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Finlândia pede para entrar na Otan, e Rússia ameaça com retaliação

Foto: reprodução

Em uma decisão histórica, o governo da Finlândia anunciou nesta quinta-feira (12) que vai pedir “sem demora” a entrada do país nórdico na Otan, a aliança militar de 30 membros liderada pelos Estados Unidos. A Rússia, cuja invasão da Ucrânia motivou a iniciativa, prometeu retaliação contra o vizinho.


Os finlandeses mantinham neutralidade militar desde o fim da Segunda Guerra, em um acerto tácito com a então União Soviética para evitar um novo conflito como os que os países travaram no embate global.


Eles deverão ser seguidos pela Suécia, encerrando mais de 200 anos de neutralidade do vizinho. O Parlamento em Estocolmo deverá dar seu parecer sobre o tema nesta sexta (13). Ambos os países mudaram de opinião e buscaram o guarda-chuva militar dos EUA por temer a agressividade russa.


“A Finlândia deve se candidatar à adesão à Otan sem demora. Nós esperamos que os passos nacionais ainda necessários para tomar a decisão sejam tomados rapidamente nos próximos dias”, disseram em declaração o presidente Sauli Niinistö e a primeira-ministra Sanna Marin.


O pedido deverá ser analisado pelo Parlamento local, que já tem maioria para concretizar o movimento, após a opinião pública do país virar em favor da participação. O secretário-geral da Otan, o norueguês Jens Stoltenberg, afirmou que o processo será “rápido e suave” e que Helsinque será “muito bem-vinda”. A aliança iniciou um grande exercício com 10 mil soldados em cinco países-membros nesta quinta.


Previsivelmente, integrantes da aliança divulgaram congratulações pela medida, que mudará a arquitetura de segurança do norte da Europa, certamente um efeito colateral que Moscou não esperava quando invadiu a Ucrânia alegando entre outras coisas a necessidade de impedir a adesão de Kiev à mesma Otan.


Na quarta, Niinistö se encontrou com o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, e disse: “Se for o caso de aderirmos, bom, minha resposta [para Vladimir Putin] seria que você causou isso, olhe no espelho”.


O mau humor russo no episódio já havia ficado claro com ameaças anteriores de colocação de armas nucleares próximas às fronteiras finlandesas e suecas e explodiu nesta quinta nas palavras do porta-voz Dmitri Peskov. “A expansão da Otan não faz nosso continente mais estável e seguro”, afirmou ele, acrescentando que a Rússia “definitivamente vê como uma ameaça à sua segurança nacional” a adesão finlandesa. “A Otan está vindo em nossa direção. Tudo vai depender de como essa expansão ocorrerá, qual infraestrutura militar será movida para as nossas fronteiras”, completou.


Aceita na aliança, como será, a Finlândia será o país da Otan com a maior fronteira compartilhada com a Rússia: 1.300 km. A Ucrânia tem 2.300 km, parte deles violados por Putin no dia 24 de fevereiro, na maior ação militar na Europa desde o fim da Segunda Guerra Mundial.


Peskov foi cauteloso ao não repetir a ameaça direta de uma guerra, como a Rússia fez com a Ucrânia, pois sabe que a situação finlandesa é um fato consumado, que rompe dois tratados (1947 e 1992) entre Moscou e Helsinque. Mais: a Otan deverá estender alguma garantia de segurança durante o processo de adesão, embora isso não esteja claro. Uma vez no grupo, ataque a um membro significa agressão a todos.


Mas o porta-voz voltou a dizer que a Rússia “está preparada para dar a resposta mais incisiva a quem tentar entrar na operação militar na Ucrânia”. O Ocidente tem apoiado Kiev com armas, dinheiro e inteligência, mas não enviou soldados. “Todos, incluindo a Rússia, querem evitar um confronto direto entre Rússia e Otan”, disse —uma obviedade, dado que ambos os lados têm armas nucleares.


Segundo a imprensa finlandesa, o governo local crê que os russos poderão cortar o fornecimento de gás natural para o país, embora não o tenham feito com outros Estados integrantes da aliança militar.


A neutralidade nórdica sempre teve tudo a ver com a Rússia. A Suécia era um reino expansionista e invadiu o grande vizinho no século 18, mas em 1809 decidiu se isolar após perder a Finlândia para o Império Russo. Nas duas guerras que lutou contra os russos entre 1939 e 1944, a Finlândia conseguiu evitar a anexação pelos soviéticos, mas perdeu 10% de seu território. Esse trauma levou o país a adotar uma política estrita de não alinhamento, semelhante àquela do vizinho mais de um século antes.


Na prática, contudo, a neutralidade era parcial, em especial no caso sueco. Ambos os países são membros da União Europeia desde 1994, o que lhes dá acesso a uma cláusula de defesa mútua nos padrões da Otan, embora seja pouco conhecida e ninguém saiba como seria acionada.


A Suécia, em especial, também tem uma postura militar incisiva e alinhada com o Ocidente. Com uma indústria de defesa sofisticada, produzindo boa parte das armas antitanque leves usadas contra Moscou pela Ucrânia, submarinos e caças como o Saab Gripen vendido ao Brasil, Estocolmo opera em sintonia com a aliança militar no ambiente do pós-Guerra Fria, participando de diversos exercícios conjuntos.


Nos últimos anos, aumentou seu gasto militar e acionou diversas vezes o estado de alerta devido à turbulência envolvendo a Rússia, como os protestos reprimidos na ditadura aliada do Kremlin da Belarus. Intrusões de aviões russos nas franjas de seu espaço aéreo são comuns, e duas já ocorreram depois do início da guerra, para protestos dos suecos. No país, pesquisa feita pelo jornal Aftonbladet nesta semana mostrou apoio de 61% da população à entrada na Otan, ante históricos 20%. O partido que domina a vida política local, o Social Democrata, está acabando também a revisão de sua política de neutralidade.


Depois da remilitarização da Alemanha, anunciada pelo primeiro-ministro Olaf Scholz na forma de um reforço que triplicará o orçamento de defesa do país neste ano, a entrada dos nórdicos na Otan é o maior efeito colateral da invasão russa para a segurança do continente.


Ela está sendo celebrada principalmente por Polônia e os três Estados Bálticos, que se veem ameaçados pela Rússia. “A principal adição aos nossos planos de defesa é nas áreas marítima e aeroespacial. Nosso tempo de reação será reduzido”, disse o chefe das Forças Armadas estonianas, Enno Mot.


O movimento deixará assim a Suíça como a fortaleza de neutralidade no continente. Antes, Genebra e Helsinque dividiam o holofote para encontros de cúpula da Rússia com países ocidentais, como na reunião entre Putin e Donald Trump em 2018, realizada na capital finlandesa, ou na do russo com Joe Biden, sediada na cidade suíça no ano passado.


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