A professora Ianca Emanuela, de 26 anos, ganhou R$ 15 mil de danos morais por ter sido submetida a uma curetagem após um suposto aborto espontâneo em 2018. Ela procurou ajuda médica quando começou a sangrar, foi avisada que tinha perdido o bebê, fez o procedimento, mas continuou sentindo os sintomas da gravidez.
Após diversos exames, consultas médicas, desgaste emocional e perda de peso, Ianca descobriu em fevereiro de 2019 que continuava grávida. Heitor Gael nasceu em julho do mesmo ano sem nenhum problema de saúde.
No processo consta que o Estado entrou com recurso contra a decisão. No documento, a gestão alega falta de provas para comprovar a ocorrência de dano. “A bem da verdade, a falta de provas já é suficiente para justificar a improcedência do pleito autoral, pois inexiste nos autos elementos de convicção que, pelo menos surgiram a existência de conduta omissiva atribuível ao Poder Público”, diz parte do recurso.
“Fui mãe muito cedo, mas já trabalhava e acabei sendo mãe solteira. Depois da vinda dele tudo mudou, trouxe felicidade, tudo ficou mais colorido. É a única criança que mora na minha casa, traz alegria, paz e a gente muda até o pensamento quando a gente se torna mãe. Amo ser mãe, sou dedicada a ele, tudo que faço é por ele. Para mim, considero ele um milagre de Deus. Suportou tantas coisas e acredito que tem um propósito na minha vida. Todos os dias agradeço por ele ter nascido bem“.
Gravidez planejada
O desejo de ser mãe nasceu quando Ianca conheceu o pai de Heitor. Em 2018, ela se planejou com o ex-companheiro a ter um filho e viu o sonho começar a ser realizado em novembro do mesmo ano. Após fazer um teste de gravidez de farmácia no dia 3 de novembro, que deu positivo, ela percebeu um sangramento e procurou o médico.
O primeiro atendimento de Ianca foi feito no hospital de Mâncio Lima, onde ela mora. Na unidade de saúde ela diz que uma enfermeira fez o ‘toque’ e viu que o colo do útero estava aberto. De lá ela foi encaminhada para a maternidade de Cruzeiro do Sul, cidade vizinha, para uma avaliação mais específica.
A professora recorda que fez um ultrassom na maternidade e o médico falou que estava vendo o feto, mas o coração não batia. Depois de novos exames e avaliações, Ianca foi avisada que tinha mesmo perdido o bebê e teria que voltar no dia seguinte para fazer uma curetagem.
“Fiquei muito arrasada. Voltei para Mâncio Lima, como não tinha onde ficar em Cruzeiro do Sul. Cheguei cedo, me internaram e fui para o centro cirúrgico. Fiquei muito abalada, falei para o médico que não queria sentir dor, estava chorando muito, muito nervosa. O médico pediu para eu ficar tranquila, que não iria sentir nada. Uma amiga me acompanhava, o processo durou mais de meia hora. Não senti nada, fiquei internada um dia ainda tomando a medicação“, disse.
Ianca Emanuela disse que não voltou a fazer nenhum exame e recebeu alta do hospital. Três dias depois da internação, a professora começou a sentir muita febre e voltou ao médico. Ela contou que explicou para a equipe médico tudo que tinha perdido um bebê, fez novos exames e foi diagnosticada com malária.
“Falei para o médico que tinha passado pelo processo de curetagem e perguntei se tinha algum problema tomar os remédios e ele falou que não. Permitiu que tomasse as nove doses do tratamento contra a malária. Eu grávida, sem saber. Tudo que eu comia vomitava, fiquei muito doente“, confirma.
Transtornos
O abalo emocional foi tão intenso que a professora diz ter emagrecido 11 quilos nesse período. Recuperada da malária, no Natal daquele ano, ela pegou dengue e também tomou toda a medicação do tratamento.
Em meio a tudo isso, a professora e o pai de Heitor se separam. Segundo ela, a separação não teve relação direto com o suposto aborto, mas, de alguma forma, toda situação afetou a relação dos dois. Três meses após a curetagem, Ianca continuava sem menstruar e ainda sentia alguns sintomas de uma mulher grávida.
“Poderia imaginar qualquer coisa menos que seria uma gravidez. Eu não tinha me relacionado com mais ninguém, tinha passado por um processo de curetagem, então, gravidez não era uma hipótese. Em fevereiro de 2019 procurei uma médica particular porque eu não menstruava. Antes da consulta fiz três testes de gravidez, que deram positivo. Fui na médica, expliquei a situação e ela falou que não seria possível, mas teria que fazer uma ultrassom transvaginal. Quando ela colocou tirou imediatamente e falou: ‘você continua grávida e vai fazer cinco meses“, recorda.
A notícia caiu como uma bomba para Ianca. “No princípio, eu planejei, mas depois nem estava mais com o pai do meu filho. Minha mãe ficou aliviada porque achava que eu estava com alguma doença. Deu para ver até o sexo, disse que era um menino”, fala.
A professora teve que entrar em contato com o pai do menino, que estava em outro relacionamento, ter mais um desgaste emocional ao contar toda a situação. Ela teve que fazer um exame de DNA para comprovar a paternidade da criança.
“Eu tinha perdido a criança, não nos relacionamos mais e como ele ia acreditar que a criança era dele? Foi feito o teste de DNA, foi um transtorno, tive a alegria de saber que ia ter o meu filho, porém, por outro lado, foi muito difícil. Depois que descobri que continuava grávida o pai do meu filho estava com outra pessoa. Graças a Deus deu tudo certo“, pontua.
A professora diz que iniciou o pré-natal no 5º mês da gestação e o médico que a acompanhou falou que seria necessário uma avaliação mais precisa após o parto para saber o que tinha acontecido.
“O médico falou que, possivelmente, eu tenho duas cavidades uterinas e uma criança estava em uma cavidade e outra na outra cavidade. Outra hipótese é de que estava grávida de gêmeos, que hora da raspagem não pegou no bebê que ficou. Ele pediu para eu voltar três meses depois parto que iria fazer exames, que eu não precisa pagar, mas nunca voltei“, afirma.
A mãe diz que temia que o filho tivesse algum problema de saúde devido aos medicamentos que tomou e tudo o que passou durante a gravidez, mas comemora o final feliz ao lado do filho.
G1 AC