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Trinta anos depois do incêndio até hoje não explicado do prédio da Assembleia Legislativa, ouvimos um dos heróis daquele sinistro, um soldado que acaba de ir para reserva como coronel, depois de comandar os Bombeiros

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O incêndio que destruiu o prédio da Assembleia Legislativa do Acre, consumindo, também, uma pilha de documentos que jamais deveriam se perder, além de um acervo cultural incalculável, completou 30 anos neste sábado, 30 de abril. Nunca é bom esquecer que 17 dias depois o então governador Edmundo Pinto é assassinado em um hotel no Estado de São Paulo. Aquele sinistro ainda é o maior da história e só não teve desdobramentos ainda mais dramáticos, com perda de vidas, graças a atos de heroísmo de militares do Corpo de Bombeiros, com destaque para o então cabo Almeida,atualmente na reserva como tenente, e para um xapuriense que também acaba de ir para a reserva no posto de coronel, na época o soldado Carlos Batista da Costa, que havia apenas um ano ingressado na corporação. Sem nenhum recurso para enfrentar as chamas, pior era salvar três pessoas que fugiram para a cobertura do prédio, depois de perceberem que não havia mais como sair pelas escadas, a dos servidores daquele poder Franciberto Castro, Nazaré Jorge de Castro e Maria José Solon da Paz. O soldado Batista e o cabo Almeida decidiram arriscar tudo, inclusive a vida e escalaram o prédio em chamas com uma corda a reboque. Lá em cima a amarraram em uma viga de ferro e iniciaram a descida. No final salvaram-se todos. Batista ainda foi parar no hospital por enes motivos, sobretudo por um corte profundo de vidro no pé direito. Os dois foram condecorados pelo Estado pelo ato de bravura e seus nomes estão no panteão dos heróis do agrupamento para a posteridade. A reportagem do AcreNews encontrou o hoje coronel Batista para relembrar os 30 anos da tragédia e extrair dele o que se passou em três décadas. Se ainda há alguma forte lembrança e no que resultou para ele seu ato de bravura. Como de soldado ele acabou coronel – e comandante. Batista, humilde, abriu o coração e até se emocionou em alguns momentos. Contou das dificuldades da vida desde a infância, enfrentadas com determinação de vencedores.



Veja nossa conversa:


AcreNews – Onde o senhor nasceu e quem é sua família?


Coronel Batista – Sou natural de Xapuri. Me orgulho em ser xapuriense, terra de pessoas corajosas, dedicadas, que buscam vencer na vida e com suor no seu rosto da sua labuta diária.


AcreNews – Em que escolas o senhor estudou?


Coronel Batista – Eu estudei quase minha vida toda em escolas do bairro Estação Experimental, públicas, claro. Comecei pela escola Lídia Barbosa, depois Lourival Sombra, no conjunto Tangará e em seguida na Natalino da Silveira Brito. Depois estudei no antigo Cesemi, depois Cerb, e terminei meu ensino médio na Ética, ali no centro da cidade, ao lado da Secretaria da Fazenda.


AcreNews – O desejo de ser Bombeiro nasceu a partir de que momento na sua vida?


Coronel Batista – Após servir o Exército. Sai do Exército em 1988 e aí fui direto para a Ufac. Fiz o vestibular, passei e fui estudar. Eu me deslocava geralmente ali da Estação Experimental até a Ufac a pé para fazer faculdade. Não tinha dinheiro, né. Família muito humilde e andando lá pelo centro da cidade eu vi lá o concurso público para o Corpo de Bombeiros e isso no final de 1990 e eu fiz esse concurso, passei para soldado e iniciei o curso em dia 28 de fevereiro de 1991. No início eu queria um emprego, não um trabalho, que era para poder ter dinheiro para custear minha despesa com faculdade, mas principalmente para que eu deixasse de me deslocar a pé, até tivesse dinheiro para pagar o ônibus até a Ufac, mas após entrar na instituição, aprendi a amar essa instituição e também amar as atribuições e serviços que ela presta à sociedade acreana.



AcreNews – O senhor é um dos heróis no salvamento de pessoas naquele incêndio ao prédio da Assembleia Legislativa, em 1992. Ainda lembra de tudo, principalmente daquelas pessoas que foram salvas da morte ao serem resgatadas da cobertura?


