Governo vende apenas 5 de 92 blocos no pior leilão de petróleo desde 1999

Para a ex-diretora-geral da ANP, Magda Chambriard, o cardápio oferecido pelo governo demandaria elevado apetite por risco, já que a maior parte dos blocos estão em bacias ainda desconhecidas ou muito distantes do continente, o que cria desafios logísticos na exploração.

RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – No pior leilão desde a abertura do setor de petróleo no país, o governo concedeu apenas 5 das 92 áreas para exploração e produção oferecidas ao mercado nesta quinta-feira (7). A competição teve o menor número de participantes e a menor arrecadação entre as 17 rodadas de licitação desse tipo, iniciadas em 1999.


 O leilão fracassou também em tentar atrair petroleiras para o litoral do Rio Grande do Norte, após embates com ambientalistas pela proximidade com áreas sensíveis para a biodiversidade, como os arquipélagos de Fernando de Noronha e Atol das Rocas.

Para especialistas, o resultado fraco reflete um menor apetite pelo risco no setor de petróleo, que vem mirando cada vez mais as energias renováveis e ainda não deu conta de explorar as áreas petrolíferas arrematadas em leilões recentes no Brasil.
Apenas duas empresas apresentaram propostas no leilão: a anglo-holandesa Shell ficou com quatro blocos sozinha e com um em parceria com a colombiana Ecopetrol. Todos na Bacia de Santos, onde estavam as áreas consideradas menos arriscadas.
Ao todo, o governo arrecadou R$ 37,1 milhões. Em valores corrigidos pela inflação, foi a menor arrecadação em um leilão de concessão de áreas exploratórias da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis), ficando abaixo dos R$ 72,7 milhões de 2003.
Ainda assim, o diretor-geral da ANP, Rodolfo Saboia, classificou o resultado da 17ª Rodada de Licitações da ANP como “um sucesso”, citando os investimentos mínimos contratados de R$ 136,3 milhões nas cinco áreas concedidas.
“É importante lembrar que a rodada teve foco em novas fronteiras exploratórias, ou seja, áreas com muito risco para as empresas”, afirmou ele após o evento, alegando que normalmente as companhias decidem seu orçamento no ano anterior, quando o mundo vivia fortes efeitos da pandemia.
Para a ex-diretora-geral da ANP, Magda Chambriard, o cardápio oferecido pelo governo demandaria elevado apetite por risco, já que a maior parte dos blocos estão em bacias ainda desconhecidas ou muito distantes do continente, o que cria desafios logísticos na exploração.
Ao todo, nove empresas se habilitaram para participar do leilão, também o menor número da história. Chambriard diz que, com a pandemia, muitas das petroleiras com negócios no país não conseguiram trabalhar em 2020 e preferem focar nos blocos que já têm em carteira.
“A melhor definição desse leilão é risco elevado: risco de descoberta, risco logístico, risco ambiental…”, diz. “Num momento de incerteza, porque ninguém sabe se o petróleo vai subir ou descer, e com empresas cheias de projetos no Brasil.”
O sócio da KPMG e líder do setor de Energia e Recursos Minerais da consultoria, Anderson Dutra, acrescenta que hoje a área de exploração e produção disputa o orçamento das petroleiras com projetos renováveis.
Nos últimos anos, algumas das empresas estrangeiras com maior participação no país, como Shell, Total e Equinor, anunciaram pesados investimentos em energias limpas, para se posicionar num cenário de transição energética e reduzir a resistência de investidores ESG, por exemplo.
Ao contrário dos leilões do pré-sal, em que as empresas compram reservas já descobertas ou até em produção, o leilão desta quinta vendeu áreas que demandam anos de investimento em pesquisa do subsolo, com risco de que nada seja encontrado ou que o petróleo perca valor.
Por isso, o mercado espera maior participação no leilão previsto para dezembro, quando o governo oferecerá duas áreas do pré-sal que não atraíram interessados em 2019. Ainda assim, Dutra diz que o país deve acelerar a oferta de áreas, sob o risco de perder o bonde da transição energética.
 


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