O Ministério da Saúde informou na sexta-feira (27), que uma vacina contra a Covid-19 não deve contemplar toda a população brasileira em 2021. A coordenadora do Programa Nacional de Imunizações (PNI) da pasta, Francieli Fontana, explicou que, como alguns grupos não estão participando dos testes das vacinas, não seria possível imunizar toda a população brasileira.
“Nós definimos objetivos [com grupos prioritários] para a vacinação, porque não temos uma vacina para vacinar toda a população brasileira. Além disso, os estudos não preveem estar trabalhando com todas as faixas etárias inicialmente, então não teríamos mesmo como vacinar toda a população brasileira”, disse Francieli.
O secretário-executivo Elcio Franco citou também as limitações mundiais de produção. “Quando a gente fala em imunização, o mundo não entende que terá que ter vacina para todos. A própria Covax Facility, iniciativa que junta uma série de laboratórios, ela almeja acesso a 2 bilhões de doses para a vacinar todo o mundo, e por aí verificamos que é uma meta bastante ambiciosa porque não se imagina que haverá vacina para vacinar todos os cidadãos do planeta Terra.”
Sobre o plano de vacinação no país, o secretário-executivo disse que a pasta está acompanhando o desenvolvimento das vacinas em estágio mais avançado. “Estamos conversando com os laboratórios e acompanhando os estudos. Dessa forma vamos desenhar a vacinação no país”.
“Tanto no Brasil como em todos os países se está estudando os imunizantes, as vacinas. Nenhuma vacina está registrada em nenhum órgão sanitário no mundo”, completou o secretário-executivo.
Quatro laboratórios estão fazendo testes no Brasil: Sinovac, Oxford e AstraZeneca, Janssen e BioNTech/Pfizer. As duas primeiras já têm algum acordo para fornecimento de doses. O governo do Paraná assinou acordo com a Sputnik V, da Rússia, para parceria no desenvolvimento.
Nesta sexta-feira, a Anvisa recebeu o pedido para avaliação de estudos da vacina da Janssen. O laboratório é o quarto a enviar os dados à agência. Nenhum solicitou ainda o registro da vacina.
Teste não é requisito para tratar Covid
O secretário-executivo Elcio Franco disse que a realização de testes não é requisito para que pacientes com a Covid-19 recebam tratamento.
Franco afirmou, além disso, que a letalidade da doença causada pelo novo coronavírus caiu no Brasil após a chegada de Eduardo Pazuello ao comando do ministério.
A afirmação ocorre no momento em que o Ministério da Saúde é criticado por especialistas sobre uma gestão da pandemia que levou a:
7 milhões de testes correrem o risco de não serem usados, pois estão prestes a vencer e agora necessitam de uma aprovação da Anvisa para ampliação da validade;
Defesa de uso da cloroquina e hidroxicloroquina, apesar de a Organização Mundial da Saúde (OMS) apontar que o remédio não foi eficaz contra a doença;
Exclusão de post nas redes sociais do Ministério da Saúde com a afirmação: “não existem vacina, alimento específico, substância ou remédio que previnam ou possam acabar com a Covid-19”;
Queda no total de testes realizados, item considerado essencial para o rastreamento e isolamento de contato de pacientes de Covid.
Durante entrevista coletiva, Elcio Franco não tratou da importância da realização de testes moleculares de diagnóstico da Covid para o rastreamento de contatos e para isolar casos confirmados. Especialistas alertam que exames são essenciais para rastrear e frear avanço da pandemia.
“O teste vai ocorrer mediante demanda do médico. Nós destacamos que o médico poderá realizar o diagnóstico clínico físico. (…) Não é requisito que o paciente necessariamente faça o teste”, disse o secretário.
O cardiologista e pesquisador do Hospital Universitário da USP Marcio Bittencourt diz que o teste não é requisito obrigatório, mas é “altamente recomendado”.
“Não é requisito obrigatório, mas é altamente recomendado. Eu posso até fazer o diagnóstico clínico-epidemiológico ou por tomografia quando eu não tenho o teste. É um quebra-galho. Eu posso errar muito mais. A gente precisa do teste e precisava ter muito mais teste do que tem”, afirma.
Bittencourt lembra, ainda, que a OMS recomenda uma taxa de positividade de testes em torno de 5% para que a disseminação da doença seja considerada sob controle. No Brasil, essa taxa é de 30% (a taxa de positividade representa o percentual de casos positivos em relação ao número de testes feitos).
“E [a taxa de positividade] nunca foi abaixo de 20%, em nenhuma semana. A nossa positividade msotra que a gente testa pouco, e quando testa pouco a positividade vem alta. Tem que testar de 5 a 10 vezes mais do que a gente testa para chegar em 5%”, diz o médico da USP.
A afirmação do secretário do ministério sobre a possibilidade de os médicos adotarem condutas independentemente da confirmação laboratorial do diagnóstico foi feita depois de ele afirmar que há “excedentes” de testes já distribuídos aos estados.
A declaração foi proferida em um contexto em que cerca de 7 milhões de testes do tipo PCR, considerado o padrão “ouro” para diagnóstico da Covid-19, estão parados, perto da data de vencimento, em um armazém do governo.
Um segundo levantamento, feito pela Câmara Brasileira de Diagnóstico Laboratorial, aponta que há ao menos outros 8 milhões de testes nessa situação no país, levando o número a, no mínimo, 15 milhões de testes de Covid-19 com vencimento em março de 2021 no Brasil.