Coronel Batista – O incêndio Assembleia Legislativa está marcado na minha história e logo após eu ter passado a pronto o soldado do Corpo de Bombeiros, precisamente dia 30 de abril de 1992, numa quinta-feira, período da tarde, aconteceu o incêndio e eu estava no quartel em um treinamento no curso de mergulho. A guarnição se deslocou para combater o incêndio e logo em seguida nos deslocamos para apoiar. Eu estava de educação física, camiseta e calção, e né desloquei para dar apoio as guarnições e por lá, após dar apoio as guarnições no combate ao incêndio, alguém falou que tinham três vítimas na parte superior do prédio e aquelas pessoas elas iam morrer. A gente percebeu que o incêndio estava se alastrando muito rapidamente e não tinha como elas descerem, mas uma voz interna ela disse: sobe e vai salvar. Esse ímpeto de ser Bombeiro, essa coisa do salvamento, a gente carrega, a gente aprende isso durante o curso e também para orientação para o pedido, porque alguém gritou lá: se não subirem essas pessoas vão morrer. Aí tem que aparecer alguém que tente a escalada. Nós sabíamos que era muito difícil a escalada. Era complicado, mas não tínhamos equipamentos adequados para a escalada. Mas nós somos Bombeiros, nós fazemos um juramento quando nós entramos, que precisamos atender as ocorrências mesmo com o sacrifício da própria vida. Nós sabemos que poderíamos ter perdido as nossas naquele salvamento, mas a vontade de ver o bem-estar do outro era maior. E aí o cabo Almeida e iniciamos a escalada inicialmente pela escada, depois a gente foi escalando pela parte externa do prédio, no braço mesmo, e conseguimos chegar até as três vítimas. E a fumaça se aproximava muito, a temperatura muito alta, aquele turbilhão de fumaça, as pessoas lá em cima desesperados e com muita técnica, muita determinação, nós conseguimos realizar o salvamento dessas três pessoas que hoje estão aí.



AcreNews – O senhor ainda mantém contato com aquelas pessoas que foram salvas ao longo desses 30 anos?


Coronel Batista – Sim, principalmente com familiares dessas três pessoas. A gratidão logo após o salvamento foi enorme por parte de todas elas e a gente ficou muito feliz. Nós, como Bombeiros Militares, a gente não faz as coisas pensando em retribuição e agradecimento, a gente faz porque é nosso dever, nossa obrigação como militar que somos, mas o reconhecimento dessas famílias foi muito grande, a vida toda e isso nos deixou ainda mais feliz para continuar na jornada que só estava iniciando como Bombeiro Militar, para nos fortalecer cada dia mais e se dedicar, se comprometer com aquilo que a gente escolheu como profissão, como trabalho.


AcreNews – Como estão atualmente aquelas três pessoas?


Coronel Batista – Algumas constituíram famílias, tem filhos, netos, enfim… Graças a Deus que o mais importante de todo aquele salvamento na Assembleia Legislativa foi o salvamento das pessoas. Sabemos que os danos ali foram enormes, sobretudo acervo patrimonial, histórico e cultural. Foi tudo destruído, mas ninguém morreu. As três pessoas poderiam ter perdido suas vidas e nós conseguimos salvar.



Coronel Batista – Em 1992 eu era soldado do Corpo de Bombeiros. Eu era, talvez, o único soldado que tinha nível superior. Então já estava me preparando para fazer curso de cabo, sargento, curso de oficial. Prestei o concurso público para oficial da Polícia Militar, também, ainda em 92/93, tanto Bombeiro como da Polícia Militar, aí passei no concurso público do Bombeiros em 1994. Aí fui fazer a academia de três anos em Brasília e conclui o curso superior de engenharia de incêndio e pânico, mas desde que eu entrei no Corpo de Bombeiro eu já tinha essa visão de que precisava crescer dentro da instituição, porque eu aprendi a amar o serviço do Corpo de Bombeiro e sempre tinha na cabeça ajudar no crescimento da instituição e para você ajudar você precisa crescer dentro dela. Aí foi isso que eu fiz, através de muito estudo, muitas noites em claro, estudando para prestar o concurso público, mas graças a Deus deu tudo certo.


AcreNews – A partir daquele ato de bravura as portas se abriram ainda mais para o senhor na vida e dentro da instituição?


Coronel Batista – Mudou muita coisa na minha vida. Eu era apenas um mais um bombeiro militar e a partir daquela ocorrência ficou marcado como um ato de bravura, um ato heroico, um feito extraordinário. Então fiquei marcado dentro da instituição, dentro da sociedade acreana, como aquele guerreiro Batista, por aquele ato de bravura, aquele que mesmo com sacrifício de perder a própria vida foi lá e realizou o salvamento daquelas pessoas, não medindo nenhum esforço para salvá-las. Então acho que ficou marcado, foi um divisor de águas a partir de então e me mostrou que eu estava na profissão certa, eu estava no local no trabalho certo e que era isso mesmo que eu queria fazer para o resto da minha vida, como fiz durante 31 anos.


