Candidatos que faltaram ao Enem 2020 por medo da Covid perdem direito à isenção de taxa em 2021 e correm risco de não fazer prova

Pessoas que conseguiram o benefício na edição passada só poderiam ficar novamente isentas do pagamento de R$ 85 se justificassem a ausência. Inep não aceita argumentos relacionados ao temor da pandemia

“Cidade na fase vermelha [de restrições para Covid-19], pouquíssimas linhas de ônibus funcionando, medo de contaminação… não dava para fazer o Enem 2020.


Agora, sem isenção da taxa de inscrição para a próxima prova, não tenho chance de prestar o exame. Estou desempregada e sou mãe de duas crianças pequenas.


O depoimento acima é de Mariana Scoralich, de 32 anos, moradora de Juiz de Fora (MG).


Até o dia 18 de junho, ela pode entrar com um recurso no site do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e tentar, pela última vez, ficar isenta da taxa de R$ 85 para se inscrever no Enem 2021.


Se não conseguir, perderá a oportunidade de ingressar no ensino superior pelos principais programas do governo, como Sistema de Seleção Unificada (Sisu) e Programa Universidade Para Todos (Prouni).


Assim como Mariana, outros ex-alunos da rede pública e pessoas em vulnerabilidade social que conseguiram o direito de não pagar a taxa de inscrição no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2020, mas que não fizeram a prova por medo da pandemia, perderão, a princípio, o benefício da isenção em 2021.


Eles só poderiam obter novamente a gratuidade se explicassem por que se ausentaram.


No entanto, apenas motivos previstos no edital foram aceitos, como acidente de trânsito no dia da prova, emergência médica, assaltos e morte na família, por exemplo (com os devidos documentos anexados, como atestados ou boletins de ocorrência).


O Inep não acatou o argumento de quem faltou porque estava com receio de se contaminar no local de prova ou nos meios de transporte. Nem havia esta opção no preenchimento do formulário de justificativa de ausência.


A Defensoria Pública da União ingressou com uma ação para tentar reverter a regra (leia mais abaixo), mas ainda não recebeu resposta do Ministério da Educação (MEC).


Qual a consequência imediata disso? Sem a isenção, justamente os alunos mais pobres correm o risco de ficar de fora do Enem 2021, por não conseguirem arcar com os R$ 85 cobrados de quem fará o exame.


‘Faltei porque não queria morrer’

Lucas Alves*, de 18 anos, está terminando o ensino médio em um instituto federal de Cascavel (PR). Assim como Mariana, ele também teve o benefício de não pagar a taxa no Enem 2020, mas não compareceu à prova por medo da Covid-19. “Não queria morrer”, afirma.


Para ter a isenção em 2021, ele entrou no sistema do Inep e preencheu o formulário de justificativa de ausência.


“Simplesmente não tinha nenhuma opção sobre a situação da pandemia. Eu não estava doente, só estava evitando de me contaminar”, diz.

Por isso, o pedido de Lucas foi negado pelo Inep. E pagar R$ 85 para garantir a participação na prova não será fácil. “Eu e minha irmã temos muitos gastos com remédios, e meu pai está passando por um período sem salário, por causa da pandemia. Seria de grande ajuda ter a isenção.”


Tentativas de cancelar a regra da ausência

G1 entrou em contato com o Inep para saber se, de fato, a justificativa relacionada à pandemia não será aceita. Também questionou quantos candidatos tiveram seus pedidos de isenção barrados. A autarquia não respondeu até a última atualização desta reportagem.


É possível que seja um número alto, já que o Enem 2020 registrou recordes nas taxas de abstenção – 55,3% na edição impressa, 72% na reaplicação da prova e 71,3% na versão digital.


A Defensoria Pública da União enviou uma recomendação ao MEC para que, excepcionalmente neste ano, não sejam exigidas justificativas nos pedidos de isenção. Outra alternativa sugerida foi aceitar autodeclarações de quem faltou por não querer se expor a aglomerações.


Como o MEC não respondeu, a DPU entrou com uma ação na última sexta-feira (11). Até esta quinta-feira (16), a pasta continuava sem se pronunciar.


Segundo João Paulo Dorini, defensor público, se não houver mudanças, a regra “impedirá o ingresso no ensino superior de inúmeros estudantes pobres, o que viola o direito social à educação”.


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