A 1ª Vara do Tribunal do Júri de Rio Branco considerou que o servente de pedreiro Cristiano Lima Arsênio, acusado de matar o filho de 5 anos com um corte no pescoço, em agosto de 2020, é incapaz de responder por seus atos e o absolveu do crime. A Justiça determinou que Arsênio cumpra uma medida de segurança na ala médica da Unidade de Recuperação Social do Complexo Prisional de Rio Branco.
A decisão é da juíza titular da 1ª Vara do Tribunal do Júri, Luana Campos. A sentença da magistrada foi baseada em um laudo pericial que concluiu que no momento do crime o servente era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do ato. Entre os transtornos mentais apontados pela perícia está a esquizofrenia.
“Se chama de absolvição imprópria, aplicando uma medida de segurança. Então, na verdade, ele vai cumprir uma medida de segurança consistente em internação. Como no Acre não existe hospital de custódia, ele fica na ala de saúde mental do complexo”, explicou a juíza Luana Campos.
Conforme a magistrada, Arsênio será reavaliado daqui a um ano para saber se ainda se aplica a medida de segurança. Durante esse tempo, o servente será tratado e medicado e, posteriormente, submetido a um novo exame pericial.
“Ele cometeu o crime, mas não pode ser punido porque é um inimputável, já que tem essa doença que foi detectada no laudo. Dei algumas determinações, mas a Vara de Execuções Penais pode alterar conforme a necessidade da pessoa que será submetida a medida. Vai depender da avaliação dele”, pontuou.
O crime ocorreu na madrugada do dia 13 de agosto do ano passado na casa da família no bairro Bahia Nova, na capital acreana. A mãe só percebeu que o filho estava morto pela manhã, quando foi no quarto das crianças
Laudo constata transtorno psicótico
Um laudo apontou que o pai possuía doença mental quando cometeu o crime. O exame de insanidade mental havia sido feito em dezembro de 2020 por determinação judicial a pedido da defesa do réu e o resultado foi anexado ao processo em junho deste ano.
O laudo constatou que, na época do crime, Arsênio apresentava transtorno psicótico causado do consumo de drogas.
“Conclui-se que, ao tempo da ação, o periciado apresentava incapacidade completa de entendimento e autodeterminação. Considerado inimputável pelo crime praticado. Necessita de acompanhamento psiquiátrico e psicológico em regime ambulatorial”, pontua o laudo.
Pontos respondidos no laudo
No laudo, o perito médico respondeu a algumas perguntas feitas pelo Ministério Público do estado a respeito da sanidade mental do réu. Veja:
- Cristiano Lima Arsênio, ao tempo da ação, era portador de doença mental, desenvolvimento mental incompleto ou desenvolvimento mental retardado?
- Sim. Portador de doença mental.
- Em caso positivo, qual a doença ou anomalia psíquica?
- Ao tempo da ação apresentava transtorno psicótico decorrente do consumo de múltiplas substâncias.
- Em razão da doença/anomalia psíquica, Cristiano Lima Arsênio era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato (homicídio praticado por arma branca) ou de determinar-se de acordo com esse entendimento?
- Sim. Inteiramente incapaz de entender e de determinar-se.
- O periciando possui periculosidade criminal ou social? Em que nível ou grau?
- Possui atualmente baixa periculosidade e risco futuro de violência elevado.
Na época do pedido para que o réu passasse por exame psiquiátrico, a defesa dele apresentou à Justiça prontuários emitidos pelo Hospital de Urgência e Emergência de Rio Branco (Huerb) que comprovam que o acusado chegou a ser internado, em janeiro de 2019, após um surto psicótico.
No dia 22 de outubro deste ano, o servente participou da primeira audiência de instrução. A audiência foi marcada por comoção e, chorando, Arsênio demonstrou arrependimento e relatou ter ouvido vozes no dia do crime.
A mãe da criança, que também foi ouvida na audiência, contou que ele sempre foi um bom pai e que cuidava do filho.
Denúncia
Arsênio foi denunciado pelo Ministério Público do Acre (MP-AC) pelo crime de homicídio com as qualificadoras de futilidade, meio cruel, recurso que dificultou a defesa da vítima e ainda destituição do poder familiar. A Justiça aceitou a denúncia e ele virou réu no processo.
O acusado foi preso em flagrante no mesmo dia do crime. Ele ainda tentou fugir, mas foi contido, preso e levado para a Delegacia de Flagrantes (Defla) por policiais civis da 1ª Regional da capital. Ele chegou rindo à delegacia.
Logo após o pedido para que a prisão em flagrante fosse convertida em prisão preventiva, a Defensoria Pública do Estado (DPE), que fez a defesa inicial do acusado, chegou a pedir a liberdade provisória dele, já que ele era réu primário.
Além disso, alegou que ele vinha enfrentando problemas de dependência química, e que vinha sofrendo perturbações mentais em razão de crises de abstinência.
Pai falou que teve surto pela abstinência de drogas, pegou uma faca na cozinha e foi até o quarto dos filhos — Foto: Arquivo
Bebê dormia ao lado do irmão
Além do menino de 5 anos, o outro filho do casal, um bebê de 5 meses, dormia no berço ao lado do irmão.
Em depoimento na delegacia, o servente de pedreiro falou que teve um surto pela abstinência de drogas, foi na cozinha pegar uma faca e seguiu para o quarto dos filhos.
Após degolar o filho mais velho, o suspeito voltou para a cama, deitou ao lado da mulher e dormiu até de manhã, segundo informou o delegado responsável pelo caso, Frederico Tostes, na época.
Sem arrependimentos, segundo polícia
Na época das investigações, além do acusado, a polícia ouviu também a mãe das crianças e um pastor, para quem Arsênio estava trabalhando. No depoimento, o suspeito não demonstrou arrependimento, segundo a polícia.
“Falou que há três semanas deixou de usar drogas, na abstinência teve uma perturbação mental e fez isso. Não ficou muito claro no depoimento, não falou muito. Disse que de madrugada pegou a faca e cortou o pescoço da criança. Perguntei se ele se arrependeu e disse: ‘não é tão simples assim’. Não quis falar que estava arrependido. Sem arrependimentos”, explicou o delegado.
O suspeito teria ainda ligado para o pastor, mas não falou nada e desligou o telefone.
A mulher afirmou à polícia que o marido sempre foi cuidadoso com os filhos e nunca agrediu eles. Ainda segundo o delegado informou na época, a mulher contou que estava dormindo e não ouviu nada. Quando acordou pela manhã foi que viu a criança já sem vida.