O desembargador Ney Bello, do Tribunal Reginal Federal (TRF-1), acatou um pedido de habeas corpus da defesa de Milton Ribeiro e mandou soltar o ex-ministro da Educação.
A decisão se estendeu aos outros quatro presos da operação que havia sido deflagrada pela Polícia Federal na quarta-feira, 22, incluindo os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura.
O ex-ministro da Educação, pastor Milton Ribeiro, foi preso na quarta-feira, alvo de investigações por corrupção no Ministério da Educação (MEC).
O centro das acusações são as denúncias de um esquema de tráfico de influência, por meio do qual Ribeiro teria aberto espaço para que pastores aliados cobrassem propina de prefeituras para liberação de verbas públicas do governo federal.
Ribeiro foi preso preventivamente em meio à investigação. Mas o desembargador entendeu que o ex-ministro não está mais no governo e que os fatos investigados não são atuais, de modo que não se justificaria a prisão cautelar.
Mais cedo nesta quinta-feira, 23, o desembargador plantonista Morais da Rocha havia tido entendimento diferente e rejeitado o pedido de soltura de Ribeiro. O magistrado afirmou na ocasião que a defesa de Ribeiro não havia apresentado “os documentos indispensáveis para demonstrar o alegado constrangimento ilegal” na prisão.
Na operação que prendeu Ribeiro, batizada de “Acesso Pago”, a PF afirmou que “foram identificados possíveis indícios de prática criminosa para a liberação das verbas públicas” na educação. As acusações de corrupção no MEC foram o catalisador para a saída de Ribeiro do governo, em março.
Quais são as acusações contra o ex-ministro da Educação
No cargo de 2020 até março deste ano, Ribeiro é acusado de ter montado um “balcão de operações” no MEC com pastores aliados, sobretudo no que diz respeito aos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
Informações reveladas inicialmente pelo Estadão mostraram que pastores cobravam propinas de prefeitos para o repasse de verbas públicas.
O ministro Milton Ribeiro, por sua vez, é acusado de cooperar com o esquema ao liberar recursos preferencialmente a prefeitos que negociaram com os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, líderes das operações segundo as acusações.
Um hotel em Brasília teria sido usado como quartel general para negociar as propinas com prefeitos.
O FNDE é uma autarquia, ligada ao MEC, e cujo objetivo é transferir recursos e prestar assistência a estados e municípios na educação. Pela Constituição, o governo federal não gerencia diretamente a maior parte das escolas de educação básica, que ficam a cargo de estados (sobretudo no ensino médio e anos finais do ensino fundamental) e municípios (educação infantil e anos iniciais do fundamental). Cabe à União, assim, somente repassar recursos e coordenar projetos com os entes, o que faz por meio de mecanismos como o FNDE.
A decisão sobre para onde vão os recursos deve se valer de critérios como os projetos aprovados e necessidade de cada município e escolas.
Mas, no esquema investigado pela PF, refeitos precisariam retribuir as verbas públicas para a educação de seus municípios com propina que ia de barras de ouro a apoio em eventos religiosos. Em uma negociação, foi exigida até mesmo a compra de bíblias com o rosto do ministro Milton Ribeiro para um evento.
A cobrança de propina e posterior repasse aos municípios selecionados – e não aos que correspondiam ao interesse público – acontecia com a anuência de Ribeiro, segundo as acusações, que o ex-ministro nega.
Disputas no FNDE
O FNDE existe desde 1968 e é historicamente um posto estratégico no governo por gerir recursos bilionários, além de ser essencial para o desenvolvimento de políticas públicas de educação no Brasil.
Parte dos repasses do FNDE é carimbado, como no caso do Fundeb, fundo de educação básica em que cada prefeitura recebe um valor por aluno (independentemente de alianças ou não com o governo da vez). Mas há uma margem ampla de flexibilidade em outras frentes, como obras, compra de ônibus escolares e programas diversos, que foram exploradas no balcão de operações dos pastores.
Não é a primeira vez que o FNDE domina o noticiário recente. Um dos marcos da autarquia no governo do presidente Jair Bolsonaro foi a rotatividade no alto escalão. No período de um ano entre 2019 e 2020, o FNDE teve três presidentes, cada qual por poucos meses no cargo, até que assumisse o atual mandatário, Marcelo Lopes da Ponte, que começou logo após a chegada de Milton Ribeiro.
Nos últimos anos, críticos do governo também questionaram com frequência a nomeação de grupos sem experiência em políticas públicas de educação em postos-chave no FNDE e no MEC, como grupos religiosos e ex-aliados do filósofo Olavo de Carvalho.
A gestão de Milton Ribeiro no MEC
Milton Ribeiro foi o ministro da Educação mais longevo do governo Bolsonaro. Desde que o governo assumiu, em 2019, a pasta teve como ministros Ricardo Vélez Rodríguez, ligado a Olavo de Carvalho e que caiu no mesmo ano; e depois Abraham Weintraub, que anunciou sua saída do Ministério em 2020 em meio a uma investigação da Polícia Federal.
O atual ministro da Educação é Victor Godoy Veiga, que foi secretário executivo da pasta durante a gestão Ribeiro.
Ribeiro terminou deixando o cargo em março diante da pressão após as primeiras informações sobre o escândalo no MEC. Ao falar da saída do ministro, o presidente Bolsonaro afirmou na ocasião que o pastor havia deixado o governo “temporariamente”. Antes da exoneração de Ribeiro, Bolsonaro chegou a dizer que colocava “a cara no fogo” pelo ex-ministro.
A operação desta semana aconteceu sobretudo porque Ribeiro perdeu o foro privilegiado ao deixar o governo. O inquérito havia sido inicialmente aberto pelo procurador-geral da República, Augusto Aras após ordem do Supremo Tribunal Federal (STF), em meio à forte pressão após as primeiras acusações. Mas, depois de Ribeiro sair do governo, a ministra Cármen Lúcia remeteu o caso à primeira instância.
Mesmo antes dos escândalos envolvendo o MEC em sua gestão, Ribeiro vinha sendo amplamente criticado por especialistas, pesquisadores e a comunidade da educação pelo que foi considerado uma má gestão à frente da pasta. Durante a pandemia, o MEC foi questionado por não prover apoio e coordenar políticas para os alunos. Com a anuência de Ribeiro, o governo federal também vetou em 2021 um pacote aprovado no Congresso que ajudaria a oferecer internet aos estudantes mais pobres em escolas públicas.
Fonte: EXAME