AcreNews – O que mudou na sua vida depois daquela tragédia. Aliás, quando terminou a operação o senhor foi parar no hospital. O que aconteceu?


Coronel Batista – Eu já realizava dentro do Corpo de Bombeiro, antes dessa operação, a atividade de mergulho, que é uma atividade muito perigosa, mas aquele incêndio foi uma das maiores ocorrências que eu atendi durante toda a minha vida de Bombeiro Militar. Em 1992, ainda como soldado, foi o ano que o então governador Edmundo Pinto disse, logo após o salvamento, que ele ia nos promover – o cabo Almeida e eu – e isso nos deixou muito feliz, mas infelizmente algum tempo depois ele veio a morrer, mais mesmo assim fomos homenageados em frente a Assembleia, em frente ao Palácio Rio Branco, homenageados com o Mérito da Estrela do Acre, uma das maiores comendas do Estado, pelo ato heroico de salvar aquelas vidas. Durante a operação eu estava descalço, eu fiz o salvamento de calção e camiseta. Eu lembro que devido os estilhaços das vidraças da Assembleia eu cortei meu pé, mas eu nem senti, só percebi quando alguém mostrou que eu estava com o pé sangrando e depois eu fui ver que estava cheio de caco de vidro debaixo dos pés e comecei a sentir, até que conseguiram me levar para o Pronto Socorro e fazer curativos.


AcreNews – O que o senhor aprendeu naquela operação de incêndio. Qual lição foi maior?


Coronel Batista – Acredito que a grande lição que eu aprendi, que foi fortalecido na minha vida, porque a minha família, meus pais, nossos avós, sempre me ensinaram muito que servir às pessoas, que fazer o bem, que se dedicar as pessoas, isso vale a pena. Tudo o que você faz de bom ou de ruim ele volta para você. É a lei da semeadura e eu entendi que eu busquei fazer o melhor. E fiz o tempo que eu fiquei no Corpo de Bombeiros. Eu me dediquei como nunca, mas graças a Deus eu tive uma vida muito boa dentro da instituição, eu tive oportunidades únicas de comandar e de participar de determinadas ações. Como disse: fiz muitos mergulhos, atendi muitas ocorrências, mas, assim, me destaquei no incêndio da Assembleia Legislativa e estar aqui em outras ocorrências. Tive a oportunidade de passar 62 dias quando Acre ficou isolado devido a cheia do Rio Madeira, lá em Porto Velho e esses 62 dias foi de muita dedicação, tentando passar alimentos para o Acre com mais 20 Bombeiros numa operação que era um cenário de guerra, que você tinha que ter muita capacidade e muita sabedoria para lidar com tudo que estava acontecendo, que eram muitas variáveis, caminhoneiros com seus familiares presos em determinados locais na estrada e você tinha que ter desenvoltura para resolver todos os tipos de problema. Então foi uma experiência única também na minha vida. Tive várias outras ações como coordenador Estadual de Defesa Civil. Passei onze dias coordenando a operação da maior cheia do Rio Acre lá em Brasileia, onde 70% da cidade ficou debaixo d’água. Também participei da operação da maior alegação ali de Cruzeiro do Sul e tudo isso vai dar uma bagagem. Como comandante geral tive a oportunidade de participar de vários eixos dentro daquilo que é atribuição também no Corpo de Bombeiros, como meio ambiente, saúde, educação, fora segurança pública, que é o papel do Corpo de Bombeiros. Então isso me deu uma bagagem muito grande, muito conhecimento para poder lidar com outros problemas da vida. Então sou um homem realizado de todas as formas e eu agradeço muito mesmo a Deus e a instituição Corpo de Bombeiros Militar.


AcreNews – O que o senhor diria a quem sonha ser Bombeiros, a instituição de maior credibilidade diante da sociedade?



Coronel Batista – Eu diria aquele que pretende ter uma profissão reconhecida nacionalmente, como os Bombeiros, que nos últimos 15 anos é reconhecida como a instituição de maior credibilidade no Brasil, aquele que quer pertencer a uma instituição que busca sempre assistir as pessoas com qualidade, com muita dedicação, se você quer uma instituição, um trabalho que pode salvar vidas, venha fazer parte da família Bombeiro Militar, que tem como lema ‘vidas alheias e riquezas a salvar’. E eu, durante 31 anos de corporação, posso dizer que deixei um legado, assim como todos deixam, né? Sou uma pessoa realmente realizada dentro da instituição Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Acre. Portanto, ser bombeiros, é isso. É ajudar as pessoas, é ter uma causa de vida no sentido de ajudar as pessoas.


 


Por AcreNews


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