Brasileira encontrada morta em deserto dos EUA atravessava a fronteira com ‘amigos de infância’

O irmão da brasileira de 50 anos encontrada morta nos EUA na quarta-feira criticou a conduta do grupo que atravessava com ela o deserto na região da fronteira com o México. Leci Pereira indicou que foi crueldade abandoná-la, sem comida nem água enquanto ela passava mal. Relatos indicam que ela tentou entrar no país com três supostos amigos de infância, que a deixaram para trás, além da pessoa contratada para orientá-los ao longo do caminho. O corpo da técnica em enfermagem foi avistado pela patrulha norte-americana após dias de buscas. Ela estava numa área bastante quente e afastada da cidade mais próxima, chamada Deming. Lenilda deixa duas filhas.
— Não se faz isso nem com nem com cachorro, como é modo de falar. Quero dizer, não se pode maltratar animais, então como que se larga um ser humano no deserto sem comida, sem água? — desabafou Leci. — Você não tem noção da dor que é isso. É muito difícil.
‘Foi construir outro tipo de sonho’
O irmão de Lenilda agora visa a chamar atenção para o caso como forma de alertar outras pessoas a não se arriscarem na travessia do deserto.
— No Brasil, está todo mundo chocado com essa história, e lá (nos EUA) também. Nós queremos que a história repercuta para que isso acabe. Nosso país tem que fazer algo para impedir que histórias assim se repitam. Ela foi construir outro tipo de sonho para ela, mas quero deixar um alerta para que outras pessoas não façam esse trajeto e que as autoridades (brasileiras) impeçam isso. Que nosso país seja melhor. Nosso país acabou.
Ele contou que a irmã se separou do ex-marido há alguns meses e decidiu ir para os Estados Unidos.


— Ela sempre quis ir com os amigos — lembrou.
Lenilda teria começado o trajeto às 4h da segunda-feira, dia 6, acompanhada pelos três supostos amigos e o “guia”. Leci disse que sua irmã costumava mandar notícias para a família por mensagens, compartilhando também sua localização, até que chegou um momento, na tarde do dia 7, que a sobrinha dele reparou, por meio de um aplicativo de rastreamento, que o celular de Lenilda não se deslocava mais. A partir de então, todos ficaram preocupados, pois ela também parou de responder.
— Até então nós não sabíamos que ela estava abandonada. Imaginávamos que estava com os companheiros — disse Leci.
‘Pede pra eles trazerem água que não estou mais aguentando de sede’
Nas mensagens que mandou para os parentes, Lenilda avisou, ainda no dia 6, que não havia aguentado mais caminhar e decidiu parar, mas seu grupo seguiu em frente, com a promessa de que voltaria para buscá-la. Então ela esperou até o dia seguinte, após uma noite dormindo no meio do mato, ao mesmo tempo em que enviava mensagens tranquilizando seus familiares. Na terça-feira, dia 7, por sentir muita sede, a técnica em enfermagem tentou andar mais um pouco, para se aproximar o quanto fosse possível de seu grupo.
— Ela mandou mensagem pra amiga que a largou, dizendo: “pede pra eles trazerem água, que não estou mais aguentando de sede” — afirmou o irmão. — Liguei pros caras, pro amigo, de onde começou a caminhada. Pedi: “liga pra alguém que ela vai morrer no deserto”. Como eles disseram que voltariam, ela ficou lá aguardando. Na terça-feira (dia 7), quando deu 15h27, foi o último contato que teve comigo:
“pode ficar tranquilo que eles vão vir me buscar”.
‘Estava um calor horrível’
Mas conforme nenhuma atitude era tomada pelos companheiros de caminhada de Lenilda, os parentes dela em Vale do Paraíso, em Rondônia, começaram a pedir ajuda para amigos e brasileiros nos EUA. Foi assim que entraram em contato, no último fim de semana, com Kleber Vilanova, que mora em Ohio e tem um empreendimento que atua na área de imigração. O empresário contou ter reforçado à polícia os pedidos por mais operações de busca no deserto.
— Lenilda tentou atravessar a fronteira ilegalmente no México e ela estava viajando com alguns conhecidos de infância, supostamente amigos dela. E fontes dizem que ela estava com “coiote” também. Devido ao calor (estava um calor horrível, e lá é um deserto), ela atravessou a cerca e começou a andar alguns quilômetros dentro do deserto em direção a Deming. Só que ela não aguentou a caminhada — contou Kleber.
‘Não queriam ser presos’
O brasileiro lamentou que a mulher tenha sido deixada sozinha no deserto sem que o grupo que a acompanhava tenha acionado as autoridades para que enviassem uma equipe de ajuda até ela.
— As pessoas com quem ela estava viajando pensaram neles próprios — declarou Kleber. — Devem ter pensado que não poderiam chamar a patrulha da fronteira para falar que ela estava lá, porque depois a polícia poderia chegar até eles. Creio que foi esse o pensamento deles, não queriam ser presos.
O empresário também comentou que Lenilda levava consigo um aparelho celular com um chip do Brasil e um pouco de crédito, tendo sido desta forma como conseguiu enviar seu último pedido por socorro.
— Nesse telefone, ela conseguiu força suficiente para poder mandar a localização para um parente no Brasil. Ela enviou áudios, que são terríveis, falando que estava morrendo de sede, que não estava aguentando. A família começou a agir imediatamente — afirmou Kleber.
‘Simplesmente abandonaram-na lá’
A localização de Lenilda foi difícil de ser descoberta, pois ela estava numa região ampla de deserto, com a residência mais próxima a 400 metros de distância. Além disso, ela vestia uma roupa camuflada, para dificultar ser observada. E a escolha por visuais assim é comum entre os imigrantes ilegais, segundo a polícia local.
Segundo Kleber, a polícia realizou várias buscas, sejam aéreas ou pelo solo, mas custou bastante a encontrá-la.
— Ela começou a ficar desidratada, a passar muito mal e não conseguiria continuar. O que aconteceu foi que os supostos amigos dela, junto com o “coiote”, simplesmente abandonaram-na lá. Deixaram-na sozinha no meio do deserto e continuaram a caminhada — lamentou.


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