O governo Jair Bolsonaro (PL) e a cúpula do Congresso preparam uma nova ofensiva para reduzir os reajustes na conta de luz e os preços de combustíveis a menos de cinco meses das eleições.
Articuladores do acordo estimam que o pacote de medidas pode causar uma redução aproximada de 20% nas contas de luz e praticamente neutralizar os reajustes previstos para este ano alguns superiores a 20%.
As negociações são intensificadas no momento em que a desvantagem de Bolsonaro se amplia nas pesquisas em relação a Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Novo levantamento do Datafolha mostra o ex-presidente com 54% dos votos válidos, o suficiente para que ele fosse vitorioso no 1º turno se a eleição fosse hoje.
Parlamentares aliados ao governo estão empenhados nas articulações porque buscam a reeleição para seus respectivos cargos neste ano e estão preocupados com o tamanho dos aumentos nas tarifas de energia, item que sobrecarrega o bolso sobretudo de consumidores de baixa renda.
GOVERNO PRESSIONA ANEEL PARA ANTECIPAR RECURSOS QUE SUBSIDIAM CONTA DE LUZ
A lista de propostas inclui medidas para injetar recursos na CDE (Conta de Desenvolvimento Energético), que banca subsídios e descontos nas contas de luz.
Em uma das frentes, governo e Congresso pressionam a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) a incluir no orçamento da CDE uma receita de R$ 5 bilhões que virá da capitalização da Eletrobras.
A verba pode proporcionar uma redução de 2,3% nas tarifas, mas não foi prevista pela agência reguladora devido às incertezas que cercavam o processo de privatização da companhia que ainda precisava passar pelo crivo do TCU (Tribunal de Contas da União).
Com a aprovação final do modelo pela corte de contas, o que inclui a destinação de R$ 5 bilhões à CDE ainda neste ano, há uma articulação nos bastidores para que a agência contabilize logo o recurso. Isso permitiria uma revisão tarifária extraordinária a todos os consumidores.
O MME (Ministério de Minas e Energia) enviou em 23 de maio um ofício à Aneel informando que o aporte na CDE deve ser feito até o fim de julho. Na prática, segundo fontes do governo, o documento serve para que a agência reguladora acelere os trâmites e conceda logo o desconto na tarifa.
Em uma primeira sinalização, a Aneel prorrogou por 15 dias as tarifas praticadas atualmente pela Cemig, que atende a 8,8 milhões de unidades consumidoras em Minas Gerais. “Concordamos em prorrogar o reajuste tarifário de forma que os R$ 5 bilhões que estão assegurados com o processo de capitalização [da Eletrobras] já tragam atenuação tarifária não apenas para os consumidores de Minas Gerais, mas também de outras unidades da federação”, disse o relator do processo, Sandoval Feitosa, diretor da Aneel.
GOVERNO E CONGRESSO ARTICULAM ANTECIPAR RENOVAÇÃO DE CONCESSÕES
De olho no médio a longo prazo, governo e Congresso também querem incluir no projeto de lei 414/2021, que trata do novo marco legal do setor elétrico, uma autorização para a renovação antecipada de contratos de concessão de um conjunto de hidrelétricas da União não operadas pela Eletrobras.
A repactuação desses contratos geraria novo pagamento de outorga valor repassado pelas empresas ao Estado em troca do direito de explorar determinado ativo público.
Em geral, os valores de outorga são destinados ao caixa da União. Mas a ideia do governo é abrir mão de parte dos recursos, que seriam usados para abater tarifas de energia.
Integrantes do governo ouvidos pela reportagem citam uma fatia de 50% para a CDE, o que resultaria em uma injeção de até R$ 10 bilhões na conta que banca os descontos na energia. A redução média nas tarifas é estimada em 5%.
A proposta já foi discutida pelo Ministério da Economia, pelo novo ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, e por integrantes do Congresso. No entanto, essa é uma medida mais de médio prazo: seu processamento se daria cerca de 210 dias após a sanção do texto.
Outro problema é que uma ala de deputados quer incluir no texto o Brasduto, fundo para subsidiar a expansão de uma rede de gasodutos para atender usinas termelétricas. O governo resiste, devido ao custo bilionário, mas parlamentares dizem que vão travar a votação do texto caso isso não seja incluído.
