Estudo feito pelo Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos (IEEE), maior organização profissional técnica do mundo dedicada ao avanço da tecnologia para a humanidade, mostrou que 95% dos especialistas acreditam que a Inteligência Artificial (IA) será a tecnologia mais relevante para a inovação nas indústrias nos próximos cinco anos.
A pesquisa foi realizada em outubro de 2021 e abarcou diretores de tecnologia, de informação e de Tecnologia da Informação (TI) de Estados Unidos, Reino Unido, China, Índia e Brasil. Um em cada cinco especialistas (21%) aponta a IA e a Machine Learning (Aprendizado de Máquina) como os principais destaques da área para 2022. Computação na nuvem (20%) e banda 5G (17%) também foram citadas.
Na opinião dos brasileiros, o setor financeiro deve ser o mais beneficiado e, para 64% deles, o crescimento tecnológico será incontrolável nos anos subsequentes. Quase metade dos entrevistados no país também declara acreditar que, nos próximos 10 anos, 50% ou mais do que é feito por humanos será aprimorado por robôs.
Para Filipe Tôrres, membro do IEEE e especialista em engenharia de sistemas eletrônicos e automação da Universidade de Brasília (UnB), a Inteligência Artificial é a mais promissora das tecnologias atualmente, já que é considerada nova e com muito a ser descoberto. Segundo ele, as principais aplicações da técnica ficam nas áreas de saúde e educação, mas podem ser expandidas para qualquer setor.
Como essas novas tecnologias devem impactar a vida cotidiana da população daqui para frente?
A Inteligência Artificial e o Aprendizado de Máquina podem causar impacto em diversos setores: saúde, transporte, bancos. Definitivamente, são as áreas que estão mais em alta no momento. No Brasil, vejo muito a aplicação de IA na saúde e na educação, principalmente — visto nossas demandas públicas. Devem impactar diretamente na parte de treinamentos, predições, tomadas de decisão, classificações, perguntas e respostas, virtualização, e assim por diante.
Haverá prejuízo para quem trabalha, atualmente, nessas áreas?
A IA pode ser aplicada em qualquer setor, e tem o impacto muito forte de deixar as coisas mais simples. A técnica não vem para anular ou tirar algo, nem para tirar alguma profissão que exista. Ela vem para agregar, para aprimorar as técnicas já conhecidas, juntando o tradicional com o novo. Eu vejo como o grande ganho, de fato, a IA sendo utilizada para a gente economizar tempo e dinheiro. As coisas ficam mais eficientes e precisas. São algoritmos bem treinados e automatizados para tornar os processos mais eficientes em qualidade e trazendo essa economia de tempo e dinheiro.
O avanço dessas tecnologias no Brasil deve melhorar a acessibilidade do mercado?
Com certeza, porque tornando as coisas mais eficientes e precisas, com menos tempo e menos dinheiro, você tem ganhos nos negócios, que acabam se desenvolvendo com maior facilidade. Com isso, eles alcançam mais pessoas. Também tem a questão de que, quando você diminui custos na indústria, no comércio, no varejo, consegue ter uma redução de preços que proporciona maior acesso para as pessoas. A IA pode melhorar ainda a linguagem e a comunicação em geral, pode ter sistemas de treinamento automatizados, transmissão simultânea, que podem ajudar, principalmente na educação, e acredito que ajudando na educação da população, o acesso também melhora.
Em relação ao uso da IA na educação: isso deve chegar a todo mundo mesmo, ou apenas a uma parcela específica dos alunos, de escolas particulares, por exemplo?
Acho que deve alcançar todo mundo, sim. Essas tecnologias são muito rápidas. A Inteligência Artificial já é realidade, já está inserida nas coisas. É uma coisa nova, mas que já está sendo empregada e utilizada. Acho que, para o ano que vem mesmo, muitos já deverão ter acesso a isso. Querendo ou não, já participamos de muita coisa que envolve Inteligência Artificial, mesmo sem saber: desde a propaganda automatizada do Instagram até outras aplicações maiores, ela já está no cotidiano.
A pandemia da covid-19 acelerou o processo de avanço dessas tecnologias?
Com certeza. Como toda crise, a pandemia trouxe uma necessidade de avançar em certas áreas, e acho que esses avanços que vieram para a saúde, e a questão de a gente ter tido que ficar em casa, do on-line, trouxe também esse senso de necessidade: a gente realmente precisa de tecnologia.
Falta muito para que o Brasil tenha um nível bom de uso dessas tecnologias ou já temos um cenário razoável nesse sentido?
Com relação estritamente à Inteligência Artificial, não vejo o Brasil tão atrás, porque, atualmente, as tecnologias são muito atreladas. Hoje, o mundo é muito globalizado e as coisas acabam chegando muito rápido. Então, quem é da área acaba tendo praticamente o mesmo acesso às tecnologias que são desenvolvidas em outras partes do mundo. Dentro do mundo científico, do mundo acadêmico, a gente está muito bem. Temos boas ideias e bons projetos. No mundo prático, de investimentos e de utilização, poderia ser melhor, com certeza. Isso porque a gente não tem grandes empresas como têm, por exemplo, os Estados Unidos. Empresas como Meta (antigo Facebook), Microsoft, Apple, a gente não tem, por isso tem um pouco menos de investimento. Mas não vejo a gente tão atrás com relação à tecnologia em si.
A aplicação dessas tecnologias no setor financeiro deve trazer benefícios à população a curto prazo?
A Inteligência Artificial em si no mercado financeiro não é muito concreta, porque o setor não é exato, ele é emocional, manipulado: nele, quem compra e quem vende são pessoas. A IA ainda não tem todo esse manejo para emoções. Agora, na questão de blockchain, Internet das Coisas (IoT), 5G e outras tecnologias que andam juntas, aí sim vejo boas aplicações para o setor financeiro. Por exemplo, a questão das finanças descentralizadas, do dinheiro digital: a gente faz Pix, usa criptomoedas, várias e diversas formas em que a gente não vê mais o dinheiro, ele é manipulado por tecnologia. Cada vez menos a gente vai ver dinheiro. Em um momento a gente usou o cheque, depois o cartão de crédito, agora, transferência via Pix e, daqui a pouco, vai ser QR code e pronto, vai evoluindo.
Há uma esperança de que o 5G vá alcançar mais pessoas e setores. Isso também deve ajudar na disseminação das demais tecnologias?
Com certeza. Antigamente, a gente mal usava o celular, depois teve o SMS, depois o 2G, o 3G — a gente tinha uma comunicação bem lentinha, mas já adorava o 3G. O 4G a gente acha legal, mas, conforme as tecnologias vão avançando e os dados vão ficando maiores, as necessidades vão aumentando e a gente tem que criar novas tecnologias para mais capacidade e acessibilidade. Hoje, você vê que quase todo mundo tem um celular com 3G ou 4G, e, no futuro, todo mundo vai ter um 5G, e, depois, outras tecnologias.
Mas o acesso vai ser para todos?
Tem um exemplo simples: eu estava dando aula no IFB Ceilândia até pouco tempo atrás, no período da pandemia. Estava meio receoso, porque são alunos de baixa renda. Fiquei pensando ‘como vai ser para esses alunos que não têm acesso?’, e uma notícia boa é que a maioria já tinha, pelo menos, um celular para assistir às aulas e conseguia acompanhar. Eram poucos os que não tinham nenhum acesso, e nós estamos falando de uma parcela da população que lá era precária, sim. Conseguimos, e acho que o 5G vai ser excelente para melhorarmos isso ainda mais.
Fonte: Correio Braziliense