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O réveillon de Neymar e o negacionismo dos privilegiados


A pandemia escancara quantos países há dentro do Brasil e como inexiste o senso de coletividade. Enquanto a crise sanitária começava sua violenta trajetória, o futebol ignorava a escalada de mortes e costurava sua própria bolha de privilegiados, desprezando a calamidade instalada na sociedade para retomar a roda da fortuna. Dessa forma, é apenas maligno reflexo que seus protagonistas sintam-se à vontade para ignorar a realidade — ou, mais decepcionante ainda, para negar a realidade.


A festa de Ano Novo organizada por Neymar em uma mansão em Mangaratiba, no Rio de Janeiro, é nada mais do que isso: uma atitude ególatra de alguém completamente alheio aos problemas da sociedade. A terrível situação sanitária concede contornos sinistros ao capricho narcisista, mas está longe de causar surpresa, pois ignorar as agruras sociais do país de origem é o modo de vida da grande maioria dos craques superfaturados.


Neymar é uma pessoa pública cujas atitudes influenciam milhares de pessoas. Algo que, aos 28 anos, ele não percebe ou faz questão de ignorar. Ao promover uma festa de dantescas proporções, redoma de diversão propositalmente blindada do fúnebre entorno que hoje é o Brasil, o jogador desautoriza todas as medidas sanitárias e contribui para que a tragédia se alastre — de forma indireta, pela mensagem de desprezo à pandemia, e também na prática, pois é responsável por colocar em risco não apenas os convidados, mas todos que convivem com eles, além dos trabalhadores que estão expostos a um evento onde a aglomeração é a regra. Através de uma extravagância individual vemos a completa ausência do senso de responsabilidade coletiva.


É simples adotar (e propagar) uma postura negacionista quando se faz parte do grupo de privilegiados. Enquanto Neymar provavelmente estava preocupado em gerenciar os jatinhos que traziam seus convidados, de forma emblemática dirigentes e jogadores do Santos quebravam os famigerados “protocolos” em um jogo festivo na Vila Belmiro para ciceronear Jair Bolsonaro, o presidente que disse que a pandemia era uma gripezinha e faz questão de desprezar e desacreditar a vacina contra a Covid-19. Enquanto o mundo já faz fila para se vacinar, o Brasil contabiliza duzentas mil mortes esequer consegue comprar seringas. Também nos desespera, mas igualmente não surpreende: uma época de culto à ignorância requer comemorações macabras.


 


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