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Guerra a negacionistas agita corrida eleitoral na França

Foto: Sebastien Salom-Gomis/AFP

A 94 dias das eleições francesas, uma declaração do presidente Emmanuel Macron considerada inapropriada serviu de munição para os candidatos da oposição. Em entrevista ao jornal Le Parisien, o virtual postulante à reeleição admitiu o desejo de “encher o saco” dos franceses que não se vacinaram contra a covid-19. “Para os não vacinados, quero muito irritá-los. E vamos continuar fazendo isso, até o fim. Essa é a estratégia”, disse o chefe de Estado liberal, que empregou um termo ofensivo em francês. Macron usou o verbo emmerder — literalmente jogar m… em alguém. A retórica incomum do titular do Palácio do Eliseu chocou personalidades dos dois extremos da política da França e fomentou a imagem de arrogante de Macron.


Valérie Pécresse, candidata do partido de direita Os Republicanos e principal adversária política de Macron, acusou uma tentativa do presidente de dividir o país. “Não cabe ao presidente da República escolher entre os bons e os maus franceses”, comentou. O mesmo raciocínio foi adotado por Marine Le Pen, da Frente Nacional (extrema-direita). “O objetivo de Macron é colocar os franceses uns contra os outros, tornando os não vacinados bodes expiatórios, com propósito estritamente eleitoral”, escreveu em seu perfil no Twitter.


Também candidato da extrema direita, Éric Zemmour ressaltou que, por cinco anos, Macron recusou-se a “irritar a escória, as gangues, os aprendizes jihadistas, os imigrantes ilegais, os antifascistas e os ideólogos que fazem lavagem cerebral com nossos filhos”. “Covarde com os fortes, cruel com os fracos”, ironizou.


Passaporte

A controvérsia em torno das declarações de Macron forçou a suspensão dos debates, na Assembleia Nacional (Parlamento), sobre a adoção de um passaporte de vacinação. O Palácio do Eliseu tem pressa em colocar a medida restritiva em vigor. Ontem, a França registrou novo recorde de infecções pela covid-19 em 24 horas: 335 mil casos, número impulsionado pela cepa ômicron. Na entrevista ao Le Parisien, Macron destacou que mais de 90% da população se vacinou, mas que ainda existe uma minoria contra a imunização. “Como reduzimos essa minoria? Reduzimos, desculpe dizê-lo, incomodando ainda mais.”


Cientista político da Fundação Jean Jaurès (em Paris) e analista associado do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (Iris), Jean-Yves Camus elogiou a jogada política de Macron. “Foi uma manobra muito engenhosa, não obstante o fato de suas palavras serem vistas como inadequadas para um presidente”, afirmou ao Correio. “A maioria dos cidadãos franceses está farta com uma situação que torna os 73% de totalmente imunizados reféns de uma minoria que se recusa a receber suas doses. Macron acha que a maioria daqueles que se vacinaram vai agradecer-lhe por ser tão franco nas palavras. Ele provavelmente está correto. No entanto, tornar a vacinação compulsória teria sido mais inteligente.”


Nathan Peiffer-Smadja, chefe de Infectologia Clínica do Hospital Bichat (em Paris), disse à reportagem que Macron “perdeu o ponto”. “O que nós queremos é que as pessoas não vacinadas façam a escolha correta por sua saúde, pois têm alto risco de condições graves da covid-19, e pela saúde pública. Os não vacinados são a grande maioria dos pacientes hospitalizados com covid. Os leitos que eles ocupam seriam extremamente necessários para outros pacientes”, explicou. De acordo com ele, quanto menor o número de não vacinados, maior a quantidade de leitos nos hospitais.


“As vacinas são menos eficazes para prevenir a transmissão do Sars-CoV-2, mas a terceira dose em três meses diminui o risco de contágio em 50%”, observou Nathan. O médico teme que a declaração de Macron tenha efeito contraproducente. “Algumas pessoas poderiam pensar ‘Ah, ele quer nos irritar, então vamos irritá-lo, não vacinando’. Isso cria um tipo de conflito entre o presidente, os não imunizados e as vacinas que não fazem parte da política”, advertiu.


Fonte: Correio Braziliense


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