatório do mandado de busca e apreensão na casa de Patrick. O delegado tem 30 dias para atender o pedido do MP. Esta é a última movimentação do processo e, até agora, o filho do pecuarista não foi preso, mesmo com mandato de prisão preventivo decretado.
Fonte: G1ACRE