Com a missão de levar a vacina contra a Covid-19 para moradores do Projeto Santa Luzia, uma comunidade isolada na BR-364, em Cruzeiro do Sul, no Acre, equipes de saúde percorreram mais de 40 quilômetros de estradas de terra, em meio ao atoleiro, sol e longas caminhadas.
As 15 equipes da Secretaria Municipal de Saúde saíram logo no início da manhã, por volta das 5h, para encarar a estrada. Uma equipe de reportagem da Rede Amazônica Acre acompanhou parte do grupo na vacinação nos ramais 3 e 12 da comunidade.
Equipes caminham longas distâncias para imunizar a população — Foto: Reprodução Rede Amazônica Acre
Para o agente de saúde da comunidade, Gildo Sila da Conceição, que conhece muito bem as dificuldades da região, chegar a esses locais isolados é levar um pouco de dignidade e esperança para as famílias.
Integrante da equipe de imunização caminha pela lama — Foto: Reprodução Rede Amazônica Acre
“Para mim é uma alegria também porque trabalho na comunidade há mais de 20 anos, então, trazer uma nova esperança para essas vidas é, sucessivamente, uma alegria para mim”, comemorou.
Dificuldades
Desbarrancamento e más condições de uma ponte obrigaram a equipe a descer do carro. Por causa da falta de infraestrutura, as equipes tinham que parar constantemente para uma avaliação e escolher o melhor ponto de passagem.
“Tem que verificar porque está meio distante da cidade, sem comunicação e vai que a gente atole aqui. Vai ficar complicado. Mas, vamos chegar até nosso destino final, que é vacinar a população com comorbidade e os idosos”, contou o motorista Islan Silva.
Em certo momento do percurso, equipe teve que descer para ajeitar madeira da ponte que está desbarrancando — Foto: Reprodução/Rede Amazônica Acre
A dificuldade de acesso não acontecem só nessa comunidade. Cruzeiro do Sul possui cerca de 700 quilômetros de ramais, a maioria sem infraestrutura.
Resistência de idosos
O agricultor Sebastião Martins, de 68 anos, não aceitou receber o imunizante na zona rural de Cruzeiro do Sul — Foto: Reprodução/Rede Amazônica Acre
Depois de uma hora e meia de estrada, as equipes chegaram até a casa do agricultor Sebastião Martins, de 68 anos, e Maria José Ferreira. O casal trabalhava em uma casa de farinha com a equipe apareceu.
Mesmo com todo esforço dos profissionais, o casal recusou receber a vacina. A equipe voltou uma segunda vez, mas os dois permaneceram irredutíveis.
“Não estou sentindo nada e não estou com vontade de tomar. Sei lá, se não vou me complicar. Só isso”, argumentou o agricultor.
Ansiedade pela vacina
A próxima casa visitada foi dos idosos Antônio Costa e Maria Barroso. Ao contrário do primeiro casal, lá, a vacina já era aguardada. “É importante mesmo. Para ficar boa e não pegar essa doença, era o que eu mais queria”, celebrou Maria Barroso.
Outro que estava ansioso para se imunizar era Gregório da Silva, de 81 anos, que também não tinha recebido o imunizante por causa do isolamento da comunidade. Mais do que saúde, o idoso disse que a vacina significa esperança.
“Enquanto há vida, há esperança. A esperança é a última que morre”, comemorou.
Sem sair de casa há 1 ano
Maria Auxiliadora, de 47 anos, faz parte do grupo de pessoas com comorbidades e não via a hora de tomar a vacina. Com medo de ser infectada, a moradora revelou que está há mais de um ano sem sair de casa. Até mesmo os parentes que moram na zona urbana ela deixou de receber.
“Não posso sair, tenho muito medo. Minhas filhas também, não vou na cidade, minhas filhas que vão comprar minhas coisas e remédios e tudo. Tudo são elas porque eu não posso. Agora é esperar a segunda dose para sair e ver os parentes em Guajará, meu filho”, frisou.
Maria Auxiliadora sofre com pressão alta e não sai de casa há mais de um ano — Foto: Reprodução/Rede Amazônica Acre
Para a enfermeira Andreia Maia, não importa a distância e nem as dificuldades, se uma única pessoa aceitar receber a vacina o sentimento já motiva toda equipe.
“Vamos conversando, falando todas as vantagens que terão com a vacinação e acaba dando certo. O lema é: pode ser um idoso em mais de 200 quilômetros, mas a gente chega lá”, explicou.
Na região 3, as equipes precisaram percorrer 14 ramais fazendo uma busca ativa. Com o início da vacinação em pessoas com comorbidade, o município espera imunizar mais de mil pessoas na zona rural.
O secretário de Saúde de Cruzeiro do Sul, Agnaldo Lima, explicou que as equipes fazem busca ativa nos ramais que não tinham conseguido entrar devido às chuvas. Ao todo, a secretaria disponibilizou 15 caminhonetes e cerca de 60 servidores para o trabalho.
“Hoje estamos com uma logística para que a gente possa vacinar todas as pessoas de 18 a 59 anos com comorbidade e também fazendo a respecagem de pessoas acima de 60 anos que, por algum motivo, não conseguiram tomar a vacinar e verificando os ramais que tentamos anteriormente e não conseguimos”, concluiu.