O laudo complementar de exame de corpo delito de lesão corporal feito a partir da análise do material gástrico de Bruno Carvalho Cabral, de 16 anos, mostra que o estudante foi vítima de uma “ação química, envenenamento por carbamatos” — compostos orgânicos utilizados como inseticida. O documento foi utilizado pelo delegado Flávio Rodrigues, titular da 33ª DP (Realengo), para pedir a prorrogação da prisão temporária por mais 30 dias da madrasta Cíntia Mariano Dias Cabral por tentativa de homicídio contra o rapaz, deferida nesta terça-feira, dia 14, pelo juiz Alexandre Abrahão Dias Teixeira, do II Tribunal do Júri da capital.
No documento, ao qual o EXTRA teve acesso com exclusividade, o perito Gustavo Figueira Rodrigues explica que o exame laboratorial revelou a presença de quatro grânulos esféricos diminutos, de coloração azul escura, no organismo de Bruno — “forma de apresentação de raticida ampla e clandestinamente comercializado e conhecido como chumbinho”. A análise química do material em questão, entretanto, não revelou a presença de substâncias tóxicas: “Os carbamatos possuem meia vida curta, e considera-se que, em 24 horas, 90% da dose ingerida é eliminada pela urina”, escreve.
O perito também ressalta: “Os sintomas geralmente iniciam-se logo após a exposição, sendo necessária a intervenção imediata e urgência, tratamento adequado devido ao alto risco. O uso de carvão ativado promove a adsorção do produto tóxico no estômago e ao longo do tubo digestivo, diminuindo não somente a absorção da substância tóxica, como também a probabilidade de detecção de exame laboratorial, sanguíneo e do material coletado”.
“O quadro clínico e a apresentação dos grânulos revela quadro clássico de intoxicação por raticidas, carbamatos, aldicarb. Caso a vítima não tivesse sido submetida a tratamento imediato, como ocorreu, teria provavelmente evoluído para óbito”, assegura o laudo do IML.
Na decisão pela prorrogação da temporária, Alexandre Abrahão Dias Teixeira argumenta que somente a manutenção da prisão de Cíntia “possibilitará a eventual aplicação da Lei Penal e a instantânea garantia da ordem pública, evitando-se a reiteração criminosa, o que indiciariamente já se viu nestes autos em razão do surgimento de elementos do segundo fato agora melhor apurado”, referindo-se ao suposto homicídio cometido por ela contra a irmã de Bruno, Fernanda Carvalho Cabral, de 22 anos, pelo qual também é investigada.
— Soubemos da prorrogação da prisão, mas entendemos que esta prisão é precipitada. Vamos aguardar o laudo da perícia feita no corpo da Fernanda Carvalho Cabral para tomarmos as providências cabíveis — disse o advogado Carlos Augusto Santos, que defende Cintia.
De acordo com o inquérito, Bruno teria começado a passar mal minutos após ter saído da casa onde Cíntia morava com seu pai, Adeilson Cabral, no dia 15 de maio. Na residência, durante o almoço, foram servidos feijão, arroz, bife e batata frita. O rapaz teria reclamado que o feijão estava com gosto amargo e o colocou no canto do prato. A madrasta então levou o prato de volta à cozinha e colocou mais comida.
Após a refeição, o estudante foi deixado na casa da mãe, Jane Carvalho Cabral, que ligou, então, para o ex-marido contando dos sintomas apresentados pelo filho. Levado ao Hospital Municipal Albert Schweitzer, o jovem foi submetido a uma lavagem gástrica e teve a intoxicação exógena diagnosticada pela equipe médica.
À mãe, ele relatou ter passado mal após ingerir “umas pedrinhas azuis que estavam no feijão” e contou que, ao servir seu prato, a madrasta teria apagado a luz da cozinha “como se estivesse escondendo algo”. Aos policiais, Cíntia disse que as tais “pedrinhas” eram um tempero de bacon que não havia dissolvido na comida.
Por meio de seus advogados, Cíntia nega que tenha cometido o crime. Segundo as investigações, os envenenamentos teriam acontecido por ciúmes que a madrasta nútria da relação do companheiro com seus filhos biológicos. A madrasta ainda é suspeita da morte de um ex-namorado, o dentista Pedro José Bello Gomes, em 2018; e de um vizinho, o representante farmacêutico Francisco das Chagas Fontenele, em 2020.