Esta semana foi confirmada a primeira morte de um brasileiro na guerra da Ucrânia. André Ráck Bárri, de 44 anos, foi baleado por tropas russas no leste do país. Logo que a guerra começou, ele se apresentou voluntariamente para lutar contra os russos.
André publicava muitos vídeos nas redes sociais. Em alguns, mandava notícias à família. Em outros, compartilhava com amigos os horrores da guerra, como os corpos nesta rua devastada.
Gaúcho de Porto Alegre, ele era formado em enfermagem e tinha experiência militar. Serviu ao exército brasileiro e, quando morou na França, decidiu se alistar na Legião Estrangeira – um grupo que envia combatentes para várias partes do mundo. Vinha trabalhando como motorista de aplicativo e morava no Ceará, com a mulher Riana, e a filha deles, de 3 anos – caçula dos cinco filhos de André.
“Eu chorei muito… Foi muito difícil. Perguntei se não tinha como ele dizer não, se não tinha como ele voltar, ele disse que não”, lembra Riana.
No dia 1 de junho, André fez uma chamada de vídeo para a esposa.
“Dentro do carro, ele me fez a ligação. Isso com os olhos chorosos já, cheios de lágrimas, eu não entendi o por quê. Daí ele pegou e falou assim: ‘Para onde eu estou indo é pior do que todas as outras missões que fiz’. Ele ainda falou: ‘Tira um print da tela, amor, que essa pode ser a nossa última foto’”
No último domingo (5), um amigo de André fez contato com a família.
“Meu nome é Sandro, eu sou o comandante aqui do pelotão… A notícia que a gente tem é que, sim, o corpo está no necrotério… Nós todos estamos muito sentidos… Todas as minhas condolências aí para família”, diz o amigo em áudio.
O Fantástico conversou com Sandro, que estava em um hospital em Kiev. Um militar acompanha a entrevista. E Sandro conta que André estava na “primeira linha” do pelotão.
“O André levantava a mão para tudo. Na hora, ele levantou a mão e ele falou: Sandro, me coloca lá… No momento as coisas começaram a explodir e pelo que a gente sabe, ele acabou sendo alvejado por tiro de metralhadora”
A confirmação oficial veio na quinta-feira (9). O Ministério das Relações Exteriores divulgou uma nota sem citar o nome de André, mas a família confirmou que se tratava mesmo dele.
No texto, o Itamaraty disse que recebeu, por meio da embaixada do Brasil em Kiev, a confirmação da morte de um brasileiro em território ucraniano em decorrência do conflito.
“Eu tinha fé que ele ia voltar“, diz a esposa de André.
Em nota ao Fantástico, o Itamaraty informou que o traslado de restos mortais de brasileiros falecidos no exterior é decisão da família. Que não há previsão regulamentar e orçamentária para o pagamento do traslado com recursos públicos. E voltou a desaconselhar enfaticamente a ida de brasileiros à Ucrânia, enquanto não houver condições de segurança no país.
Além de André, outros vários brasileiros foram para a guerra na Ucrânia. Não se sabe ao certo quantos. Muitos moram na Europa. Gente que nada tem a ver com o conflito, mas que decide se apresentar para lutar no lado ucraniano e trocar tiro com as forças russas.
Tialison Cardoso foi militar no Rio de Janeiro. Participou da ocupação do Complexo do Alemão, em 2011, e do Complexo da Maré, em 2014. Já David Moura foi professor de artes marciais e Bombeiro Civil. Eles foram juntos para a Ucrânia e encontraram condições muito diferentes das prometidas em anúncios na internet: a começar pelo dinheiro que receberiam, cerca de 2 mil dólares mil por dia mais bônus.
“Nada disso é verdade. Nada disso existe”, diz David, que não tem problema em ser chamado de “mercenário”, como são conhecidos os combatentes estrangeiros que participam de guerras em troca de dinheiro.
“Você vai receber um treinamento ali de um dia e você vai para o combate. Se eles vierem te pagar algo, terá um valor de 400 dólares por mês. O perigo é iminente e você está ali insistindo. É algo que não dá para explicar muito bem. Tá no sangue, tem que gostar”, lembra Tialison.
Quem fala ucraniano ou inglês, costuma ganhar mais. É o caso do Sandro, que fala várias línguas.
“O parlamento daqui aprovou uma emenda constitucional em que durante a Lei Marcial, ela contrata literalmente estrangeiros e nós somos parte do exército ucraniano. Não tem diferença entre eu e um militar nacional. Tenho identidade, eu recebo salário, eu recebo tudo aqui como se eu fosse funcionário ucraniano”, afirma Sandro.
Fonte: G1