Trocar o óleo de soja pela banha de porco na hora de cozinhar. Cortar a carne vermelha do cardápio na maior parte da semana. Reduzir o consumo de leite e ovos. Substituir corridas em aplicativos de transporte pela bicicleta. Adiar viagens de avião.
Em tempos de inflação alta e persistente, brasileiros fazem malabarismos para lidar com os preços e preservar as finanças, segundo relatos ouvidos pela reportagem. Moradora da capital paulista, a assistente http://ecosdanoticia.net/wp-content/uploads/2023/02/carros-e1528290640439-1.jpgistrativa Ana Letícia Rodrigues Brandão, 26, faz parte do grupo que teve de alterar a rotina devido à carestia.
Há cerca de seis meses, ela passou a viver com o namorado, o que até ajudou a aliviar, mas não eliminou toda a pressão sobre o orçamento.
“A gente faz adaptações, divide despesas, mas o custo sai alto”, afirma.
A jovem conta que reduziu o consumo de leite em razão dos aumentos nas gôndolas dos supermercados. Na tentativa de economizar gás de cozinha, busca ligar menos vezes o fogão e preparar refeições em quantidades maiores.
Também evita fazer frituras com óleo de soja, outro item que ficou mais caro na pandemia. No lugar do óleo, é usada banha de porco, trazida do Piauí, terra natal da família de Ana Letícia. Na ida mais recente para o estado nordestino, em janeiro, a jovem encarou uma viagem de ônibus de três dias, já que os preços das passagens aéreas não cabiam no bolso.
“A gente tem evitado fazer outras viagens”, diz.
Guilherme Vieira, 25, saiu da casa dos pais, em São Paulo, no período em que a inflação ganhou força no país. Há cerca de oito meses, ele se mudou para Maceió por motivos de trabalho. Vieira é formado em gestão de políticas públicas. Na capital alagoana, o jovem costumava dividir corridas em um aplicativo de transporte para se deslocar até o trabalho. O problema é que, segundo ele, os preços das viagens pularam da faixa de R$ 10 para em torno de R$ 25. A saída foi comprar uma bicicleta.
“Estou procurando ir para o trabalho e voltar para casa de bike”, diz Vieira, que também diminuiu as compras de produtos como leite e ovos devido à inflação. O autônomo Gustavo Alves Amorim, 32, afirma que sentiu duplamente a carestia dos alimentos. É que ele produz e vende itens como bolos e brownies.
“Senti o impacto da inflação na rotina pessoal e no lado profissional também”, conta o morador do município mineiro de Ipatinga (212 km de Belo Horizonte). “Percebi a alta de produtos como óleo de soja e leite. O que tenho feito é buscar alternativas: fazer testes, procurar outras marcas”, acrescenta.
A inflação acumulada em 12 meses no Brasil está em dois dígitos desde setembro de 2021, segundo dados do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo). Economistas até esperam que o indicador encerre 2022 abaixo de 10%, mas a tendência é de preços em patamares ainda elevados.
Às vésperas das eleições, a escalada inflacionária virou dor de cabeça para o presidente Jair Bolsonaro (PL). O aumento dos preços é visto por membros da campanha dele como principal obstáculo para reeleição.
Pressionado, Bolsonaro aposta no corte de impostos sobre combustíveis e outros itens para frear a carestia.
De acordo com economistas, essas medidas trazem um viés de baixa para as projeções de inflação neste ano, mas há risco de a perda de receitas gerar uma espécie de bomba fiscal, com impactos negativos sobre os preços mais à frente.
O professor de história Marcelo Rebinski, 51, é mais um brasileiro que relata preocupação com a perda do poder de compra. Morador de Curitiba, ele diminuiu o consumo de carne vermelha. “A gente busca encontrar uma fonte de proteínas mais barata, como carne de frango e ovo. O problema é que esses preços também subiram”, afirma.
“Aí a gente tenta suprir com outros alimentos, como feijão e lentilha. Faz uma variação”, completa Rebinski, que ainda cortou gastos com lazer e compra de livros. Com a pressão inflacionária, a produtora audiovisual Dandara Aparecida, 26, tenta frear suas despesas mensais na cidade do Rio de Janeiro, onde passou a morar durante a pandemia, após deixar a capital paulista.
Ela diz que diminuiu a quantidade das compras e eliminou itens supérfluos da lista do supermercado. “Ao longo dos meses, fui percebendo os aumentos nos preços e decidi reduzir os mimos. Alguns congelados e iogurtes, por exemplo, eu diminui”, conta.