Há ainda negociações para proibir a cobrança de ICMS sobre o valor das bandeiras tarifárias, adicional que eleva a conta de luz em momentos de maior custo de geração de energia (quando há escassez em reservatórios, por exemplo).
DEVOLUÇÃO DE CRÉDITOS A CONSUMIDORES DE ELETRICIDADE GERA DISPUTA COM DISTRIBUIDORAS
O governo e o Congresso também articulam a votação de um projeto de lei que devolve aos consumidores uma fatura de R$ 60 bilhões em créditos de PIS/Cofins, constituídos após o STF (Supremo Tribunal Federal) determinar a retirada do ICMS da base de cálculo do tributo federal.
Segundo estimativas do governo, a medida pode, sozinha, gerar uma redução média de 5,2% nas tarifas.
Como mostrou o jornal Folha de S.Paulo, esse benefício hoje é disputado pelas distribuidoras, que querem se apropriar de uma parcela desses créditos tributários.
Em 2017, a corte decidiu que a cobrança de PIS/Cofins sobre o imposto estadual estava errada, e a União teve que ressarcir empresas em dezenas de bilhões. No caso da energia, no entanto, o tributo sempre recaiu sobre o consumidor, por meio das tarifas.
Com base nesse argumento, o projeto determina a destinação integral dos valores restituídos para o abatimento da conta de luz dos usuários.
A expectativa é que o texto resulte em uma absorção imediata desse benefício. A medida, no entanto, deve enfrentar resistência das distribuidoras, que não só querem ficar com uma parte dos recursos, mas também podem enfrentar dificuldades de caixa se todos os créditos virarem desconto de uma vez.
A discussão da votação desses projetos vem na esteira da aprovação, pela Câmara, de um teto de cobrança de ICMS sobre a energia. A proposta ainda precisa do aval do Senado, mas teria o efeito de reduzir as tarifas em 6,6%, segundo estimativas internas do governo.
SUBSÍDIO A CAMINHONEIROS É PROPOSTA PARA COMPENSAR ALTA NO PREÇO DOS COMBUSTÍVEIS
Em outra frente, o governo também quer atacar a alta no preço dos combustíveis, que continua sendo um empecilho às pretensões eleitorais de Bolsonaro.
Por isso, o Ministério da Economia e a cúpula da Câmara discutem a criação de um subsídio para caminhoneiros, que pode ocorrer por meio da entrega de um vale para integrantes da categoria.
Outra ideia, defendida pelo novo indicado à presidência da Petrobras, Caio Mario Paes de Andrade, é dar transparência e publicidade ao cálculo da estatal que define o preço dos combustíveis.
A proposta é aprovar um projeto de autoria do líder do PT, Reginaldo Lopes (MG), que torna obrigatória a divulgação dos preços e custos da estatal na venda de derivados de petróleo. A oposição pediu a votação do texto como contrapartida à aprovação do projeto que fixou um teto para o ICMS sobre combustíveis.
“É obrigatória a divulgação dos valores referentes aos componentes que influenciem os preços dos derivados de petróleo vendidos no país pela Petrobras”, diz o projeto de Lopes.
A avaliação de governistas é que dar transparência à conta da estatal pode servir de munição a Bolsonaro em seus discursos. A aposta desses aliados é que ficará claro que a empresa cobra preços exagerados e se beneficia da conta.
MEDIDAS PARA ENERGIA E COMBUSTÍVEIS
Aporte de R$ 5 bilhões da privatização da Eletrobras na CDE (Conta de Desenvolvimento Energético): redução de 2,3% na conta de luz
Projeto que prevê devolução integral de créditos de PIS/Cofins para consumidores: redução de 5,2% na conta de luz
Renovação antecipada de concessões de usinas não operadas pela Eletrobras: aporte de mais R$ 10 bilhões na CDE, com redução de 5% na conta de luz
Projeto que institui um teto para a cobrança de ICMS sobre energia: redução de 6,6% na conta de luz
Proibição de cobrança de ICMS sobre adicional de custo provocado por bandeiras tarifárias de energia: impacto não estimado
Vale para caminhoneiros e motoristas de táxi e aplicativos: custo estimado de R$ 1,5 bilhão para a União
Divulgação da composição dos preços de combustíveis praticados pela Petrobras: sem impacto significativo sobre preços, mas pode ampliar transparência